“Não faço qualquer comentário, nem farei, durante esta audição, às decisões tomadas pelo Conselho de Administração que me antecedeu”, afirmou a governante, que está a ser ouvida na comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas com um dos medicamentos mais caros do mundo na qualidade de presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN) à data que o caso foi noticiado.

Ana Paula Martins explicou que “compete às autoridades e ao Governo garantir que existe capacidade” de financiamento dos hospitais para obter o medicamento.

“Sempre o defendi e hoje não defendo outra coisa diferente. Porque é colocar os hospitais, sobretudo em situações extremas, de custos muito elevados. Não estamos a falar de custos que possam ser absorvidos a partir de outras poupanças, como medicamentos genéricos ou biossimilares, ou outro tipo de protocolos clínicos. Tem de facto de haver uma linha de financiamento própria”, defendeu

Na terça-feira, o ex-presidente do Hospital Santa Maria Daniel Ferro recordou que o hospital “não estava preparado para dar execução” a outras situações semelhantes depois de “pagar quatro milhões de euros” pelo tratamento das duas crianças com Zolgensma, em 2020.

“Neste momento, o medicamento já é financiado (…)”, indicou a ministra da Saúde, reforçando não poder fazer comentários sobre a administração de Daniel Ferro.

A governante, que esteve à frente do CHLN cerca de um ano, recordou uma situação com uma bebé, em outubro de 2023, na qual neuropediatra que acompanhou as gémeas em Portugal, Teresa Moreno, expôs a necessidade de garantir o Zolgensma para o tratamento.

“Havia a esta data apenas um e só um medicamento financiado centralmente pelo Ministério da Saúde”, esclareceu, dizendo o Zolgensma não estava integrado na lista de medicamentos financiados e que o hospital que o encomenda “tem que conseguir ter fundos para o financiar”.

A ex-administradora do Santa Maria lembrou que em “junho ou julho de 2023 tinha sido retirada, por parte do Tribunal de Contas, a suspensão que figurou durante a covid-19 de pedido de fiscalização prévia em todas as aquisições que fossem acima dos 750 mil euros”.

“Este medicamento custa muito acima dos 750 mil euros, e o que se pôs na altura, em conversa com os médicos e com o Conselho de Administração, também com a Comissão de Farmácia Terapêutica, foi, existe um medicamento que é financiado, estes outros dois medicamentos não estão financiados centralmente, nós temos que pedir ao Tribunal de Contas que pode levar 30, pelo menos 30 dias, 30 a 60 dias, para dar autorização, e a probabilidade de o parecer ser favorável não era elevada, em função dos fundos, é aquilo que o Tribunal de Contas vê, não vê outras coisas, é como é normal, é a sua função, e por isso, tínhamos aqui um dilema, de facto”, recordou.

Aos deputados, Ana Paula Martins afirmou que “existem regras” e que a seu Conselho de Administração limitou-se “cumpri-las e a colocar a possibilidade mesmo, enfim, não tendo fundos, de adquirir o Zolgensma, se fosse ‘lifesaving’ (socorrismo, em tradução simples) ou se a médica nos justificasse que essa era a situação”.

Ana Paula Martins disse também que nunca teve contacto do ex-secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales, do Presidente da República e do seu filho, Nuno Rebelo de Sousa sobre o tratamento das gémeas.