“Dizer que há transferência de um cargo de gestão pública para outro cargo de gestão pública não é verdade e põe-se aqui outro problema: […] não houve conhecimento antecipado [da ida para AMT]”, afirmou o antigo presidente do Conselho de Administração (PCA) da CP — Comboios de Portugal, no parlamento.

Manuel Queiró exercia o cargo na altura em que a atual secretária de Estado da Mobilidade, Cristina Dias, era administradora e saiu da empresa a seu pedido, no âmbito de um programa de rescisões por mútuo acordo, com uma indemnização de 80.000 euros, para assumir um cargo de gestão na AMT, também empresa pública.

O antigo responsável prestava esclarecimentos na Comissão de Economia, Obras Públicas e Habitação, a pedido do Chega, quando explicou que a renúncia ao cargo de administradora da CP pedido por Cristina Dias e o pedido para integrar o plano de rescisões por mútuo acordo, já na qualidade de quadro da CP, são duas situações diferentes.

“A empresa não pode negar-se a corresponder positivamente aos dois pedidos”, vincou Manuel Queiró, acrescentando que “não há nenhum registo escrito da comunicação do lugar para onde a doutora Cristina Dias foi convidada” e, na sua opinião, “nem tinha de haver”.

O antigo responsável foi questionado pelo PS sobre se existiu uma “via rápida” para a rescisão de Cristina Dias, uma vez que a saída data de 22 de julho de 2015 e a sua entrada na AMT data do dia seguinte, mas Manuel Queiró não respondeu.

Quanto ao prazo de 30 dias estipulado para a transição de cargos, trazido ao debate pelo Chega, o antigo responsável citou uma ata de 23 de julho de 2015, dia em que tomou conhecimento da ida de Cristina Dias para a AMT através das plataformas onde o Governo publicita as suas decisões, em que foi deliberado prescindir do prazo previsto.

Ainda em resposta às questões do Chega, o antigo presidente da CP disse que a empresa não podia negar o direito à integração no plano de rescisões porque “esse plano obedecia a um conjunto de regras que foram definidas em abstrato e de modo impessoal” e “nunca foi negado esse pedido” nas várias centenas de casos.

Questionado pelo PS sobre como foi calculado o valor da indemnização e quem esteve na reunião onde o pagamento foi autorizado, Manuel Queiró disse que “a fixação de valores de compensação foi feita com um normativo definido na empresa” antes dos seus mandatos e garantiu que “o Conselho de Administração nunca participou numa reunião de fixação desses valores”.

Já no tempo de resposta às questões do PSD, o antigo responsável da CP admitiu que “houve uma política deliberada de emagrecer, cortar gorduras, no setor técnico administrativo” da CP.

Numa audição ‘acesa’, com várias interrupções e trocas de palavras entre deputados e o convidado, os deputados consideraram que Manuel Queiró deixou várias questões por responder, enquanto o convidado entendeu que a questão foi esclarecida.

Em 19 de abril, o Correio da Manhã noticiou o caso, após Cristina Dias ter sido anunciada como secretária de Estado da Mobilidade e, no mesmo dia, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, defendeu que a governante recebeu a sua indemnização com base em 18 anos de trabalho na CP e que até se lhe aplicou “o mais baixo dos dois salários que poderia ser ponderado”, como técnica superior e não como administradora, cargo que exercia quando deixou a empresa.

Na semana passada, o ex-diretor da EMEF Francisco Fortunato considerou que nenhuma norma foi cumprida na indemnização paga pela CP a Cristina Dias e que, na sua opinião, tratou-se de “um ato de má gestão lesivo do interesse público, feito à total revelia dos normativos existentes e da política de austeridade então aplicada pelo Governo à generalidade dos trabalhadores”, uma vez que a secretária de Estado não cumpria os requisitos para integrar o plano de rescisões por mútuo acordo.

MPE // JNM

Lusa/Fim