“A Câmara Municipal está muito aberta a continuar o processo de diálogo e debate sobre quais são os termos do concurso para aluguer da sala, que continua de teatro e continua a ser da Câmara. Estamos disponíveis para discutir termos, valências, mas não alimentamos preconceitos contra iniciativas particulares”, afirmou hoje o presidente da autarquia, Fernando Medina (PS), na Assembleia Municipal de Lisboa (AML), durante um debate de urgência sobre o processo de concessão do Teatro Municipal Maria Matos, pedido pelo PCP.
A vereadora da Cultura, Catarina Vaz Pinto (PS), anunciou, em entrevista ao Público, a 21 de dezembro, um novo projeto de gestão dos teatros da autarquia, que, disse, tem por objetivo resgatar lugares associados à cultura e diversificar a oferta cultural da cidade.
O plano abrange 11 teatros, dois dos quais – São Luiz e Maria Matos – estão sob gestão da Empresa Municipal de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural (EGEAC). Em declarações à Lusa, Catarina Vaz Pinto explicou que o novo plano contempla que apenas o Teatro Maria Matos seja gerido por uma entidade externa.
Hoje, na Assembleia Municipal, Catarina Vaz Pinto reiterou o que disse em dezembro e repetiu hoje em entrevistas à Lusa e ao Diário de Notícias, salientando que o plano irá permitir o “resgate de mais dois teatros para a cidade [Bairro Alto e Luís de Camões] e a diversificação de públicos”, e que o Maria Matos “deverá ser vocacionado prioritariamente para teatro de grande público”, mantendo “a relação com o território e a comunidade envolvente”.
“A Câmara irá arrendar [o teatro] por cinco anos a uma entidade com base na qualidade do projeto artístico”, disse.
A maneira que a vereadora escolheu para anunciar o plano foi criticada hoje por vários grupos municipais, tendo o PCP, através da deputada Ana Margarida de Carvalho, sublinhado que a decisão “não foi de facto debatida, mas foi questionada e não respondida”, recordado que o partido fez perguntas ao executivo “por duas vezes” na AML.
O deputado do CDS Diogo Moura salientou o “erro crasso” de “primeiro falar com a comunicação social e só depois os eleitos pedirem explicações”. “Hoje [a vereadora] diz, a um jornal, que decisão está tomada. Não sei o que vimos aqui fazer”, afirmou.
Posição semelhante teve Nádia Teixeira do MPT, para quem a “comunicação social fez um papel que não lhe deveria caber”.
Cláudia Madeira, do Partido Ecologista Os Verdes (PEV), destacou o facto de a decisão ter sido tomada “sem ouvir os órgãos eleitos nem os agentes culturais”, salientando que “várias questões ficaram por responder”, pondo em causa o “direito à informação”.
Pelo Bloco de Esquerda (BE), Ricardo Moreira salientou que a vereadora “deu conhecimento do plano à comunicação social, mas não escreveu uma só linha sobre o plano em documentos oficiais”.
“Não foi a reunião de Câmara, não foi apresentado aqui, não está no Orçamento, não está nas Grandes Opções do Plano (GOP), não está no plano de atividades da EGEAC. A vereadora atira a pedra e esconde a mão, porque não tem coragem de assumir o plano nos documentos oficiais”, afirmou, considerando que Catarina Vaz Pinto “não tem legitimidade política e executiva para aprovar esse plano em 2018”.
Também Inês Sousa Real do Partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) sublinhou que “a intenção não foi manifestada nem na época eleitoral nem nas GOP [Grandes Opções do Plano], revelando opacidade”. Já Aline Beauvnik, do PPM, recordou que a decisão “não consta do Orçamento, das GOP, nem da campanha do PS”.
Para o presidente da Câmara “está claro o absurdo dos que vêm referir o problema do método e processo sobre esta matéria”. “Nada mais claro do que vir na comunicação social”, afirmou Fernando Medina.
Mais do que a maneira como a concessão do Teatro Maria MAtos foi anunciada, a maioria dos grupos municipais criticou a decisão em si.
“Continuamos a exigir as explicações que foram negadas à cidade. Afinal porquê o Maria Matos? Trata-se de alienar um equipamento cultural que foi intervencionado recentemente pela autarquia, houve investimento público, obras de requalificação, despesas em equipamento técnico especializado, agora entregue de mão beijada a um privado”, defendeu Ana Margarida de Carvalho (PCP).
Também Ricardo Moreira (BE) sublinhou a entrega do teatro “a privados, depois de dez anos de investimento”. “[O executivo diz que] concessiona a gestão, se o PS assumia que no caso da concessão da Carris era uma privatização, neste caso é igual”, afirmou, acrescentando que “não há plano, há desnorte, falta de transparência, a ideia é um erro e deve ser abandonada”.
Cláudia Madeira (PEV) considerou que a Câmara, “depois de investimentos consideráveis, vira costas ao trabalho consolidado [do teatro] que ainda poderia crescer”. “Demite-se das suas funções. Compreendemos que se fale de reestruturação, mas o sempre que o executivo reestrutura privatiza e isso é errado”, disse.
Para a deputada socialista Simonetta Luz Afonso, está ser feita “uma tempestade num copo de água, confundindo-se gestão privada com privatização”.
“Saído o diretor artístico, Mark Deputter, por livre vontade [do Teatro Maria Matos em outubro] não me parece extemporâneo pensar a rede de teatros. O Maria Matos com um bem pensado caderno programático, não esquecendo relação com o bairro, pode recuperar a sua função original. Sigamos de perto o projeto com vista à sua avaliação”, afirmou.
Também do PS, o presidente da Junta de Freguesia de Alvalade, onde se situa o teatro, defendeu que “importa que se preserve a excelente relação do teatro com a comunidade e o espaço envolvente” e que a junta está “disponível para colaborar de forma construtiva neste processo, sem pré juízo em relação à entidade gestora”.
Os grupos municipais aproveitaram para saudar a petição para a manutenção do Teatro Maria Matos na esfera autárquica, com cerca de 2.500 assinaturas, que deu entrada na AML na terça-feira.
Entretanto, na reunião de hoje, foram votadas e rejeitadas uma moção do PCP “pela rejeição da concessão do Teatro Maria Matos” e duas recomendações: “Pela gestão pública do Teatro Municipal Maria Matos”, do PEV, e “recomendação da criação de um grupo de trabalho independente para a reestruturação da rede de teatros municipais”, do BE.
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