O alerta foi dado à Lusa por Luis Teixeira, proprietário de um empreendimento turístico junto da albufeira, mostrando fotografias e vídeos da água, com manchas azuis claras de um produto pastoso e não identificado. O responsável culpa os olivais intensivos à volta da barragem, constantemente pulverizados com químicos que acabam por ir parar à água.
A vice-presidente da Câmara Municipal de Avis, Inês Fonseca, que tem entre outros o pelouro do turismo, disse hoje à Lusa que o que se está a passar é um problema e que teme que interditem a prática de desportos náuticos na albufeira.
“A agricultura é importante, mas tem de se conseguir que todas as atividades sejam compatíveis”, alertou, afirmando que o que está a acontecer coloca em causa os investimentos para a prática de desportos náuticos, como o remo, a canoagem, o triatlo ou a natação em águas abertas.
Inês Fonseca disse que a autarquia já tem falado com os agricultores mas que estes respondem que o problema não é causado por eles, ao que a responsável garante que a Câmara tem feito tudo para eliminar qualquer tipo de descarga para a albufeira e que todas as juntas de freguesia já têm estações de tratamento.
A vice-presidente da câmara de Avis não tem dúvidas de que o problema das cianobactérias surgiu com o aparecimento da agricultura intensiva, basicamente olival, na qual se usa “muitos fertilizantes” que com a chuva acabam na água. A delegação da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) confirmou a existência de cianobactérias (também conhecidas como algas azuis).
O Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge fez análises à água retirada do meio da albufeira há cerca de duas semanas e o resultado foi o mesmo. Uma bióloga escreveu, num documento a que a Lusa teve acesso, que “a concentração de microcistinas (a toxina de Microcystis aeruginosa) era de tal forma alta que mesmo com a diluição máxima não foi possível dosear”.
A especialista alertou que aquela massa de água “é potencialmente perigosa” e que para o gado, que bebe grande quantidade de água, pode ser letal, porque as microcistinas (toxinas produzidas por cianobactérias) são hepatotóxicas (produzem danos no fígado).
Inês Fonseca disse à Lusa que a Câmara também já contactou as autoridades de saúde e que hoje mesmo vão fazer análises à água.
“Estamos a rever o Plano Diretor Municipal (PDM). Tivemos uma reunião com a Direção-Geral de Agricultura, queríamos fazer uma área de salvaguarda dessa agricultura mas disseram-nos que não há forma de impedir a agricultura intensiva”, porque a lei não o permite, adiantou.
Basicamente, diz, a Câmara não pode impedir a agricultura intensiva, não sabe na maior parte das vezes quem são os donos.
“As pessoas queixam-se, há um produto branco no chão, que se agarra aos carros, às casas, é toda a gente a queixar-se mas a Câmara não pode fazer nada, não tem respostas para lhes dar. A nossa ideia era no PDM tentar limitar um pouco a agricultura. Tenho muita pena se nos interditarem a prática de desportos náuticos na barragem”, que é a ancora do turismo em Avis, afirmou Inês Fonseca.
Pior ficará Luis Teixeira, proprietário de um empreendimento junto da barragem virado para os desportos náuticos. Ele mesmo desportista, começou a remar ali aos 16 anos, participou em nove campeonatos do mundo de remo e em 2009 construiu o hotel, que acolhe os estágios de muitas equipas internacionais de remo.
Luis Teixeira disse à Lusa que a água já tinha estado assim em 2018 e 2020 e acrescenta que a única alteração no local nos últimos anos foi ambiental, com a plantação de olival intensivo à volta da barragem.
O empresário diz que é urgente resolver o problema da barragem do Maranhão e diz que a APA não tem feito nada, nem em anos passados nem neste. Em 2020, exemplificou, foi comunicado o problema em maio e a APA respondeu em outubro. “Nunca foi tomada qualquer providência e a situação só tem vindo a piorar”, disse, adiantando que há mau cheiro perto da água.
Luís Teixeira diz mesmo que há falta de vontade para resolver o problema, que se teima em ignorar o que se passa na água no Maranhão.
“Não posso ouvir dizer que somos os líderes da descarbonização quando no terreno a situação é esta”, afirmou.
Para José Núncio, presidente da Associação de Regantes do Vale de Sorraia, “a situação não é nova infelizmente e aparece com temperaturas altas e depois desaparece. São as cianobactérias a desenvolver-se e dá aquele aspeto, e depois o vento empurra-as para as margens, no meio da albufeira não se vê”.
José Núncio, não nega que o olival possa ser uma das origens do problema mas acrescenta: “são albufeiras antigas, que entram em processo de eutrofização. São 67 anos de lodo e o olival leva pouca água”, diz, afirmando esperar que dentro de dois ou três dias a situação normalize.
A associação junta 1.800 agricultores, beneficiários do Maranhão e de Montargil, sendo que esta última barragem não tem problemas assim. Nas declarações à Lusa José Núncio diz que as cianobactérias não têm efeito na rega, que está a começar agora, mas alerta que a barragem não é uma piscina e que tomar banho junto da espuma azul pode ser perigoso para a pele.
Espuma azul, lodo ou produto pastoso branco, diz e repete Inês Fonseca: Venham ver, venham ver e falar com as pessoas.
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