"Até dizemos que são pessoas 'sem abrigo' e não arranjamos a primeira prioridade, que é justamente o abrigo?", questionou à agência Lusa o diretor executivo da associação, Américo Nave.

O projeto É uma Casa, que este ano venceu o prémio Gulbenkian para a Coesão, começou em 2013 na Mouraria com sete pessoas para quem a associação alugou casas em Lisboa.

"Havia pessoas na rua cronicamente, há 20 anos, que não aderiam a estrutura nenhuma, nem sequer queriam falar com as pessoas das equipas de rua", lembrou.

Foi destas pessoas que a associação não desistiu e foram elas que acabaram a destruir o mito de que há pessoas sem abrigo "que não querem sair da rua".

Começando pela casa, as suas vidas estabilizam e ficam "mais recetivas e tranquilas" para aceitar a ajuda para outras áreas em que estão desligados do resto da sociedade, como a inscrição no centro de saúde ou a obtenção do cartão de cidadão.

No projeto É uma Casa, há a preocupação de alojar as pessoas por toda a cidade, sem concentrar no mesmo prédio ou na mesma zona geográfica, mas as mudanças no mercado imobiliário que aconteceram em Lisboa desde o início significam que há "mais dificuldades em alugar casas e casas cada vez mais caras", com senhorios que querem renegociar os contratos.

Aos senhorios, é explicado o objetivo do projeto, mas não é dito quem vai morar na casa. A eventuais reservas do senhorio, a associação responde com o acompanhamento permanente das equipas.

Para quem entra numa casa alugada pela associação, a contrapartida é deixar-se acompanhar pelas equipas, que em alguns casos fazem uma ou duas visitas diárias para acompanhar os que têm mais necessidades, mas no mínimo aparecem seis vezes por mês.

A participação dos inquilinos na renda é 30% do seu rendimento, seja ele qual for.

Na maior parte das casas está apenas uma pessoa ajudada pela associação, mas há também casais e uma família com filhos.

A associação ainda não decidiu o que vai fazer com os 50 mil euros do prémio, mas Américo Nave destaca que depois da habitação e da estabilização da vida das pessoas, é preciso intervir na sua empregabilidade.

O júri dos prémios Gulbenkian 2018 elogiou "a capacidade deste projeto para inspirar políticas públicas em Portugal, onde se estima existirem cerca de 3.500 sem-abrigo".

Os Prémios Gulbenkian serão entregues na sexta-feira às 18:30, em Lisboa, pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, coincidindo com o dia da morte do empresário arménio Calouste Gulbenkian.