O estudo, ontem divulgado, foi realizado por uma equipa do Centro de Investigação em Biomedicina da Universidade do Algarve e do Instituto Gulbenkian de Ciência liderada por Rui Gonçalo Martinho e Paulo Navarro-Costa.

A proteína em causa, a dMLL3/4, “permite que o óvulo [célula reprodutora feminina] fertilizado seja capaz de assegurar não só a correta divisão dos cromossomas maternos como também a descompactação da informação genética paterna”, refere um comunicado conjunto das duas instituições.

Paulo Navarro-Costa explicou ao SAPO24 que o estudo se centrou naquela que é "uma das primeiras fases do desenvolvimento de um embrião, a capacidade que um óvulo fertilizado tem de juntar a informação genética que vem do pai e da mãe". Durante este processo, explica o investigador que "os cromossomas  transmitidos pelo pai e os transmitidos pela mãe estão em estruturas diferentes e incompatíveis" e que a dMLL3/4 é responsável por torná-los "compatíveis para se juntarem e formarem um novo ser vivo".

Na ausência desta proteína, aponta o cientista, é possível a formação de um óvulo "que parece morfologicamente normal" e "perfeitamente capaz de dar origem a um novo ser vivo", mas que possui "um pequeno defeito que impossibilita a junção dos cromossomas do pai e da mãe, logo nunca se produz um embrião com capacidade de se desenvolver."

O que está aqui em causa, explica Paulo Navarro-Costa, não é o ato de fecundação, pois "a entrada do material genético nesses óvulos não é afetada", e a falta da dMLL3/4 "não impede a entrada do espermatozoide". O que é afetado pela sua lacuna é a capacidade do óvulo "processar a informação que vem do espermatozoide e promover a junção dos cromossomas do pai e da mãe", ou seja, como se ambos falassem idiomas diferentes e a proteína fosse responsável pelo seu entendimento.

Apesar de ser um estudo ainda em fase experimental, testado em moscas-da-fruta, o investigador adianta que "esta proteína também existe em humanos e é possível que alguns casos de infertilidade de causa feminina sejam causados por ausência desta proteína funcional".

Com esta descoberta, Paulo Navarro-Costa considera o próximo passo é "perceber até que ponto este tipo de informação pode ter relevância clínica no que toca a casais inférteis", tanto a nível de diagnóstico como até em casos de "aplicação mais terapêutica". No primeiro caso importa "saber se existem casos de infertilidade de causa feminina que são causados pela ausência desta proteína, e se se pode fazer estudos genéticos para ver se identificamos mutações que afetam este gene nesse caso particular de infertilidade". No segundo, as potencialidades da proteína poderão ser utilizadas "nos meios de cultura de embriões que se utilizam rotineiramente em reprodução medicamente assistida", sendo necessário descobrir se é possível "tornar esses meios mais capazes de promover o início do desenvolvimento embrionário em casais que sofram deste problema".

Os resultados da investigação, que usou a mosca-da-fruta como modelo, foram publicados na revista científica EMBO Reports.