Segundo dados disponibilizados à imprensa pelas autoridades de saúde, Cabo Verde já conta com mais de 180 casos de malária (entre autóctones e importados), um número recorde, já que o maior até agora registado desde 1991 tinha sido 140 casos, em 2000.
A maior incidência de casos é na cidade da Praia, com 171, sendo que o máximo até agora tinha sido 102 (95 locais e sete importados) em todo o ano de 2001.
Na semana passada, o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, convocou uma reunião com diversas entidades com responsabilidade no setor do ambiente, saneamento e segurança, em que foi anunciado um reforço das medidas de combate aos mosquitos.
Deste então, várias equipas da Delegacia de Saúde da Praia percorrem diariamente os bairros onde foram diagnosticados mais casos, fazendo pulverização das árvores e plantas e dentro das casas.
Ernesto dos Santos e Armindo Gomes não se conhecem, mas têm algo em comum. Vivem em dois dos bairros com mais casos de malária na capital cabo-verdiana: Achada de Santo António e Várzea.
Ernesto dos Santos, 65 anos, reformado, passa boa parte do dia a trabalhar na mini-oficina de carpintaria, montada em frente à sua casa em Achada de Santo António.
Com a máscara a tapar o nariz, Ernesto abre a porta de sua casa a uma equipa de pulverização, que desinfesta todos os quartos, cozinha, casa de banho, para acabar com qualquer foco de mosquitos.
“Fiquei muito contente com a pulverização à minha casa porque estamos em época de chuvas, em que há muitos mosquitos”, afirmou o sexagenário, que mora com a mulher, um dos seus quatro filhos e alguns netos.
Após a pulverização, Ernesto dos Santos disse sentir-se mais seguro, mas considera que este tipo de ação não deve ser feito apenas dentro das casas habitadas, mas também nos pardeiros abandonados, “que constituem perigo para a sociedade”.
Há quase 60 anos a viver em Achada de Santo António, Ernesto Santos critica as pessoas que deitam lixo e águas sujas nas ruas, nas encostas e nas valas, considerando que todos têm “boa parte da culpa” no surgimento de casos de malária na capital cabo-verdiana.
Mesmo opinião manifestou Armindo “Bijá” Gomes, 59 anos, morador desde sempre na Várzea, outro dos bairros com casos de malária, considerando que a população é “um tanto ou quanto negligente”, uma vez que “não liga e deita lixo e água suja na rua”.
“A pulverização é bem-vinda porque caso contrário torna-se insustentável. É uma atitude louvável, mas espero que não fique só nesta altura, mas sim sempre”, afirmou Armindo Gomes, pedindo colaboração de todos no combate ao mosquito vetor.
“Espero que todos nós, sem exceção, de cima a baixo, apoiemos, ajudemos, para minimizar a praga, porque quem sai a perder é sempre a população mais desfavorecida”, notou Bijá, camionista.
No final da reunião na semana passada, o ministro da Saúde, Arlindo do Rosário, pediu o envolvimento de todas as estruturas e da população para combater os mosquitos.
O diretor do Programa Nacional de Luta contra o Paludismo (PNLP), António Moreira, disse que o saneamento continua a ser um “problema enorme” no país, agravado com as altas temperaturas e as águas acumuladas, que aumentam os viveiros de mosquitos.
A delegada de Saúde da Praia, Ulardina Furtado, também apelou à população para colaborar, bem como a todas as instituições para que “façam a sua parte”.
Em declarações à imprensa na quinta-feira, o presidente da Câmara Municipal da Praia, Óscar Santos, disse que a autarquia da capital já demoliu mais de 200 pardeiros e removeu algumas carcaças de viatura da via pública e que as atividades vão continuar.
Óscar Santos avançou que a Câmara da Praia já fez “investimentos enormes” no saneamento, mas ainda precisa de cerca de 20 milhões de escudos (181 mil euros) para acelerar o processo de limpeza urbana e reduzir os casos de paludismo “em pouco tempo”.
Considerando que só a Câmara ou o Governo não conseguem resolver todos os problemas, o autarca pediu também colaboração de praienses, com mudança de hábitos, atitudes e comportamentos.
Por Ricardino Pedro, da agência Lusa
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