"Estamos a assistir a um avanço muito significativo da extrema-direita na Europa. A dada altura vamos ter de realizar eleições europeias com a extrema-direita no poder", afirmou o arquiteto, vencedor do Prémio Pritzker 1992, em entrevista à agência de notícias espanhola EFE.
Neste contexto, Siza Vieira diz que não sabe quais vão ser as consequências para a arquitetura, embora diga que não espera "nada de bom nem nada de melhor" do que se passa atualmente, considerando que a situação "já é suficientemente má".
Nascido em 1933, em Matosinhos, Siza Vieira disse à EFE que, aos 7 anos de idade, visitou a Exposição do Mundo Português (1940), em Lisboa, que a ditadura do Estado Novo utilizou como propaganda.
"Era uma bela obra arquitetónica, mesmo que viesse de uma ideologia fascista. Claro que uma criança de 7 anos não percebia isso e ficava encantada. Agora, deslumbrar os adultos é menos explicável", diz o arquiteto de 84 anos.
A extrema-direita não é a única ameaça que o setor da arquitetura enfrenta, alerta Siza Vieira.
O arquiteto afirma que a regulamentação europeia é "um pesadelo, no máximo, tolerável", em que prevalece "o mais barato" e que os honorários são muito inferiores aos necessários para a realização das obras.
"Tento fazer [orçamentos] de acordo com as tabelas anteriores e isso é considerado caro", lamenta, ecoando palavras que tem vindo a repetir ao longo dos últimos anos.
Numa altura em que na Europa "há dificuldades muito grandes" em encontrar trabalho, Siza Vieira, que em 2019 se tornou o primeiro estrangeiro a receber o Prémio Nacional de Arquitetura de Espanha, considera ter tido sorte por ter recebido propostas na Ásia, onde está atualmente a desenvolver projetos na República Popular da China, Coreia do Sul e no Japão.
Mesmo assim, refere que as "contrariedades" que tem sentido no continente europeu também foram sofridas por colegas portugueses e espanhóis e que, se dependesse dele, poderia ser a causa de um protesto em grande escala no setor.
A EFE indica que Portugal é um país que está a sofrer uma grave crise de habitação, enquanto os partidos políticos discutem se a razão está na oferta ou na procura.
Para Siza Vieira, o problema está nas políticas implementadas e lamenta que a habitação social seja pouco promovida atualmente, apesar de se tratar de um conceito que considera inadequado, porque a arquitetura social "é tudo", seja quem for o destinatário.
"A arquitetura é vista como algo para os ricos e os arquitetos são vistos como caprichosos, difíceis e caros", acrescenta o vencedor do Prémio Pritzker, que lembra que foram grandes construtores como Bruno Taut, Hans Scharoun e Mies van der Rohe que promoveram a habitação social no século XX, através de programas governamentais.
Atualmente, defende Siza Vieira, é necessário que os governos voltem a criar programas de habitação.
Perante os constantes avanços sociais, como a promoção das ‘smart cities’ (cidades que utilizam as tecnologias de informação para tornar mais eficiente a utilização dos recursos) ou da inteligência artificial, prefere ficar à margem, por considerar que não está adaptado aos novos tempos e que não tem grande "jeito para os 'gadgets'".
Ainda assim, Siza Vieira deixa um alerta sobre o papel da tecnologia para a próxima geração.
"Acho que vai ter um papel muito importante no seu todo, mas, no outro lado da balança, vai ter muitos problemas de controlo", disse Siza Vieira, referindo-se à República Popular da China como exemplo de vigilância sobre os cidadãos.
Siza Vieira sublinha que tem dificuldades em ver as repercussões da inteligência artificial na arquitetura - que já se fizeram sentir em outras artes -, mas é claro quanto às preferências pessoais afirmando que lhe interessa "a inteligência natural".
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