Segundo a organização não-governamental (ONG) de defesa dos direitos humanos, este caso concreto faz parte de uma “longa história de utilização de crianças em conflitos armados”.

“É deplorável usar civis inocentes desta forma, especialmente crianças. Myanmar tem de exigir publicamente às suas Forças Armadas que deixem de usar estas práticas repugnantes e processem aqueles que as praticam”, disse hoje a investigadora da HRW no território birmanês, Manny Maung, em declarações à agência espanhola EFE.

O caso concreto agora denunciado pela ONG internacional aconteceu no passado dia 05 de outubro no conturbado estado de Rakhine.

Nesse dia, segundo a HRW, um grupo de soldados obrigou vários civis, identificados como camponeses, a caminharem à sua frente para identificar potenciais minas no terreno e para serem escudos humanos perante uma eventual ameaça.

Durante o percurso, desencadeou-se um tiroteio com elementos do Exército Arakan, um grupo étnico guerrilheiro em Rakhine que luta por mais autonomia, e duas crianças morreram no fogo cruzado.

Num comunicado publicado na quarta-feira, a HRW afirmou que “este recente incidente mostra que o Tatmadaw [o exército birmanês] continua a usar crianças nas hostilidades”, apesar do país ter sido retirado, por decisão do secretário-geral da ONU, da lista de Estados que cometem violações dos direitos humanos contra menores.

No final de outubro passado, as Forças Armadas birmanesas anunciaram que iam investigar as mortes destes dois menores, cuja identidade não foi divulgada.

Existem indicações, no entanto, que apontam que as duas vítimas mortais pertencem à minoria muçulmana ‘rohingya’, que tem sido alvo de uma campanha de repressão por parte do exército de Myanmar.

Ainda em declarações à EFE, a investigadora da HRW lembrou que “o exército birmanês se abstém regularmente de conduzir investigações imparciais e independentes quando os respetivos soldados são acusados de violações dos direitos humanos”.

Nos últimos dois anos, Rakhine é cenário de um conflito entre as forças armadas birmanesas e o Exército Arakan, uma guerrilha que luta pela autonomia da comunidade ‘rakhine’, um grupo étnico predominantemente budista maioritário naquele estado.

Este conflito já obrigou ao deslocamento de dezenas de milhares de civis.

Os ‘rohingyas’, etnia a que pertencem as crianças mortas, também são alvos de ações das milícias budistas.

Milhares de ‘rohingyas’ procuraram refúgio no Bangladesh, sobretudo na zona de Cox’s Bazar, desde meados de agosto de 2017, quando foi lançada, no estado de Rakhine, uma operação militar do exército birmanês contra o movimento rebelde Exército de Salvação do Estado Rohingya devido a ataques da rebelião a postos militares e policiais.

Em outubro passado, o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) estimava que 860 mil ‘rohingyas’ vivem no Bangladesh em campos próximos da fronteira com Myanmar, enquanto outros cerca de 150 mil se encontram refugiados em outros países da região.

Estima-se igualmente que cerca de 600 mil ainda vivem no território birmanês.

A campanha de repressão do exército de Myanmar contra esta minoria foi descrita pela ONU como limpeza étnica e um possível genocídio, incluindo o assassínio de milhares de pessoas, a violação de mulheres e de crianças e a destruição de várias aldeias.