"Posso confirmar que a operação de segurança no complexo de Dusit terminou há uma hora e que todos os terroristas foram liquidados", informou o presidente do Quénia, Uhuru Kenyatta, ontem, em conferência de imprensa. Kenyatta elogiou ainda o trabalho das forças de segurança, destacando que "mais de 700 civis foram retirados do complexo desde o início do ataque até as primeiras horas da manhã".

O grupo Al Shebab informou que o ataque foi uma represália pela decisão do presidente Donald Trump de transferir a embaixada americana de Israel para Jerusalém, numa mensagem captada pelo grupo de vigilância SITE. Segundo o SITE, o ataque foi orquestrado pelo líder da Al-Qaeda, Ayman al Zawahiri.

O ataque foi perpetrado por cinco indivíduos e todos morreram, segundo o chefe da polícia queniana, Joseph Boinnet. "Um foi o suicida que se explodiu, dois foram mortos durante a noite e outros dois hoje (na madrugada de quarta-feira)". Boinnet informou ainda que o ataque matou 16 quenianos, um americano, um britânico e "três pessoas de origem africana ainda não identificadas".

O americano que morreu no ataque é Jason Spindler, um consultor especializado em projetos de economias emergentes que tinha sobrevivido aos atentados de 11 de setembro de 2001 (11-S) nos Estados Unidos.

Jason Spindler "era um sobrevivente do 11-S e um lutador. Estou certo de que os enfrentou", diss no Facebook o seu irmão, Jonathan. Spindler, que estudou na Universidade do Texas, em Austin, e na Universidade do Nova Iorque, integrou os Corpos de Paz no Peru.

Quando se deu o ataque de 11 de setembro de 2001, Spindler estava a trabalhar para o banco de investimentos Salomon Smith Barney, com sede no World Trade Center (Torres Gémeas), que desabou depois de ser atingido por aviões sequestrados por terroristas da Al-Qaeda.

Este foi o atentado mais sangrento da história dos Estados Unidos, com quase 3 mil mortos. Kevin Yu, amigo do consultor, disse que Spindler foi um herói do 11 de setembro, ao ajudar várias pessoas a sair do prédio em chamas. Proprietário da empresa de consultoria e investimentos I-Dev, Spindler trabalhava atualmente num projeto no Quénia.

A investigação

Um dos membros do comando de ataque foi identificado e a casa onde vivia em Ruaka, no subúrbio de Nairóbi, foi revistada pela polícia. Dois suspeitos foram detidos no bairro de maioria muçulmana de Eastleigh, e outro em Ruaka, informou à AFP o diretor de investigações criminais George Kinoti.

Boinnet revelou que o ataque coordenado contra o complexo DusitD2 começou com uma forte explosão, ouvida a mais de cinco quilómetros de distância. Depois, houve muitos disparos.

As imagens do circuito interno de segurança divulgadas pela imprensa local mostram quatro homens equipados com armas automáticas e granadas a entrar no complexo, e pelo menos um extremista detonou os seus explosivos.

Parentes das vítimas reuniram-se perto do necrotério, mas não foram autorizados a ver os corpos.

créditos: SIMON MAINA / AFP

"A minha irmã não está em nenhum hospital e, da última vez que nos falamos, ela, de repente, começou a chorar e a gritar, e eu ouvi tiros", lamentou uma mulher chamada Njoki. "Não temos dúvida. O corpo dela deve estar aqui", completou.

Num comunicado divulgado em Nova Iorque, o secretário-geral da ONU, António Guterres, "condenou veementemente" o ataque, descrito como "cobarde" pelo presidente da Comissão da União Africana, Mussa Faki.

Não é a primeira vez que o país vive um ataque tão violento.

Em 7 de agosto de 1998, um ataque reivindicado pela Al-Qaeda contra a embaixada dos Estados Unidos em Nairóbi deixou 213 mortos e 5.000 feridos.

E, desde que as Forças Armadas quenianas foram mobilizadas, em outubro de 2011, na Somália para combater os islamitas shebab, o Quénia passou a ser regularmente atacado.

Em 21 de setembro de 2013, um comando islamista atacou o centro comercial Westgate em Nairóbi. A operação para pôr fim ao ataque durou 80 horas e deixou 67 mortos.

Em 2 de abril de 2015, um ataque matou 148 pessoas na Universidade de Garissa (leste), a maioria estudantes.

Expulsos de Mogadíscio em 2011, os shebabs perderam grande parte dos seus bastiões. Continuam, porém, a controlar importantes setores rurais, de onde lançam operações de guerrilha e ataques suicidas.

O governo da Somália tem o apoio da comunidade internacional e dos cerca de 20.000 membros da União Africana na Somália (Amisom), que conta com elementos do Quénia.

Este ataque ocorre três anos após a operação contra a base queniana da Amisom de El Adde, no sul da Somália. Os shebabs alegaram ter matado 200 soldados quenianos.

* por Nicolas Delaunay e celine Clery / AFP