“Se os cenários que se preveem se confirmarem, isto é, havendo maiores períodos de seca, vai ter de haver uma alteração das práticas culturais. Não se pode semear milhos tão tarde, vamos ter de fazer, se calhar, menos cortes de erva para silagem e isso vai alterar todo o maneio das explorações”, adiantou, em declarações à Lusa, Alfredo Borba, docente da Faculdade de Ciências Agrárias e do Ambiente da Universidade dos Açores, especialista em nutrição animal.
Este ano, a falta de chuva nos meses de primavera, em que habitualmente se produzia erva e milho forrageiro para as vacas, deixou produtores de várias ilhas com avultados prejuízos.
Os investigadores da área do clima da academia açoriana já detetaram uma quebra na precipitação no arquipélago, sobretudo nas zonas baixas, mas ainda não foi feito um estudo sobre o impacto que essas alterações poderão ter na agricultura e na agropecuária.
Segundo Alfredo Borba, em França, por exemplo, antes de 2000 já se estudava este impacto e os Açores devem seguir o exemplo, porque este ano poderá ter sido apenas a “primeira evidência” de que o clima está a mudar.
“Talvez seja altura de nós começarmos a pensar, porque já há estudos em várias áreas das alterações climáticas na universidade”, salientou.
O aumento das temperaturas até é favorável à produção de erva, mas as culturas necessitam de água e a chuva é cada vez mais reduzida nas zonas baixas.
“O milho vai ter de ser semeado mais cedo para apanhar chuvas e vai ter de haver um redimensionamento das explorações. As previsões são de que nas zonas altas não vai haver uma diminuição tão drástica, portanto, vamos continuar a ter pastagens nas zonas altas e vamos ter de repensar a forma de maneio”, frisou o docente da Universidade dos Açores.
Segundo Diamantino Henriques, delegado regional do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), este ano, nos Açores, registou-se uma quebra de precipitação de cerca de 50%, em comparação com o valor médio, nos meses de “abril, maio e junho”.
“Temos detetado em geral nos Açores uma diminuição da precipitação, relativamente àquilo que é normal, que é médio, para esta altura do ano, principalmente no grupo oriental”, salientou.
Ainda sem estarem contabilizados os dados de todas as ilhas, o delegado do IPMA adiantou que no grupo oriental (São Miguel e Santa Maria) a seca é considerada “severa”, nas ilhas Terceira e Flores “moderada” e na ilha do Faial “fraca”.
“É difícil de atribuir quantitativamente neste momento a contribuição das alterações climáticas para este caso em particular. No entanto, aquilo que nós temos estado a verificar é que, de uma maneira geral, o número de meses com precipitação abaixo do valor médio é superior ao número de meses com valor acima da média”, apontou.
Embora este ano se tenham registado mais queixas dos lavradores, Diamantino Henriques lembrou que nos meses de janeiro, fevereiro e março de 2015 “houve uma situação mais grave do que esta em termos relativos”.
O delegado do IPMA admitiu existir uma “mudança climática”, que tem provocado alterações na temperatura do ar — “tem estado sistematicamente mais quente do que há 50 anos” — o que poderá despoletar a ocorrência de períodos longos sem precipitação, mas também de fenómenos de precipitação intensa.
“Quando é que ocorrem esses fenómenos extremos de seca ou de precipitação intensa não podemos dizer, o que nós sabemos é que eles poderão acontecer com maior frequência”, salientou.
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