De acordo com um estudo conjunto do Observatório Europeu das Drogas e da Toxicodependência (EMCDDA, na sigla em inglês) e da Europol, hoje apresentado em Bruxelas, este aumento regista-se pelo quarto ano consecutivo e “sugere uma elevada disponibilidade desta droga”.

No topo das apreensões em 2020 esteve a Bélgica (70 toneladas), os Países Baixos (49) e a Espanha (37), representando três quartos do total europeu, mas foram também grandes quantidades apreendidas em Itália (13,4), França (13,1), Alemanha (11) e Portugal (10).

A cocaína é a segunda droga ilícita mais consumida na UE, depois da canábis, tendo o seu valor no mercado retalhista, em 2020, sido estimado em 10,5 mil milhões de euros, adianta o estudo.

Por outro lado, segundo a agência europeia sediada em Lisboa, as metanfetaminas representam ainda “um papel relativamente pequeno” no mercado de droga europeu, mas são uma “ameaça crescente”, com maior disponibilidade e consumo por novos grupos.

“A Europa é também uma zona de destino e de trânsito desta droga proveniente de outros centros de produção (por exemplo do Irão, da Nigéria e do México) com destino à Ásia e à Oceânia. A indústria emergente da metanfetamina no Afeganistão representa uma ameaça para a UE, devido aos preços competitivos e às rotas de tráfico de droga há muito estabelecidas com destino à Europa”, adianta.

As tendências a longo prazo apontam para uma expansão constante do mercado, já que entre 2010 e 2020, o número de apreensões de metanfetamina na UE-27 mais do que duplicou (de 3.000 para 6.200 toneladas), enquanto as quantidades apreendidas em 2020 aumentaram 477%, para 2,2 toneladas.

Em 2020, nove Estados-membros da UE comunicaram o desmantelamento de 215 laboratórios de metanfetamina, que tradicionalmente ocorre em “pequenas cozinhas”, sobretudo na República Checa e nos seus países vizinhos.

Embora estes ainda existam, o EMCDDA diz que há agora uma “preocupação crescente” quanto às instalações situadas na Bélgica e nos Países Baixos, onde a metanfetamina pode ser produzida em maior escala.

Europa mais ativa na produção e comércio internacional de droga

A Europa desempenha um papel cada vez mais preponderante na produção e comércio internacional de cocaína e metanfetaminas e a colaboração entre narcotraficantes a nível global está a criar novas ameaças à segurança e a expandir o mercado.

O estudo refere que “o papel da Europa na produção e no comércio internacional de droga está a mudar” e aponta para “o aumento das atividades de produção” destes estupefacientes.

“A análise abrange as tendências ao longo da cadeia de abastecimento, desde a produção e o tráfico, até à distribuição e ao consumo. Descreve um mercado de cocaína vasto e em expansão e um mercado de metanfetamina atualmente pequeno, mas, em constante crescimento na UE”, destaca o relatório.

Alerta igualmente para o aumento da ameaça que a inovação representa nos processos de produção e nos precursores químicos, bem como para o aumento da gama de produtos que podem ser perigosos para os consumidores.

Dados recentes publicados no estudo sugerem também que grandes quantidades de cocaína em pó foram processadas na Europa a partir de produtos intermediários, como a pasta de coca e a base de cocaína, alguns destes contrabandeados da América do Sul em materiais de transporte (como carvão, plásticos) e extraídos posteriormente em instalações especializadas.

A disponibilidade de grandes quantidades de base de cocaína e de pasta de coca na Europa cria um risco de emergência de novos produtos de cocaína fumável (exemplo do 'crack') nos mercados de consumo europeus, representando "riscos sanitários e sociais consideráveis".

A este propósito, o diretor do EMCDDA, Alexis Goosdeel, afirma que existe “uma ameaça crescente” de um mercado “mais diversificado e dinâmico, impulsionado por uma colaboração mais estreita entre organizações criminosas europeias e internacionais”, que resultou em “níveis recorde de disponibilidade de drogas, aumento da violência e da corrupção e maiores problemas de saúde”.

O diretor da agência europeia sediada em Lisboa lembra que “a Europa é uma importante região produtora de drogas sintéticas”, tanto para os mercados internos como externos, e, “cada vez mais, um ponto de transbordo importante para drogas provenientes de outros locais e destinadas a outras partes do mundo”.

“Quer no caso da cocaína como no da metanfetamina, há provas de que grupos criminosos da América Latina e da Europa são parceiros na produção, no tráfico e na distribuição”, garante Goosdeel.

Por seu turno, a diretora-executiva da Europol, Catherine De Bolle, refere que “o comércio de drogas ilegais continua a dominar a criminalidade grave e organizada na UE e perto de 40% das redes criminosas internacionais reportadas à Europol estão ativas no tráfico”.

As conclusões hoje apresentadas em Bruxelas baseiam-se em dados e informações do sistema de monitorização de droga do EMCDDA e em informações operacionais da Europol sobre a criminalidade organizada.

De acordo com a mesma responsável, é necessário “identificar rapidamente ameaças emergentes para a saúde e segurança, investir na capacidade forense e toxicológica para acompanhar a inovação, visar a cadeia de abastecimento de drogas ilícitas e reduzir as vulnerabilidades nas fronteiras externas”.

Esquemas de logística no tráfico de droga são atividade paralela emergente

O apoio logístico aos narcotraficantes está a tornar-se um negócio paralelo ao tráfico internacional de droga, com grupos especializados em fornecer químicos, equipamentos, conhecimentos especializados e instalações, alerta o relatório europeu.

De acordo com o documento, embora muitas redes criminosas continuem a gerir as suas atividades, “outras atualmente subcontratam uma série de serviços ao longo da cadeia de abastecimento”.

“As análises de hoje mostram como o apoio logístico se tornou num negócio paralelo, com alguns grupos criminosos especializados em fornecer os produtos químicos, o equipamento e os conhecimentos especializados necessários para a criação e operação de instalações de produção”, sublinha o relatório.

Segundo os dados, a análise das comunicações criminais encriptadas, através de operações recentes de grande visibilidade, mostrou que o comércio depende muitas vezes de uma rede de facilitadores e corretores que ligam produtores, transportadores e distribuidores.

O relatório acrescenta que as redes criminosas europeias “estão a aumentar a eficiência da produção com base no saber-fazer dos seus homólogos nas regiões de produção de droga da América Latina”.

O mesmo documento dá conta que “o aumento da violência e da corrupção há muito detetadas nos países tradicionalmente produtores de droga, são cada vez mais evidentes na UE”.

As análises salientam que, em alguns Estados-Membros da UE (Bélgica, Espanha, França, Países Baixos), a concorrência entre os fornecedores de droga se intensificou, o que resultou num aumento dos confrontos violentos.

“O mercado da cocaína da UE, em expansão, provocou um aumento dos homicídios, raptos e intimidação e a violência alastrou para fora do mercado da droga (por exemplo advogados, funcionários públicos, jornalistas). Entretanto, o crescimento da produção de metanfetamina em grande escala na Europa tem o potencial de ‘fomentar uma maior corrupção ao longo da cadeia de abastecimento, criando uma economia paralela’”.

O estudo conjunto estima ainda de que a corrupção que quase 60% das redes criminosas utilizem a corrupção como facilitadora da sua atividade.

O estudo, realizado entre 2018 e 2020, alerta igualmente para os danos, riscos e custos ambientais da atividade da produção e tráfico de droga, já que a mesma provoca a deposição de resíduos químicos, que pode resultar em danos ecológicos, riscos para a segurança pública e elevados custos de limpeza.