O que aconteceu?

A Turquia abandonou hoje a sua oposição à entrada da Suécia e da Finlândia na NATO — tal permite que entrem oficialmente na Aliança Atlântica, o que deverá ocorrer em breve.

"Alegra-me anunciar que já temos um acordo que abre o caminho para que Finlândia e Suécia se unam à NATO", disse Jens Stoltenberg, secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), em Madrid, onde será inaugurada oficialmente na quarta-feira a cimeira do bloco militar.

"Turquia, Finlândia e Suécia assinaram um memorando que aborda as preocupações da Turquia, incluindo as que se referem à exportação de armas e à luta contra o terrorismo", acrescentou.

A adesão é "vital, já que enfrentamos a maior crise de segurança em décadas", comemorou Stoltenberg.

O que estava em causa?

Os dois países solicitaram a entrada na NATO depois do presidente russo, Vladimir Putin, ter iniciado a invasão da Ucrânia a 24 de fevereiro. O seu pedido é histórico, já que ambos permaneceram à margem da Aliança liderada pelos Estados Unidos durante a Guerra Fria durou boa parte do século XX.

A 18 de maio, as primeiras-ministras da Suécia e da Finlândia entregaram formalmente a Stoltenberg os pedidos de adesão à NATO.

De recordar que um dos argumentos para a Rússia invadir a Ucrânia foi a sua intenção de integrar a NATO, o que foi encarado pela cúpula do Kremlin como uma provocação. Já os dois países, sendo ambos vizinhos da Rússia — em particular a Finlândia, que partilha toda a sua fronteira a leste —, fizeram saber que a sua união à Aliança era um garante de segurança.

Porque é que a posição da Turquia importava?

Para entrar na NATO é preciso ter o aval de todos os 30 aliados que a compõem. 29 concordaram de imediato, um não: a Turquia.

As reservas turcas cimentavam-se em nestas exigências/críticas à Finlândia e Suécia:

  • O governo turco acusava a Suécia e a Finlândia de abrigarem militantes do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), uma organização considerada "terrorista" por Ancara;
  • Ancara censurava também a presença na Suécia de partidários de Fethullah Gülen, líder político e religioso do qual suspeita ter sido o mentor da tentativa de golpe de Estado contra o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, em julho de 2016;
  • A Turquia exigia a suspensão do bloqueio de exportação de armas imposto pelos dois países nórdicos após a sua intervenção militar no norte da Síria em outubro de 2019, o endurecimento da legislação antiterrorista sueca e a a extradição de vários indivíduos que considera "terroristas".

Os dois Estados escandinavos têm manifestado desde há vários anos apoio às Unidades de Proteção Popular (YPG), a formação armada dos curdos sírios e principal componente das Forças Democráticas Sírias (HSD), que Ancara acusa de ligações diretas ao Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), considerado “organização terrorista” pela Turquia, União Europeia e EUA na sequência da rebelião armada curda no sudeste turco, iniciada em 1984.

A Suécia também possui uma importante comunidade curda e mantém tradicionais ligações políticas com esta corrente, mais intensas que a vizinha Finlândia.

A Suécia e a Finlândia cederam?

Ao que tudo indica, sim, apesar dos detalhes não abundarem. "O governo da Turquia e os de Finlândia e Suécia chegaram a acordo quanto a melhorar a sua cooperação na questão da luta contra o terrorismo", disse Stolenberg, destacando que isso incluía "tomar medidas contra as atividades do PKK e chegar a um acordo com a Turquia no tema da extradição".

"É difícil saber o que convenceu a Turquia a aceitá-lo, mas no conjunto é um bom acordo", admitiu a primeira-ministra sueca, Magdalena Andersson, citada pela agência de notícias espanhola EFE.

Segundo Magdalena Andersson, numa reunião "muito longa" hoje em Madrid, em que esteve com os presidentes da Finlândia, Sauli Niinistö, e da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, Estocolmo e Helsínquia falaram sobre as reformas nas respetivas legislações antiterrorismo que fizeram nos últimos anos.

"Falámos também sobre qual vai ser o contributo da Suécia para a NATO. Foi também por isso que houve entusiasmo por parte dos países da Aliança com a nossa entrada [na NATO]. A Suécia e a Finlândia vão contribuir para a segurança da NATO", afirmou.

A Turquia, por sua vez, anunciou que "obteve o que queria" para abrir a porta aos dois países nórdicos. "A Turquia fez avanços importantes na luta contra as organizações terroristas", afirmou em comunicado o gabinete de Erdogan.

Já o Presidente da Finlândia, também num comunicado, disse que a adesão do país à NATO "é iminente" e os "passos concretos" para se concretizar serão acordados durante os próximos dois dias, na cimeira da organização que decorre em Madrid.

Segundo o mesmo texto, a reunião de hoje em Madrid foi "exaustiva" e o resultado foi um "memorando conjunto" que "sublinha o compromisso da Finlândia, da Suécia e da Turquia em alargar o seu total apoio contra ameaças à segurança uns dos outros."

"Tornarmo-nos Aliados da NATO irá reforçar ainda mais este compromisso", lê-se no comunicado finlandês, que sublinha que Helsínquia tem levado em consideração, de forma permanente e séria, as preocupações turcas "sobre a ameaça terrorista" e "condena o terrorismo em todas as suas formas e manifestações".

Que reações houve a este desbloqueio?

  • Os Estados Unidos comemoraram a notícia, esclarecendo que não houve concessões da sua parte para que Ancara abrisse as portas à entrada da Suécia e da Finlândia. Um alto funcionário do Governo dos EUA adiantou que o Presidente norte-americano, Joe Biden, fez uma escolha deliberada de impedir o país fosse parte das negociações estivesse numa posição de dar incentivos à Turquia. A Turquia nunca pediu nada aos Estados como parte das negociações, atentou.
  • O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, previu que a adesão deixará a Aliança "mais forte, mais segura".
  • O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, saudou hoje a decisão da Turquia, considerando que, "num momento crucial, decidiu pela NATO".

E agora?

Segundo a ministra do Negócios Estrangeiros da Suécia, Ann Linde, citada igualmente pela EFE, as negociações finais para a adesão dos dois países à NATO decorrerão na próxima semana em Bruxelas.

A cimeira de Madrid vai reunir delegações de mais de 40 países, entre os 30 membros da NATO e outros convidados, e decorre condicionada pela guerra na Ucrânia.

Os trabalhos da cimeira arrancam na quarta-feira e prolongam-se por dois dias, durante os quais a NATO vai adotar um novo Conceito Estratégico, documento que define as suas prioridades para a próxima década e que, segundo Stoltenberg, deverá definir a Rússia como a maior e mais direta ameaça aos países da aliança militar.

Em Madrid deverão também ser aprovados reforços das forças da aliança no leste europeu e das tropas de alta prontidão, naquela que constituirá "a maior revisão" da estratégia "de dissuasão e defesa coletiva" da NATO desde a Guerra Fria. Será ainda aprovado um novo pacote de ajuda à Ucrânia e também Geórgia, Bósnia e Moldova terão novos planos de ajuda da NATO.

E a Rússia?

Quanto à Rússia, não houve ainda uma reação oficial. O país liderado por Putin, de resto, preferiu falar numa outra organização onde detém um lugar de influência, o grupo BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). O ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, durante uma visita ao Turquemenistão, anunciou que a integração da Argentina e do Irão já está em curso.

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