Estamos em 2007, é dia 21 de abril. Paulo Portas acaba de derrotar o então líder do CDS-PP, José Ribeiro e Castro, e prepara-se para regressar à liderança do partido que abandonou em 2005, depois de, nas eleições legislativas desse mesmo ano, este ter falhado o objetivo a que se propôs de alcançar 10% dos votos e assim evitar uma maioria do Partido Socialista, liderado à data por José Sócrates - o que não aconteceu.

Portas que, em 2005, no discurso em que anunciou aquela que viria a ser a sua primeira demissão da presidência do CDS, dizia “pedi sempre a Deus que me fizesse ver o tempo em que deveria sair. O tempo em que um ciclo termina. E que não ficasse nem mais um segundo para além desse tempo. Eu acho que terminou o ciclo político em que eu presidi ao CDS ao longo de sete anos”.

Nesse ano, seria Telmo Correia a candidatura da "ala Portas" do partido, de uma direção que tinha sofrido um desastre eleitoral nas últimas eleições, mas que tinha como méritos o regresso do CDS à governação com uma coligação pós-eleitoral com o Partido Social Democrata em 2001. No entanto, o caminho escolhido pelos militantes foi outro, com a eleição de Ribeiro e Castro, que viveu dois anos conturbados na liderança dos centristas, um período que terminou com aquilo que muitos descrevem como tendo sido um assalto ao poder, quando Portas anunciou em março de 2007 a intenção de regressar à presidência do partido.

Em conversa com o SAPO24, Nuno Garoupa, economista, professor de Direito na George Mason University, na Virgínia, e autor do livro “A Direita Portuguesa - Da Frustação à Decomposição”, não tem dúvidas de que o que está acontecer agora no CDS, depois de Adolfo Mesquita Nunes ter pedido a marcação de um congresso extraordinário e assumido a disponibilidade para liderar o partido, a meio da presidência da direção liderada por Francisco Rodrigues dos Santos, eleita em janeiro de 2020, “é um remake de 2007 quando Paulo Portas decidiu regressar e apear Ribeiro e Castro”.

O próprio José Ribeiro e Castro admite o paralelismo, apesar de “as circunstâncias, na altura, terem sido bastante diferentes”. “O tipo de manobra é a mesma, como a que também tinha sido feita no final, num período mais prolongado e arrastado, da direção de Manuel Monteiro. Isto é um grupo que se organiza para criar danos na imagem do partido e depois se queixar que a imagem do partido tem danos. É um bocadinho como quando se fumava. A gente enchia a sala de fumo e depois queixava-se, 'ó diabo, está aqui um ambiente tóxico. Não se pode respirar'. E esse fumo era provocado pelas pessoas que enchiam a sala de fumo. Um processo conhecido e portanto... é a história do costume pelas pessoas do costume, não tem nada que saber”.

Neste remake, agora em 2021, não temos o regresso de um ex-líder, que neste caso seria Assunção Cristas, que se demitiu face à pesada derrota eleitoral nas legislativas de 2019, quando o CDS passou de 18 para 5 deputados. Temos, isso sim, o regresso de um antigo vice-presidente dessa direção, Adolfo Mesquita Nunes, naturalmente apoiado por vários membros da direção a que pertenceu, entre os quais os cinco deputados que atualmente representam o partido na Assembleia da República. No xadrez atual, Francisco Rodrigues dos Santos "é" Ribeiro e Castro. Já João Almeida protagoniza um papel duplo, uma vez que teve uma atuação equivalente à de Telmo Correia em 2007, ao ter concorrido e sido derrotado há um ano pelo ex-líder da Juventude Popular.

créditos: PAULO CUNHA/LUSA

Uma grande diferença entre o filme original, de 2007, e o remake de 2021 é o final. Ainda sem um congresso à vista, para além do que está naturalmente previsto para janeiro de 2022, há uma intriga nova no guião, com Francisco Rodrigues dos Santos a resistir à pressão e a convocar um Conselho Nacional para este sábado, onde será votada uma Moção de Confiança à sua direção - e que, numa primeira antecipação feita pelo Observador, tem muitas probabilidades de vir a ser bem sucedida.

Não deixa de ser curiosa também a proximidade das palavras de Adolfo Mesquita Nunes na última semana e as de Paulo Portas em 2007. Este último, justificava a sua tentativa de reassumir a liderança dos democratas-cristãos a dois anos das legislativas de 2009, numa entrevista ao Correio da Manhã, com o "défice de oposição" ao primeiro-ministro que dizia existir e a "falta de liderança" entre os partidos que se opunham ao Governo socialista de José Sócrates.

"Quando vejo uma empresa à beira da falência ou um barco à beira de se afundar não vou estar a calcular qual é o tempo mais conveniente para mim para evitar essa falência ou esse naufrágio", justificava Portas, afirmando que "se nada mudar na oposição, o engenheiro Sócrates ganha as próximas eleições quase por falta de comparência". Um vaticínio que se mostrou certo, mesmo que o antigo líder do CDS tenha conseguido recuperar o partido.

Não muito diferente de Adolfo Mesquita Nunes que, num artigo publicado no Observador, escreveu que “a crise de sobrevivência que o CDS hoje atravessa não conseguirá ser resolvida com esta direção”.

Não colocando em causa a legitimidade da atual direção, uma vez que ganhou o congresso, Mesquita Nunes diz que é “claro e evidente que daqui a um ano, quando o seu mandato terminar, será demasiado tarde para reagir, com os partidos emergentes a consolidar-se cheios de entusiasmo e o CDS a decair projetando uma imagem de erosão. (...) Daqui a um ano, será tarde demais. Se for já, ainda vamos a tempo de autárquicas, ainda vamos a tempo de projetar uma nova força”.

14 anos depois, a batalha é mais complicada porque, para além de o Partido Socialista também estar no governo, há dois novos partidos a mexer com as contas.

“Este remake tem um problema”

“O Adolfo tem a ideia de refundar um CDS, mas o problema é que isto já não é 2007. Esta história é um remake de quando Paulo Portas decidiu regressar e apear Ribeiro e Castro. Só que este remake tem um problema, é que neste momento existe a Iniciativa Liberal e o Chega. Não se percebe bem o que é que o CDS pode ser quando já há dois partidos, um altamente conservador e outro liberal”, explica Nuno Garoupa.

Para o analista, o que está a acontecer à direita “é uma reconfiguração, mas que no fundo é uma crise que vem desde 2015” e a prova de que “o CDS não conseguiu dirigir os resultados eleitorais” de então.

“Na minha análise, a crise do CDS remonta ao irrevogável. O que aconteceu foi que o partido não foi a votos em 2015 e portanto, artificialmente, prolongou-se no tempo. Quando foi a votos teve 4%. Não me parece que Francisco Rodrigues dos Santos possa mudar isso”, sublinha.

Nuno Garoupa vai ainda mais longe, afirmando que o CDS “morreu nos anos 90” depois do regresso de Diogo Freitas do Amaral, fundador do partido, “ressuscitou” mais tarde como partido de Portas e depois disso “é um partido que quando Paulo Portas sai não faz sentido”. “Não se percebe qual é o papel do CDS nesta altura. Já não se percebia durante a troika e agora também não”, sublinha, afirmando que “Francisco Rodrigues dos Santos não conseguiu recriar o CDS”.

créditos: ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

As “caras velhas” e a negligência para com os partidos novos

O muda em parte o argumento deste remake é o facto de o CDS ser uma “uma marca velha", composta por "caras velhas, não em idade, mas no tempo há que estão na política”. Em contrapeso, a IL e o Chega “são caras novas”, algo que Nuno Garoupa vê com importância na interpretação que a sociedade portuguesa faz do panorama político atual.

“O próprio Rodrigues dos Santos é um político profissional. O CDS neste momento é um partido de políticos profissionais, pessoas que não fizeram mais nada da vida a não ser serem profissionais, ou das jotas, ou das assessorias ou dos gabinetes. E isso em Portugal é um enorme problema dos partidos. PS, PSD e CDS neste momento enfrentam uma batalha eleitoral cada vez mais complicada porque só são profissionais, ao contrário do Chega e IL, cujos políticos começaram agora e têm carreiras nas empresas e no Estado”, diz.

Nuno Garoupa diz mesmo que um dos principais problemas do CDS é o de, até agora, “não terem levado a sério a Iniciativa Liberal e o Chega”. “Acharam que aquilo eram epifenómenos sem qualquer representatividade, tanto que esta crise surge quando finalmente se percebe que o Chega tem meio milhão de votos. Foi preciso ir a votos e medir para o CDS acreditar nas coisas, porque no último ano toda a gente passou o tempo a dizer que as sondagens estavam erradas. Isto significa que levaram um ano para aceitar a situação em que estão”, explica.

O CDS dos “grupos, grupinhos e grupetas”

Volvido cerca de um ano e meio das últimas eleições, o CDS participou em dois atos eleitorais: nas eleições regionais dos Açores, onde foram a terceira força política mais votada, apesar de terem perdido votos em relação a 2016, e integraram uma geringonça de direita liderada pelo PSD e que inclui também Chega e Iniciativa Liberal; e nas eleições Presidenciais, em que os centristas optaram por apoiar Marcelo Rebelo de Sousa, integrando assim o campo vencedor na noite eleitoral do passado dia 24 de janeiro.

É no seguimento deste contexto que Adolfo Mesquita Nunes, antigo vice-presidente da direção de Cristas, a quase nove meses das autárquicas, lança o repto para tentar assumir a liderança do partido.

“Isto é o que eu costumo chamar os grupos, grupinhos e grupetas", diz José Ribeiro e Castro. "São pequenas tribos internas que se organizam para criar mau estar e depois tirar proveito do mal estar interno que criam. Esta direção recebeu o partido numa situação terrível: sondagens péssimas, uma situação financeira terrível, muito desgastado, com uma situação orgânica frágil, tendo levado uma pancada nas últimas duas eleições, europeias e legislativas. Pancada essa provocada pelas pessoas que agora dizem que são melhores. Há uma enorme desfaçatez no movimento que é feito. Ao longo deste ano, se percorrer a agenda política dos vários meses, não houve um em que não houvesse uma cena qualquer, um desentendimento, um atrito, um ataque... que aliás teve como último momento mais brilhante o Conselho Nacional de apoio a Marcelo Rebelo de Sousa, no dia 12 de dezembro", refere.

Para Ribeiro Castro, "esse Conselho Nacional foi uma vergonha que enxovalha o partido perante o país. Essas pessoas quiseram empurrar o CDS para um erro monumental que era não apoiar Marcelo Rebelo de Sousa, ao defenderem a apresentação de um candidato próprio. Se o partido tivesse caído nessa esparrela estaria numa situação miserável na noite do dia 24. Teria abandonado o seu espaço natural, que é o espaço que elegeu Marcelo, e estaria confinado com o Chega, a IL e o Tino de Rans. Era aí que estaria, numa situação absolutamente terrível, comprometendo por completo a estrada que tem que fazer para as eleições autárquicas. Se isso fosse feito, os responsáveis dessa estratégia que seriam Adolfo Mesquita Nunes, João Almeida, Nuno Melo, entre outros, iriam responder por isso? Não. Portanto, não é compreensível que tendo a estratégia do partido ganho, primeiro no Conselho Nacional e depois no dia das eleições, dois dias depois se abra uma crise”.

A declaração de prova para a tese de que o que está acontecer no CDS foi “feito propositadamente”, um "movimento premeditado", uma vez que "não houve nenhum facto que o determinasse, a não ser uma premeditação”, diz também Ribeiro e Castro.

Para o antigo líder, “ser democrata é aceitar o resultado dos congressos, aceitar os resultados com desportivismo e no dia a seguir estar a colaborar com os que são eleitos. Eu fartei-me de dizer isto, as eleições num partido são para escolher, não para excluir".

O próprio Ribeiro e Castro confessa ter passado entre 2005 e 2007 pela experiência da luta pela unidade do partido quando uma parte não o queria.

“Não se pode agregar o partido com pessoas que não querem trabalhar em unidade. Francisco Rodrigues dos Santos tem feito tudo para que isso aconteça, mas também já vivi essa experiência, não é possível fazê-lo com quem não quer trabalhar em equipa. Uma pessoa tenta, tenta, tenta, mas o que as pessoas querem é derrubar o presidente para irem para lá elas. Eu não estou aqui a defender o presidente do partido, nem estou alinhado com o presidente do partido. Eu estou alinhado com o partido”, explica, concluindo que a atual direção enfrenta “um grupo de pessoas que há 20 e 30 anos controlam o poder interno e aparelho do partido, e nunca toleram alguém que não pertence a esse grupo, e portanto fazem tudo e mais alguma coisa para o deitarem abaixo. As pessoas do partido sabem que é assim e infelizmente está a repetir-se”, termina.

O problema de Francisco Rodrigues dos Santos

Apesar de preferir deixar os balanços para o final do mandato do atual presidente, Ribeiro e Castro não tem dúvidas em afirmar que a atual direção “precisa obviamente de reforçar a sua capacidade de atuação", ao mesmo tempo que "precisa também de ter mais colaboração da parte dos deputados do partido”.

Os cinco deputados têm sido uma verdadeira pedra no sapato para Francisco Rodrigues dos Santos, ainda antes de chegar a este momento em que a sua presidência é colocada em causa. Basta recordar-nos que Cecília Meireles, eleita nas últimas eleições legislativas pelo círculo do Porto, é considerada um dos principais alvos a abater por parte dos apoiantes da atual direção, que entendem que esta devia ter cedido o lugar na Assembleia da República ao líder do partido, que era precisamente o segundo nome na lista à Invicta.

Já Telmo Correia está de relações praticamente cortadas com a atual direção desde que, em setembro, Francisco Rodrigues dos Santos o visou diretamente quando também criticava o facto de António Costa ter integrado a Comissão de Honra de Luís Filipe Vieira nas eleições ao SL Benfica.

Quanto a João Almeida, pouco mais há dizer para além de relembrar que foi o adversário direto de Chicão no congresso de janeiro de 2020.

Por último, tanto Ana Rita Bessa como João Gonçalves Pereira já manifestaram o apoio a Adolfo Mesquita Nunes, perfazendo assim um all in bastante sintomático daquilo que é a relação e ligação entre a bancada parlamentar, um dos rostos mais visíveis do partido, e a direção.

créditos: JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

“O próprio Francisco Rodrigues dos Santos e a sua equipa deviam ter pensado nisso quando se candidataram ao congresso [no facto de o grupo parlamentar ser afeto à anterior direção]. Porque vistas as coisas, é evidente que o processo tinha sido muito mais natural e até saudável se tivesse sido a direção de João Almeida a sair [vencedora] do congresso porque não haveria agora qualquer equívoco ou qualquer discussão. Tudo isso são erros táticos e estratégicos de várias destas pessoas”, observa Nuno Garoupa.

Para o também comentador político, a atual direção carece de "uma posição estratégica” que permita ao CDS definir quem é o seu eleitorado, que “não tem porque está a concorrer com os partidos novos e está a concorrer com o PSD". Adicionalmente, segundo Garoupa, não teve capacidade de apurar responsabilidades.

“O CDS não fez o luto dos resultados eleitorais, o CDS não apurou responsabilidades. O próprio Adolfo finge que não tem responsabilidade nos 4% quando o programa eleitoral que teve 4% foi dele porque o escreveu, não foi Assunção Cristas. Isso está por fazer, a responsabilidade quer disso, quer da situação patrimonial do CDS que neste momento é catastrófica. O CDS é um partido que está tecnicamente falido. Esse apuramento de responsabilidades não se fez por várias razões, incluindo incompetência da direção atual”, prossegue.

Finalmente, Nuno Garoupa identifica um último problema, que é o facto de Francisco Rodrigues dos Santos “não ter resultados”. “As Presidenciais não têm nada a ver com ele, zero, e os Açores não têm nada a ver com ele, zero; têm a ver com o líder dos Açores, que é uma pessoa conhecida na sua terra. Tanto que o CDS tem votos na ilha dele, não tem votos nas ilhas grandes. O CDS basicamente é esmagado pelo Chega nas ilhas grandes”, conclui.

O problema de Adolfo Mesquita Nunes

O regresso do antigo secretário de Estado do Turismo à vida partidária ativa foi recebido de diferentes formas entre os militantes. Ribeiro e Castro, que desde o primeiro momento se mostrou contra a possibilidade de um congresso extraordinário e manifestou a opinião de que esta direção possa concluir o mandato, não esquece, em particular, dois momentos: o facto de ter sido o próprio a elaborar o programa com que o CDS obteve um resultado muito pequeno em em 2019 nas legislativas e, depois, a saída direta para a Galp.

“O doutor Mesquita Nunes tem grandes responsabilidades no desastre eleitoral de 2019 do CDS. Não nos esqueçamos que era vice-presidente da professora Assunção Cristas, foi designado para a elaboração do programa eleitoral do partido, que foi apresentado como uma coisa extraordinária, e no princípio do ano vai para a Galp. Isso é uma demonstração pública de falta de confiança no caminho político em que o partido estava. Quando um vice, num ano de duas eleições, muda de vida e dá sinal de sair do partido, isso obviamente é um sinal ao eleitor de 'nem eles acreditam nisso'”, comenta o antigo líder, que afirma que se esse “grupo se tivesse um pouco de decoro colaborava com a direção seguinte para ajudar a recuperar o partido”.

Para Nuno Garoupa, um dos momentos em que Mesquita Nunes e os seus apoiantes estiveram pior foi o último Conselho Nacional, onde, contrariamente à esmagadora maioria do partido, não defendia o apoio à candidatura de Marcelo Rebelo de Sousa.

“Diga-se, em abono da verdade, que não se percebe muito bem a estratégia alternativa que propunha Adolfo Mesquita Nunes. Era candidatar-se em conjunto com a IL? Não estou a ver que cenário alternativo era esse. Acho que o CDS não teve relevância nenhuma nas Presidenciais, mas o CDS só podia apoiar Marcelo Rebelo de Sousa. Era um tiro no pé até porque com os resultados que teve a IL, o CDS, separado, provavelmente ainda tinha menos. A certa altura é criticar o Rodrigues dos Santos por criticar. É evidente que acho que ele não recuperou o CDS para os 10%, mas acho que ninguém consegue fazer esse trabalho. Assacar a ele essa responsabilidade acho que é de uma tremenda injustiça”, comenta.

Depois, há ainda a perspetiva de uma visão mais liberal que se espera de Adolfo Mesquita Nunes, caso este consiga chegar à liderança do partido, que mais uma vez coloca o CDS contra um dos novos partidos, neste caso a IL. “Não há espaço para dois partidos liberais”, vaticina Garoupa.

As autárquicas no final do ano

Com as autárquicas a acontecerem no final do ano, Ribeiro e Castro defende que deve ser a direção presidida por Francisco Rodrigues dos Santos a conduzir o partido nesse ato eleitoral e que o CDS deve assumir uma posição estratégica de aliado do PSD para tornar o mapa autárquico menos cor-de-rosa.

“O CDS tem de defender desde logo as suas câmaras, mas tem de ter um acordo político e estratégico com o PSD que, aliás, é um quadro estratégico que existe há vários anos, em vários círculos autárquicos. Mas tem que ter um objetivo claro, e que no meu entender já devia ter acontecido em 2017, a que eu chamei a 'estratégia do mapa cor-de-rosa': ver quais são as câmaras do Partido Socialista e procurar retirar ao PS e transferir para o espaço do PSD e do CDS aquelas que têm condições de ser ganhas pela qualidade das candidaturas, pela qualidade dos programas, por esgotamento dos atuais titulares. É muito importante que o PSD seja outra vez o partido com mais câmaras em Portugal e que não se repita o que aconteceu em 2013 e 2017, que antecipou a vitória da esquerda nas legislativas seguintes”, afirma.

O antigo líder centrista vê nas coligações com o partido agora comandado por Rui Rio não um 'CDS muleta', mas sim a continuidade de uma história que já deu muitos frutos à direita em Portugal. “Já não falo da Aliança Democrática e da União Democrática, mas desde 1997 faz-se um número alargado de coligações entre o PSD e o CDS. Recordo, por exemplo, que em 2001 foram essas coligações que levaram à queda do governo socialista de António Guterres, em concelhos importantes como Sintra onde eu, que representava o CDS, e Fernando Seara, o PSD, tirámos a câmara e a Assembleia Municipal ao PS. Essa é a estratégia que tem de ser seguida, a de vencer a esquerda. E vencer a esquerda, sejamos realistas, é o PSD ter mais câmaras que o PS, o CDS participar nessas vitórias, ter quota apropriada onde houver coligações e manter as câmaras. No tempo de Assunção Cristas e de Pedro Passos Coelho houve muitas coligações, mas não houve esse objetivo estratégico de retirar ao PS a maioria do número de câmaras municipais. E a consequência é que o PS, que tinha tido em 2013 o melhor resultado de sempre em eleições autárquicas, em 2017 ainda ganhou mais câmaras”.

créditos: MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Perante a importância das próximas eleições autárquicas, Ribeiro e Castro considera que o facto de a ação levada a cabo por Adolfo Mesquita Nunes acontecer “numa altura em que havia uma reunião entre Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos para iniciar esse processo autárquico, é revelador de um propósito de fazer mal ao CDS" para "que se abra a crise exatamente no início das conversações entre os dois partidos para assinarem entendimentos para as eleições autárquicas". Isso, refere o ex-líder dos centristas, "só pode conduzir a um resultado: nova vitória do PS e, em 2023, nova maioria de esquerda”.

Já Nuno Garoupa, numa análise macro do cenário político no final de ano, antecipa que “o CDS não vai existir nas autárquicas” e que isso será sintomático para o que aí vem.

“Acho que o CDS vai ser o primeiro dos três grandes partidos que vai ter uma experiência muito, muito má nesta década. Depois a seguir é o PSD e o PS. Como se vê, as bases eleitorais estão a diminuir; as pessoas é que continuam a fingir que não percebem e falam em percentagens e dizem que Marcelo teve 60%. Mas tudo a esconder a verdade, e a verdade é que cada vez têm menos votos”.

No que toca a remakes, a comunidade de cinéfilos é bastante clara ao afirmar que raramente estes são melhores do que os originais. Se depois de 2007 Paulo Portas conseguiu que o CDS voltasse a integrar uma solução governativa, em 2021, seja qual for o desfecho do Conselho Nacional deste sábado, passe ou não a moção de confiança, decida-se ou não pela marcação de um congresso extraordinário, os centristas não vão ter o mesmo espaço de manobra que tiveram no passado, numa altura que se mostra propícia ao crescimento da direita, uma vez que a esquerda, no poder desde 2015 começa a exibir sinais de desgaste.

Se o remake não chegar às salas de cinema e Francisco Rodrigues dos Santos conseguir agarrar o guião, o final é igualmente imprevisível, uma vez que é um caminho novo. E noutro filme, como um ator de grande craveira, mas já longe dos seus anos dourados, o CDS pode estar à beira de uma mera participação especial nesta nova reconfiguração da direita.