Num documento de 40 páginas hoje publicado que estabelece a posição inicial do Reino Unido para as negociações de um acordo de comércio com a UE, que começam na próxima semana, afirma o empenho em "trabalhar de maneira rápida e determinada" até junho, altura para a qual está marcada uma cimeira de alto nível para avaliar os progressos.
"O governo espera que, a essa altura, o esboço geral de um acordo seja claro e possa ser finalizado rapidamente em setembro. Se esse não parecer ser o caso na reunião de junho, o governo vai ter de decidir se a atenção do Reino Unido deve afastar-se das negociações e concentrar-se apenas em continuar os preparativos internos para sair do período de transição de maneira ordenada", refere.
O governo britânico identifica como principal ponto de discórdia a exigência da UE de respeito pelas regras e leis europeias pós-Brexit, propondo em alternativa um "relacionamento baseado na cooperação amigável entre iguais soberanos, com ambas as partes respeitando a autonomia legal e o direito de gerir os seus próprios recursos como entenderem".
"Aconteça o que acontecer, o governo não negociará qualquer acordo em que o Reino Unido não tenha o controlo das suas próprias leis e vida política. Isso significa que não concordaremos com nenhuma obrigação para que as nossas leis sejam alinhadas com as da UE ou que as instituições da UE, incluindo o Tribunal [Europeu] de Justiça, tenham jurisdição no Reino Unido", vinca.
Na Declaração Política que acompanhava o Acordo de Saída da UE estava escrito que, "dada a proximidade geográfica e a interdependência económica da União e do Reino Unido, o relacionamento futuro deve garantir uma concorrência aberta e justa, englobando compromissos sólidos para garantir condições equitativas".
Porém, o conteúdo do documento não era vinculativo, e o governo britânico argumenta que o programa eleitoral com que foi eleito com maioria absoluta em dezembro determinava a intenção de "retomar o controlo das fronteiras, leis e dinheiro".
Numa declaração hoje no parlamento, o ministro e Chanceler do Ducado de Lancaster, Michael Gove, argumentou que o princípio da proximidade geográfica não foi um critério usado em acordos de comércio noutras regiões, pelo que não deve ser considerada uma razão para o Reino Unido ter de aceitar as regras europeias que "ponha em causa da democracia".
O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, já tinha dado a conhecer a preferência por um acordo de comércio livre semelhante ao que a UE tem com o Canadá, que permite eliminar as tarifas aduaneiras sobre a maior parte dos produtos.
Dá também ao Reino Unido liberdade para negociar acordos com outros países e estabelecer as próprias regras e leis, embora Johnson tenha rejeitado a intenção de avançar com uma desregulamentação que resulte num ‘dumping', seja comercial, social ou ambiental".
Porém, este modelo de acordo não remove completamente barreiras regulatórias nem garante um acesso total ao mercado único incluindo na área dos serviços, que representa uma parte importante da economia britânica.
No início do mês, o primeiro-ministro disse no parlamento que "progresso rápido" nas discussões sobre serviços financeiros, que representam 7% da economia britânica, e sobre a proteção de dados seriam um teste sobre a natureza construtiva do processo de negociação".
Na Declaração Política estava um compromisso para concluir um entendimento sobre este setor até junho e sobre os dados até ao final do ano, mas estas datas foram omitidas da posição de Bruxelas publicada na terça-feira.
Esta semana, Barnier manifestou-se "preocupações" em relação às recentes posições britânicas sobre a futura parceria entre Bruxelas e o Reino Unido, temendo um "distanciamento" dos compromissos assumidos por Londres.
Em causa estavam só não só as declarações de Boris Johnson e outros ministros, mas também notícias na imprensa britânica de que o governo não pretende construir infraestruturas para realizar os controlos aduaneiros sobre as mercadorias que circulem entre a Irlanda do Norte e o resto do Reino Unido previstos no acordo de saída.
Os 27 Estados-membros da UE, reunidos na terça-feira ao nível de um Conselho de Assuntos Gerais, deram "luz verde" formal à Comissão Europeia para iniciar as negociações com Londres visando uma "parceria ambiciosa, abrangente e equilibrada" com o Reino Unido, em "benefício de ambos os blocos".
No mandato dado à equipa negociadora chefiada por Michel Barnier, o Conselho Europeu indica que "a futura parceria deve ser suportada por compromissos sólidos para garantir condições equitativas de concorrência aberta e justa, dada a proximidade geográfica e a interdependência económica da UE e do Reino Unido", sublinha a estrutura.
Por isso, nestas conversações, "a UE pretende estabelecer um acordo de livre comércio com o Reino Unido que garanta a aplicação de tarifas e quotas zero ao comércio de mercadorias", bem como a "cooperação em aspetos aduaneiros e regulatórios".
Relativamente ao setor das pescas, o bloco comunitário vai defender a "manutenção de um acesso recíproco às águas e quotas estáveis" e que este acordo seja definido até 01 de julho, forma a "determinar as possibilidades de pesca após o fim do período de transição".
A UE vai, ainda, bater-se por "disposições para cooperação futura em áreas como comércio digital, propriedade intelectual, compras públicas, mobilidade, transportes e energia", bem como por uma futura colaboração "judicial em questões criminais e de política externa, segurança e defesa", conclui o Conselho da UE.
As duas equipas de negociadores lançam na próxima segunda-feira em Bruxelas a primeira ronda de negociações, que irá prolongar-se até quinta-feira, devendo a segunda ronda ter lugar ainda em março, em Londres.
As rondas negociais serão realizadas alternadamente em Bruxelas e em Londres.
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