Conhecida pelas fumarolas que brotam da terra, pelas nascentes de águas termais amareladas ou pelo cozido confecionado debaixo da terra, a freguesia das Furnas, no concelho da Povoação, em São Miguel, é um dos locais mais procurados pelos turistas que visitam a ilha.
Por aquelas ruas já passeiam alguns turistas, como o caso de Pedro Azevedo, que a agência Lusa encontrou na zona das fumarolas — as afamadas caldeiras — procurando explicar às duas filhas a origem daquelas superfícies vulcânicas.
“Sinto-me seguro aqui. Já tinha cá estado em trabalho e agora vim passar férias com as minhas filhas”, declarou, após ter feito uma pausa na explicação com a devida autorização das filhas.
Natural do Porto, Pedro Azevedo referiu que as restrições impostas a quem chega à região no controlo da pandemia — apresentação de um teste negativo à covid-19 ou realização do teste aquando do desembarque — “nunca” o impediram de querer viajar para o arquipélago.
Mais à frente, próximo da zona da água azeda — uma nascente de água termal com gás — outra turista, Mónica Melo, natural de Lisboa, aproveitou o mês de agosto para visitar uns amigos micaelenses.
“É a primeira vez que estou aqui, estou a adorar”, confidencia, defendendo em seguida que as medidas aplicadas no controlo dos passageiros à região deviam ser replicadas a nível nacional.
“Concordo com todas as medidas e acho que, inclusive, quem entra em Lisboa, sobretudo de outros países, devia apresentar um teste negativo. Esta norma regional devia ser aplicada no todo nacional”, assinala.
O assumido entusiasmo dos turistas com as excentricidades naturais da freguesia contrasta com o desânimo dos comerciantes, habituados às enchentes de gente durante o verão.
Naquela zona das caldeiras, num posto de venda de produtos regionais, Nélia Linhares assume que o negócio está “terrível”, apesar de já se ver “alguns turistas, sobretudo continentais”.
A comerciante destaca que a “partir da segunda quinzena” de agosto o negócio “melhorou um bocadinho”, mas “nada que se compare com o ano passado”.
“Durante a semana é tudo deserto. Ao fim de semana, ao domingo, é pessoal da nossa ilha. Têm-me surpreendido pela positiva, porque os locais aderiram, estão sensibilizados connosco e tentam ajudar-nos”, refere.
Nélia Linhares, que tem na venda dos bolos lêvedos, típicos da freguesia, o seu produto mais vendido, não se mostra muito confiante quanto ao futuro, assumindo ter “receio” de a situação vir a “piorar”.
“É preciso muito jogo de cintura para aguentar. As Furnas vivem sobretudo do turismo. Isso é como uma bola de neve. Se eu não tenho para gastar, não vou gastar ao outro lado e o dinheiro não circula”, aponta.
Os turistas, de mapa numa mão e de telemóvel no outro, são mesmo das poucas pessoas que se encontram pelas ruas da freguesia.
Procurando acompanhar as filhas que se encontram numa correria por um parque no centro da freguesia, Justin, inglês, residente na Dinamarca, assume ter ido para os Açores porque as filhas “adoram vulcões e baleias”: “e este é o melhor sítio do mundo para ver os dois”, justifica.
O dinamarquês diz sentir-se “muito seguro”, fazendo questão de destacar os “poucos casos” de covid-19 registados na ilha.
“Pelo que vejo, as pessoas estão a tomar todas as precauções para prevenir o vírus, muito melhor do que vi em toda a Europa”, realça.
Em praticamente todas as ruas se nota a presença de turistas, mas estão em número “muito inferior” ao ano passado, frisa Paulo Moniz, da loja Souvenir Shop, que tem tido vendas “fraquíssimas”.
O comerciante da loja de lembranças regionais, situada no centro da freguesia, prevê que, “a partir de agosto”, com o fim da época alta, as coisas “até poderão vir a complicar-se”.
“Uma diferença enorme comparando com o ano passado. Às vezes preciso de uma semana para faturar o que faturava num dia”, declara.
Ao lado da loja encontra-se o restaurante Tonys, um dos mais concorridos das Furnas, dividido em três espaços pela freguesia, sendo que um ainda não reabriu desde a pandemia da covid-19.
O proprietário, António Arruda, refere à Lusa que teve uma quebra de 71,8% no mês de julho, quando comparado com o mesmo mês do ano passado.
“Este mês [agosto] as coisas têm aumentado de dia para dia. Se chegar ao final do mês como está agora, talvez tenha uma quebra comparada com agosto do ano passado de 50%. Mas aí eu já me contento com esses 50%, da maneira como isto anda”, acrescenta.
No verão do ano passado, o Tonys confecionava 10 panelas diárias de cozido (cada panela alimenta 50 pessoas), sendo que, atualmente, são produzidas quatro panelas por dia.
“O ano passado abríamos com 300 e tal refeições já marcadas”, explica o empresário, destacando que muitas reservas provinham de parcerias com agências de viagens: “Agora não há nada disso”.
Para manter o negócio, António Arruda faz uso dos “proveitos” retirados dos últimos anos, em consequência da “vinda das ‘low-cost'” e da subida do turismo na região.
“É muito difícil manter o negócio. Porque a gente não quer despedir, temos funcionários que trabalham connosco e criámos um laço quase familiar”, acrescenta.
O proprietário do restaurante e bar Caldeiras e Vulcões, Paulo Costa, destaca que em “termos de turismo até não tem sido mau”, mas que “nem se pode comparar” com outros anos.
O empresário prevê uma “quebra grande no negócio”, também devido à obrigação dos bares encerrarem às 22:00, uma vez que o bar Caldeiras habitualmente fechava às 4:00.
Quanto ao futuro, Paulo Costa rejeita previsões: “Há de ser o que Deus quiser. É viver o dia a dia, vamos a ver como corre”, afirma.
Uma resposta que espelha a imprevisibilidade dos tempos atuais.
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