De acordo com Ricardo Marchi, investigador do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, “era bastante expectável que, mais cedo ou mais tarde, se replicasse em Portugal um fenómeno que percorre a Europa”.

Segundo Marchi, André Ventura “aproveitou uma janela interessante”, beneficiando da “crise da direita”, conquistando por um lado eleitores descontentes com a linha política do PSD e do CDS-PP, e, por outro lado, eleitores do partido de extrema-direita, o Partido Nacional Renovador (PNR), que nunca conseguiu “conquistar o eleitorado mais populista”.

“É um partido populista de direita radical, não é um partido nem subversivo nem revolucionário. Não quer acabar com a democracia, mas é um partido que reconhece o sistema democrático e aceita o sistema democrático como o melhor sistema para a governação dos países e da Europa e é um partido que quer participar no sistema politico dentro das regras democráticas”, sustenta.

Especialista no estudo da direita portuguesa, Ricardo Marchi é autor de obras como “Ideias e percursos das direitas portuguesas”, “As direitas na democracia portuguesa” ou “Império Nação Revolução - As direitas radicais no fim do Estado Novo”.

Para o investigador do ISCTE, ao usar o tema da lei e da ordem ou argumentos contra a subsidiodependência, André Ventura pode continuar “a captar largas faixas do eleitorado”.

Ao contrário do PNR, que “teria dificuldade, porque é um partido com um discurso e uma cultura politica anti-abrilista”, este investigador considera que André Ventura “não quer ter nada a ver nem com fascismo nem com nacional-socialismo, nem com salazarismos ou franquismos” e antecipa que até poderá ter “toda a facilidade de festejar o 25 de Abril de cravo vermelho ao peito”.

António Costa Pinto, politólogo do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, salientou que, além do Chega, também chegaram ao parlamento outros dois pequenos partidos, um deles de direita liberal, “integrados numa conjuntura eleitoral caracterizada fundamentalmente por uma vitória mais ou menos anunciada da esquerda e do PS” e pela desmobilização dos eleitores dos dois principais partidos de direita.

Segundo Costa Pinto, a entrada no parlamento irá dar ao “modelo tribunício” do Chega maior destaque e visibilidade mediática, e até apoio financeiro para o partido.

“Até que ponto lhe permitirá consolidar o seu eleitorado, eventualmente aumentá-lo, só o futuro o dirá”, afirmou, sublinhando que “os partidos não existem fora das conjunturas em que nascem e crescem”.

O especialista considerou ainda que, com base na representação partidária no parlamento, o Chega, provavelmente, “vai estar isolado”, porque os restantes partidos, "muito naturalmente, deverão realizar à volta deste partido uma espécie de 'cordão sanitário'”.

O Chega, com 1,30% dos votos, elegeu domingo o deputado André Ventura numas legislativas ganhas sem maioria absoluta pelo PS, com 36,6% dos votos e com 106 deputados.