Por: Nuno Simas, da agência Lusa
Debaixo de água, sem luz do sol, a noite chega na hora do ocaso e fica-se numa penumbra iluminada por pequenas luzes e pelos tons azuis e vermelhos dos ecrãs.
O submarino, construído na Alemanha, cuja compra, por cerca de 800 milhões de euros, causou rios de tinta de polémica, é o segundo da classe Tridente e funciona com tecnologia avançada.
O “Arpão” consegue navegar, no máximo, até 50 dias debaixo de água. E pode estar 15 dias debaixo de água sem sequer pôr os mastros fora de água – o que o pode denunciar a sua presença.
Tem 67 metros, desloca 2.000 toneladas e é movido a eletricidade, embora seja, na prática, um veículo híbrido, dado que tem motores auxiliares a diesel e a células de hidrogénio e oxigénio.
Segundo submarino da classe Tridente, pode ir até aos 300 metros de profundidade, mas é regra tapar o manómetro da profundidade quando estão os jornalistas a bordo. Que também não podem filmar algumas consolas de armamento e comunicações – o “Arpão” é uma “arma” e tem os seus segredos, com os seus torpedos e mísseis mar-terra.
O posto de comando está rodeado de ecrãs e consolas, mas aqui não se fazem jogos de guerra.
A missão é a sério e dura 24 horas por dia. A toda a hora, a tripulação identifica (e regista) navios, sejam mercantes, de pesca ou militares. Seja nas missões na costa portuguesa, seja no estrangeiro, como esta.
Os corredores são estreitos, as camas são estreitas (já não há sistema de “cama quente”, cada pessoa tem a sua), as escadas para ponte têm cerca de 10 metros até à escotilha e todos os cantos são aproveitados.
Não há muito barulho porque os motores são elétricos, cada canto do navio tem lugar para alguma coisa. O balanço é menor do que à superfície, mas às vezes é preciso testar o equilíbrio.
A comida é toda feita a bordo para uma tripulação de 33 pessoas, oito oficiais, 12 sargentos e 13 praças. As refeições, por “turnos”, são momentos de alguma descontração e conforto para o estômago.
A caminho da missão no Mediterrâneo, ao serviço da força naval da União Europeia (EUNAVFOR MED) na Operação Sophia, de controlo de migrantes, e na operação Sea Guardian, da NATO, rotina-se a tarefa de identificar navios, consultam-se bases de dados, militares e civis, para verificar se há suspeitas de atos ilícitos.
Há também tempo – numa rotina dividida por “quartos” ou turnos - para fazer exercícios, de combate a incêndios a bordo, por exemplo.
Mas a vida também é feita de rotinas, como as refeições, que ajudam a manter um bom espírito.
Pedro Joaquim é primeiro marinheiro, há 14 nos submarinos e é ele o cozinheiro, de manhã à noite, dando “um bom ânimo, uma boa disposição” à tripulação.
“Se houver boa comida, há bom convívio. Acaba por ter bom ânimo e boa disposição”, afirmou Pedro Joaquim que, às 07:00, geralmente já tratou dos pequenos almoços e está a preparar o almoço.
Ele, que também andou num navio de superfície, custou-lhe um pouco adaptar, porque “isto é navegar à antiga”. Do que sente mais falta é mesmo o contacto com a família, porque debaixo de água “não há rede [de telefone] nem televisão”.
Ao contrário do que acontece noutros navios, quem está aos comandos deste não vê o mar nem por onde anda – apenas manómetros, bússolas e ecrãs.
É Carlos Rodrigues, cabo torpedeiro, um dos homens do leme que, com mais de 20 mil horas de navegação em submarinos, que explica o gosto por esta vida de “fazer o que se gosta longe de quem gostamos”.
“O nosso trabalho pode não ter visibilidade lá fira, mas é um grande trabalho e tudo aumenta a nosso ego como militares”, afirmou, descrevendo o trabalho de recolha de informações que é feito nas missões.
Mas numa missão deste tipo, também há formação. É o caso de Fidalgo de Oliveira, filho de um militar, que entra nos “quartos” no centro de comando ou na ponte e está a fazer a especialização em submarinos.
Não esconde a atração pelo desconhecido, há ainda “um culto diferente”, um “desafio um pouco maior desta plataforma”, e admite que se perdem algumas “regalias”, como o sol ou o contacto com a família, mas quer seguir a carreira de submarinista “por muito e longos anos”.
“É uma forma de navegação diferente, uma pessoa habitua-se, nem nota. Dá para fazer uma ‘bordada’ [turno] como se faz nos navios de superfície sem notar que está debaixo de água”, disse.
Mas a missão ainda mal começou. Há muitos dias pela frente no mar até 31 de agosto.
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