Lavrov viajará para Nova Iorque no âmbito da presidência russa do Conselho de Segurança da ONU – durante o mês de abril – e presidirá a dois debates, sobre o multilateralismo e o Médio Oriente.

O chefe da diplomacia russa não perderá a oportunidade para discutir diretamente com o secretário-geral da ONU, António Guterres, a continuidade do acordo dos cereais do Mar Negro e o descontentamento de Moscovo com a falta de cumprimento de certos aspetos da iniciativa.

“Lavrov espera presidir a duas reuniões, uma sobre multilateralismo e outra sobre o Médio Oriente, ambas abertas a debates. As duas questões são atuais. O verdadeiro multilateralismo e o falso multilateralismo estão a ser amplamente discutidos, referidos e interpretados de forma diferente pelos Estados-membros da ONU”, anteviu o embaixador russo junto à ONU, Vasily Nebenzya.

“Gostaríamos de falar sobre o que consideramos ser o verdadeiro multilateralismo”, adiantou o diplomata, cujo país invadiu a Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022.

De acordo com Nebenzya, uma conversa com Guterres sobre a continuidade do acordo dos cereais também “é devida”, num momento em que a Rússia admite não prolongar o acordo, caso não se verifiquem progressos no cumprimento de compromissos no quadro do memorando entre Moscovo e a ONU.

“Como já dissemos inúmeras vezes, não vemos avanços que nos assegurem que a iniciativa seja implementada em ambas as vertentes. Porque existem duas vertentes: o acordo de exportação de cereais da Ucrânia e o memorando de entendimento que prevê a exportação de cereais e fertilizantes russos, que não está a ser implementado apesar de todos os esforços do secretário-geral” da ONU, alegou Nebenzya a jornalistas.

“É claro que essa conversa e diálogo acontecerão quando o ministro Lavrov se encontrar com o secretário-geral Guterres”, na próxima segunda-feira, assegurou o diplomata.

Ainda sobre a deslocação de Lavrov aos Estados Unidos, Nebenzya não descartou um encontro entre o ministro russo e autoridades norte-americanas, se estas o solicitarem, mas garantiu que nada foi agendado até ao momento.

“Não fugiremos de nenhuma reunião. Se houver disposição por parte dos Estados Unidos, não fugiremos de tal encontro”, disse Nebenzya.

A Rússia, um dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança e com poder de veto, assumiu este mês a presidência rotativa do órgão, que tem capacidade de fazer aprovar resoluções com caráter vinculativo.

Envolvida em fortes críticas, a missão russa anunciou dois eventos durante a sua liderança: um debate aberto sobre a exportação de armas e equipamentos militares; e um debate de nível ministerial, presidido por Lavrov, sob o título “Multilateralismo eficaz através da defesa dos princípios da Carta da ONU”, que contará com um ‘briefing’ de Guterres.

Contudo, têm sido algumas reuniões insólitas que têm chamado a atenção internacional, como a realizada em 05 de abril, quando Nebenzya acusou Portugal, Espanha e Alemanha de terem retirado “centenas” de crianças ucranianas às suas mães para as colocar em estruturas de acolhimento nos respetivos territórios, declarações que foram repudiadas pelo Governo português.

Essa reunião aconteceu menos de um mês após o Tribunal Penal Internacional (TPI) ter emitido um mandado de detenção para o Presidente russo, Vladimir Putin, por crimes de guerra, precisamente pelo seu alegado envolvimento em sequestros de crianças na Ucrânia.

Até ao momento, a presidência russa do Conselho de Segurança tem sido a mais controversa na memória de antigos diplomatas e funcionários da ONU ouvidos pela agência Associated Press (AP).

Em março, o representante permanente da Ucrânia junto das Nações Unidas, Sergiy Kyslytsya, apelou publicamente à organização para que não permitisse a presidência russa, mas sempre sem sucesso.

Uma vez que não conseguiu travar a presidência russa, Kyslytsya espera agora que Guterres use o seu encontro com Lavrov para “reafirmar” a sua posição pessoalmente.

“Se Lavrov não for parado no seu caminho para Nova Iorque num dos países do Estatuto de Roma, António Guterres terá a oportunidade de reafirmar a sua posição pessoalmente a Lavrov. A posição agora é guiada por resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas apoiadas pela esmagadora maioria dos Estados-membros”, disse Kyslytsya em declarações à cadeia de televisão CBS.