Embora assumam o desejo de o pacote acordado em julho passado, constituído por um orçamento para 2021-2027 de 1,08 mil milhões de euros e um Fundo de Recuperação pós-pandemia que lhe está associado, de 750 mil milhões, avançar a 27, o impasse criado pela oposição de Budapeste e Varsóvia ao mecanismo de condicionalidade no acesso aos fundos ao respeito pelo Estado de direito abriu o debate sobre “soluções alternativas”, designadamente um Fundo «NextGenerationEU» a 25.

Um cenário que deixe dois Estados-membros de fora para não sacrificar o conjunto da UE, a necessitar de fundos “como de pão para a boca” para superar a crise, como apontou recentemente o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, é possível em termos práticos, mas constituiria um desastre político para a União, pelo que é encarado mesmo como o último recurso para ultrapassar o impasse.

O Presidente polaco anunciou hoje que foi alcançado um compromisso “preliminar” com a presidência rotativa alemã do Conselho da UE, que está a conduzir as negociações com Budapeste e Varsóvia.

Berlim, contudo, não confirma e insiste que qualquer acordo tem de ser validado pelos 27, sendo que vários Estados-membros já advertiram que não aceitarão qualquer “enfraquecimento” do mecanismo do Estado de direito.

O clima parece, contudo, um pouco menos desanuviado, e um compromisso poderá então passar por uma declaração do Conselho de não recorrer ao mecanismo como uma arma política dirigida aos dois países, há muito num litígio com Bruxelas por alegado desrespeito do Estado de direito.

Recentemente, em entrevista à Lusa, o especialista em Direito Europeu Miguel Poiares Maduro apontou que o impasse também pode ser superado com a criação de um mecanismo de recurso rápido de propostas de sanções para o Tribunal da União Europeia.

No seu entender, isto permitiria responder ao argumento daqueles países de que a avaliação do Estado de direito nos Estados-membros deve ser uma questão jurídica e não política, ao mesmo tempo que se evitava uma cedência a Hungria e Polónia, preservando o princípio do respeito pelos valores europeus na UE.

Na carta-convite hoje dirigida aos chefes de Estado e de Governo da UE, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel – que insistiu que esta cimeira fosse presencial, precisamente para facilitar compromissos – também se mostra otimista num compromisso que abranja todos.

“Acredito que podemos chegar a um acordo sobre um pacote comum que permita uma rápida implementação tanto do Quadro Financeiro Plurianual como do Fundo de Recuperação”, escreveu.

No entanto, caso não seja possível tal acordo a 27, estão a ser assumidamente ponderadas “soluções alternativas”, e aquela que tem sido mais abordada é a de o Fundo de Recuperação avançar a 25, através da chamada “cooperação reforçada”.

A "cooperação reforçada" é um mecanismo através do qual, face à impossibilidade de um acordo unânime entre todos os países da UE, um grupo de pelo menos nove Estados-membros (mais de um terço) poder seguir em frente em determinada matéria, podendo outros países juntar-se posteriormente.

No entanto, essa é mesmo a solução de último recurso, incluindo do ponto de vista do Governo português.

Na passada segunda-feira, no final de uma reunião de chefes da diplomacia da UE, em Bruxelas, o ministro Augusto Santos Silva afirmou que Portugal está “disponível para soluções alternativas” para superar o bloqueio de Hungria e Polónia, mas enfatizou que ainda espera um acordo, para evitar “solução pior”, disse hoje o Governo.

“Portugal está disponível para soluções alternativas, se esta solução [acordo entre todos os Estados-membros da UE] não for possível, mas é muito importante que esta seja possível”, declarou o ministro dos Negócios Estrangeiros, para quem “qualquer outra solução é pior”, ainda que admitindo haver “várias soluções possíveis”.

“Todos queremos uma solução que garanta uma entrada no terreno, uma passagem à fase de concretização mais rápida, e essa é a solução a que os líderes europeus chegaram em julho e, segundo a qual, o Conselho e o Parlamento Europeu chegaram em novembro passado. E, portanto, entendemos que a melhor solução é aquela a que chegámos, depois de um processo negocial muito difícil e complexo, no Conselho de julho e essa é a solução que deve ser posta em prática”, reforçou.

O governante sublinhou que “a recuperação da economia urgente necessita, como pão para a boca, que o Quadro Financeiro Plurianual e os seus programas estejam no terreno já no início do próximo ano e que os planos nacionais de reformas e investimento, que beneficiarão dos fundos destinados à recuperação, sejam negociados com a Comissão Europeia e aprovados pelo Conselho ao longo do primeiro semestre de 2021”, durante a presidência portuguesa da UE.