Os partidos de esquerda, nacionalistas e independentistas que apoiam a amnistia têm maioria absoluta no Congresso dos Deputados (a câmara baixa do parlamento espanhol), mas no Senado (câmara alta) há maioria absoluta do Partido Popular (PP, direita), que anunciou a intenção de a bloquear durante o maior tempo possível.
O Senado espanhol não tem poder de vetar leis aprovadas pelos deputados, mas tem mecanismos para atrasar a entrada em vigor.
A amnistia abrangerá pessoas envolvidas no movimento de autodeterminação da Catalunha entre 2011 e 2023, o que inclui o referendo ilegal e a declaração unilateral de independência de 2017.
O líder do PP, Alberto Núñez Feijóo, declarou uma “ofensiva sem quartel contra o Governo” liderado pelo Partido Socialista (PSOE), a quem acusa de ceder a chantagens dos independentistas e atacar o Estado de direito para se manter no poder, e tem promovido iniciativas de contestação à amnistia dentro e fora de Espanha, nas instituições e tribunais europeus.
A expectativa dos populares é que haja nas próximas semanas alguma decisão ou posicionamento europeu que questione a amnistia que o líder do PSOE, Pedro Sánchez, negociou com forças independentistas da Catalunha para ser reconduzido primeiro-ministro em novembro passado.
A Comissão Europeia pediu informações a Espanha sobre a amnistia e o comissário com a pasta da Justiça, Didier Reynders, reiterou na sexta-feira que Bruxelas continua a acompanhar com atenção o caso, mas não vai posicionar-se sobre cada “nova etapa”, aguardando “o final do debate”.
Em Espanha, o PP convocou para hoje uma manifestação em Madrid, depois de ter estado à frente de protestos em novembro que mobilizaram centenas de milhar de pessoas.
Associações de juízes têm também assumido a oposição à amnistia, assim como alguns dirigentes históricos do próprio PSOE.
A “lei de amnistia para a normalização institucional, política e social na Catalunha” já foi aprovada, em dezembro, numa primeira votação para admissão a debate parlamentar, por uma maioria absoluta de 178 dos 350 deputados espanhóis e passou as últimas semanas em apreciação a nível de comissão.
Nesta apreciação na especialidade foram introduzidas já algumas alterações à versão original que têm mantido acesa a polémica pública, com troca de acusações permanentes entre partidos.
No centro da polémica têm estado decisões de um juiz da Audiência Nacional (instância que tutela a investigação e julgamento dos crimes mais graves) e alterações à proposta de lei que parecem ser respostas e contra-respostas entre as duas partes.
Quando foi conhecida a proposta de lei de amnistia, o juiz recuperou um processo que tinha em mãos há anos e envolveu o antigo presidente do governo regional catalão Carles Puigdemont em alegados crimes que classificou como de possível terrorismo, numa classificação entretanto contestada pelo Ministério Público.
Nas últimas semanas, os partidos que apoiam a lei introduziram uma alteração que alarga a amnistia a crimes de terrorismo desde que não tenham “causado violações graves de direitos humanos de forma manifesta e com intenção direta”, pelo que Puigdemont continuaria a ser amnistiável.
Seguiu-se novo despacho do juiz alargando as suspeitas e o impacto dos crimes em que Puigdemont é suspeito, naquilo que dirigentes socialistas consideraram uma tentativa de fazer “um fato à medida” para evitar a amnistia do antigo presidente do governo regional.
Carles Puigdemont vive na Bélgica desde 2017 para fugir à justiça espanhola e é uma das pessoas que se beneficiará da amnistia, tendo ele próprio negociado a lei com o PSOE.
Os partidos podem ainda introduzir mudanças na lei no plenário de terça-feira, antes da votação final pelos deputados.
Por causa dos episódios dos últimos dias, o PP acusou os socialistas de serem “cúmplices de terroristas” e o PSOE respondeu que a lei respeita os tratados europeus sobre terrorismo e direitos humanos e só abrange o processo independentista na Catalunha.
“Sejamos sérios. Alguém acredita que é comparável o processo independentista com o terrorismo que sofreu Espanha durante décadas? O que todos entendemos por terrorismo, o que Espanha sofreu durante décadas de terrorismo, isso está fora da amnistia”, disse na semana passada o ministro da Justiça, Félix Bolãnos, numa referência ao grupo terrorista ETA, que defendia a independência do País Basco.
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