Em entrevista com Cristina Ferreira, na SIC, o primeiro-ministro assumiu que este é um momento assustador para todos os portugueses, sobretudo pela incerteza de saber quanto tempo a atual situação vai durar.
"Nós não sabemos se vamos estar assim um mês, dois meses, três meses e isso obviamente é assustador para todos e nós temos de criar as condições para criar aqui uma cápsula de proteção para podermos atravessar este período de dois ou três meses, de forma a podermos retomar a normalidade da vida", acrescentou.
O primeiro-ministro assumiu que "o sonho que todos temos era que no final deste mês de abril pudéssemos começar a abrir um pouco as portas", mas assumiu que nesta fase ainda ninguém sabe dizer se tal será possível.
Esta garantia não pode ser dada porque "temos um vírus novo, que os próprios cientistas vão conhecendo um bocadinho mais ao nível do comportamento" e porque "ainda estamos na fase em que estamos a aumentar os casos", sendo que "os últimos dias dizem-nos que o ritmo de crescimento está menor".
"Este não é ano de fazermos grandes almoços de Páscoa"
No entanto, alertou, "este momento é perigosíssimo, porque há a Páscoa. É um momento muito difícil para todos percebermos que vamos ter viver a Páscoa de forma radicalmente diferente daquela a que estamos habituados", disse.
No entanto, ressalvou, "se os nossos números são bons, isso é sobretudo graças à grande disciplina dos portugueses. Nós não conseguiríamos ter um polícia em cada rua (...), tem sido a disciplina de cada um".
Passando a questões práticas, o primeiro-ministro lembrou que esta Páscoa "as pessoas não podem ir à terra visitar os seus familiares, (...) este ano temos de dizer aos imigrantes que não venham — além do mais, se vierem, não podem sair de casa, e as famílias numerosas vão ter de estar juntas separadas nas suas próprias casas. Este não é ano de fazermos grandes almoços de Páscoa", concluiu.
Assumindo que estamos a viver "um momento único", Costa disse que o que lhe "dá força e energia é o exemplo extraordinário" dos "profissionais de saúde que estão na linha da frente" e das "pessoas que estão resguardadas nas suas casa".
Sobre a dificuldade de explicar à população mais idosa a necessidade do isolamento social, sobretudo em época festiva, António Costa lembrou que esta doença "é muitíssimo mais perigosa" para "quem tem mais de 65, ou particularmente mais de 70 ou 80 anos".
"São mesmo os mais idosos que têm mais necessidade de se proteger, exatamente porque são aqueles que são mais suscetíveis de ficar contaminados, sendo contaminados vão ter consequências mais graves, é mais difícil tratar e correm maior risco de vida", reiterou.
Ninguém vai perder o ano letivo
Questionado sobre os receios dos alunos, sobretudo aqueles que têm exames este ano ou se encontram em fase de transição — como acontece do ensino secundário para o ensino superior —, António Costa quis deixar a garantia de que ninguém vai perder o ano.
"Não não podemos perder anos. Nós temos de salvar o ano, assegurando a todos a maior justiça na avaliação", disse.
O primeiro-ministro reconheceu ainda que a Internet não chega a todos e adiantou que está a ser estudada uma solução para a distribuição de conteúdos pelos alunos do país através da televisão. No entanto, ressalvou, há hoje dezenas de disciplinas, pelo que a organização de uma grelha de conteúdos em formato "tele-escola" na Televisão Digital Terrestre é mais difícil.
A par, vão continuar a ser utilizadas pelas escolas todas as plataformas digitais a que se tem recorrido para que os alunos continuem a ter acesso a conteúdos formativos e está a "estudar-se ao máximo as oportunidades de a escola poder reabrir, na medida do possível".
Sem querer adiantar quando é que os estabelecimentos de ensino vão voltar a abrir portas, Costa disse que o Governo espera um parecer técnico no próximo dia 7 de abril e o Governo irá decidir no dia 9 do mesmo mês. Todavia, não descurou uma prorrogação do encerramento das escolas pelo menos até ao início do mês de maio.
Relativamente aos apoios às famílias que ficam com os menores de 12 anos em casa, António Costa explicou que a presente situação obrigou à criação de um apoio específico em que 1/3 do valor é assegurado pelo Estado, o outro 1/3 pela entidade empregadora e, por fim, 1/3 corresponde a sacrifício de vencimento por parte do trabalhador. Esta solução apenas está em vigor pelo período em que era expectável que as escolas estivessem abertas, excluindo-se por isso o período das férias da Páscoa, e para crianças com menos de três anos, já que as creches não encerram.
Vacinas, só no próximo ano. Material de saúde? "Há uma luta brutal em todo o mundo"
Durante esta conversa, António Costa assumiu que pode faltar material médico e de proteção em determinados locais — "Se falta aqui ou ali? Falta" —, mas ressalvou que "todos os dias nós adquirimos cada vez mais material para satisfazer as necessidades que são constantes".
Explicou o primeiro-ministro que "hoje estamos a pagar uma fatura imensa de esses produtos serem produzidos sobretudo por um país [China] que esteve dois meses fechado". A par, esses produtos "levam muito tempo a chegar".
Estamos portanto, explica, num cenário de escassez de recursos. "Há uma luta brutal em todo o mundo", disse.
Todavia, salientou, "há um enorme esforço da indústria nacional para se reconverter. Uma empresa de confeções que hoje não tem fatos, nem saias ou camisas para produzir pode converter o seu equipamento para produzir batas e outros equipamentos de proteção", exemplificou.
Questionado sobre se afinal devemos ou não usar máscaras, António Costa disse que a recomendação da DGS continua a não ser a utilização generalizada, mas que "muita gente usa por uma questão de sensação de segurança, e nós não vamos proibir as pessoas de usar".
Já sobre se a DGS não recomenda a utilização deste equipamento porque não existe em quantidade suficiente para todos os portugueses, Costa foi perentório: A DGS tem uma responsabilidade técnica, científica e autonomia e não se pode permitir a isso [dar uma recomendação errada apenas por constrangimentos de disponibilidade de material]".
Sobre vacinas, António Costa deixou claro que "não vai haver vacinas no mercado para todos nós antes da primavera/verão do próximo ano, o que significa que vamos viver mais um inverno com vírus e sem vacina. Aquilo que temos de conseguir nesta fase é gerir a pandemia de forma a contê-la, para que não haja uma destruição do serviço nacional de saúde ou uma contaminação generalizada" pela população.
O primeiro-ministro salientou ainda que se hoje temos "88% das pessoas diagnosticadas em tratamento domiciliário", tal não acontece "por incapacidade do sistema de saúde, mas porque não é necessário ir para o hospital".
Por outro lado, ainda no que concerne a gestão dos recursos existentes, "esta doença tem um período de cura superior ao normal", pelo que os internamentos se podem prolongar no caso de pessoas que precisem de assistência hospitalar.
Salientando que a confiança é essencial, António Costa explicou que é por isso que se estão a montar hospitais de campanha que não sendo necessários à data de hoje podem vir a ser ou a comprar ventiladores apesar da disponibilidade nacional neste momento não estar para já esgotada, contando-se cerca de 1142 ventiladores disponíveis. "Ninguém viver em Portugal uma situação em que os médicos têm de estar a escolher a quem vão aplicar o ventilador".
Sobre a possibilidade de uma pessoa infetada ficar imune ao vírus depois, António Costa salientou que "isso ainda não é seguro" nesta fase, pelo que "é fundamental que com sintomas ou sem sintomas todos tenhamos o maior recato possível" para não ficarmos contaminados e não contaminar outros.
Mais medidas depois do Estado de Emergência? "Vamos apertar um bocadinho"
Já sobre o previsível prolongamento do Estado de Emergência — que Marcelo decide hoje — e as medidas que se lhe podem seguir, Costa assumiu que poderão reforçar-se algumas medidas para evitar deslocações durante a Páscoa.
"Vamos adotar medidas mais claras para que as pessoas percebam que no período da Páscoa não podem mesmo andar a circular e devem ficar na sua residência permanente. Acho que vamos ter de apertar um bocadinho, dando um sinal mais claro de que não é mesmo época para andarmos de um lado para o outro".
Haverá durante o período da Páscoa "mais polícias na rua", mas o primeiro-ministro destacou que a ação das autoridades tem sido sobretudo "pedagógica".
Sobre uma eventual redução dos constrangimentos, António Costa disse que não pode "governar pela esperança" e que uma eventual reabertura de serviços terá de ser gradual. "Quando reabrirmos temos de ir reabrindo devagarinho porque o vírus vai continuar a estar entre nós, temos de dar passos de forma controlada", disse.
Costa assumiu que o covid-19 pode ser um vírus com o qual temos de vir a saber conviver socialmente, como aconteceu no passado com o sarampo, no entanto, ressalvou, "não estamos nessa fase" e a palavra de ordem é contenção.
"Vamos sair mais pobres"
Já no final desta entrevista à SIC, António Costa assumiu que o país vai sair mais pobre e mais frágil economicamente desta crise.
Depois deste período "vamos melhorar a nossa autoestima coletiva, mas vamos sair mais pobres, mais frágeis do ponto de vista económico", disse Costa.
A prioridade é "fazer todo o esforço para que as empresas não fechem, para que não se percam empregos — mesmo com perda de rendimentos — e para que o rendimento seja quebrado o mínimo possível".
Reconhecendo que "uma boia não nos salva do tsunami", referindo-se desta forma às medidas de apoio extraordinárias aprovadas para apoiar empresas e famílias, António Costa salientou que "é preciso salvar vidas sem destruir a vida", isto é, a economia do país que garante empregos e ordenados.
"Vamos sair [desta crise], mas é cedo para dizer que estamos no princípio dessa saída", disse Costa.
Questionado sobre se preferia não governar o país neste momento, António Costa respondeu que tem "muito orgulho de poder servir o país neste momento tão difícil. Mas tenho uma enorme angústia de saber se estou à altura deste momento e do esforço que temos de fazer", acrescentou.
"Estamos todos a aprender", concluiu.
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