O que é a CPI e o que investiga?

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), presidida pelo senador Omar Aziz, investiga alegadas falhas e omissões do executivo brasileiro na gestão da pandemia.

A Comissão foi instalada no Senado brasileiro em abril passado e, desde então, tem apurado indícios de inúmeras irregularidades, que vão desde a defesa de fármacos ineficazes contra a doença por parte do Governo, até possíveis casos de corrupção na negociação de vacinas (nomeadamente o contrato para a compra de 20 milhões de doses da Covaxin firmado pelo Brasil e a Bharat Biotech no valor de 1,6 mil milhões de reais).

Marcada por várias polémicas e revelações, a CPI da pandemia ouviu mais de 50 pessoas, entre ministros e ex-ministros, especialistas em Saúde, empresários,  familiares das vítimas, entre outros, e abordou ainda alegadas falhas na gestão da pandemia, como a demora na aquisição de vacinas (ao ignorar mais de 100 e-mails da Pfizer), a crise de oxigénio em Manaus e até a disseminação de 'fake news'.

O relator, o senador Renan Calheiros, divulga esta quarta-feira as conclusões do documento que já chegou às páginas do The New York Times. De acordo com a publicação norte-americana, que teve acesso a uma versão preliminar, o relatório responsabiliza Bolsonaro pela morte de mais de 300 mil brasileiros.

Recorde-se que o país, um dos mais afetados pela pandemia, totaliza mais de 600 mil óbitos e 21,6 milhões de infeções pelo novo coronavírus. “Muitas dessas mortes eram evitáveis”, disse Renan Calheiros ao NYT.

Que crimes aponta o relatório?

Em declarações a vários órgãos brasileiros, o relator do documento afirmou a semana passada que o presidente do Brasil seria acusado de 11 crimes cometidos na condução da crise sanitária no país, entre os quais homicídio.

"Ela [a CPI] se instalou pela necessidade de se dar uma resposta à sociedade sobre de que forma o presidente da República participou ou não, se é responsável ou não pelo agravamento do número de mortes no Brasil e a conclusão da comissão é de que ele é, sim, responsável e tem que ser indiciado por tudo isso. A perspetiva é que nós utilizemos 11 tipos penais de crimes diferentes em função das condutas do presidente da república", disse Renan Calheiros à BBC Brasil.

No entanto, esta madrugada, os senadores decidiram retirar do relatório os crimes de homicídio por omissão e genocídio de indígenas.

"O genocídio não era consenso, não havia consenso de ninguém, entre juristas não havia consenso. Entre nós senadores, eu mesmo disse que tinha que ser convencido. O mais importante dessa reunião é que saímos unificados", afirmou o presidente da CPI, senador Omar Aziz, citado pelo G1 (Globo).

Os outros crimes atribuídos ao presidente permanecem no documento. De acordo com a publicação, Bolsonaro será acusado de nove crimes:

  • Epidemia com resultado em morte;
  • Infração de medidas sanitárias;
  • Utilização irregular de verbas públicas;
  • Incitação ao crime;
  • Falsificação de documento particular;
  • Charlatanismo;
  • Prevaricação;
  • Crime contra a humanidade;
  • Crime de responsabilidade.

Que outros nomes surgem no documento da CPI?

No total, e de acordo com a Folha de São Paulo, o documento com mais de mil páginas deve propor que cerca de 70 pessoas e duas empresas (a Precisa Medicamentos e a VTC Log) sejam indiciadas.

Além de Bolsonaro, ministros, ex-ministros, deputados e os filhos do presidente (o senador Flávio, o deputado Eduardo e o vereador Carlos) também deverão constar no relatório final.

O El País Brasil escreve que sob a mira da CPI estão ainda o deputado federal e ex-ministro da Cidadania, Osmar Terra (MDB-RS), o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e os médicos Nise Yamaguchi e Paolo Zanotto, suspeitos de integrarem o chamado gabinete paralelo.

Esse grupo, que atuou informalmente junto do Ministério da Saúde nas decisões relacionadas ao combate à pandemia, terá influenciado políticas públicas ‘negacionistas’ e é acusado de contribuir para a disseminação de 'fake news' sobre a doença, de promover tratamentos sem comprovação científica, como a hidroxicloroquina, e de defender a "imunidade de rebanho" em detrimento do distanciamento social e da vacinação em massa.

O que segue à leitura do relatório? 

Iniciada em abril no Senado, após determinação do STF (Supremo Tribunal Federal), a CPI da Covid deverá ser concluída até ao final de outubro. A última atividade da Comissão será a votação do relatório final, o que deverá acontecer no dia 26 de outubro.

A votação estava prevista esta para quarta-feira, mas foi adiada devido a discordâncias dos senadores na tipificação dos crimes e indiciados, sobretudo, escreve a Folha de São Paulo, em relação aos membros da família do presidente Jair Bolsonaro.

Se for aprovado por maioria simples pelos onze membros da comissão, cada uma das conclusões do relatório pode implicar no envio do documento para órgãos distintos.

O documento será enviado enviado ao procurador-geral da república, Augusto Aras, e aos demais órgãos responsáveis por fiscalizar a atuação do executivo e indiciados — Ministério Público, Tribunal de Contas e Câmara dos Deputados, se se concluir que houve crime de responsabilidade passível de impeachment (processo de destituição do presidente). No caso de crimes contra humanidade ou de genocídio, o relatório deverá ser enviado para o Tribunal Penal Internacional, em Haia, para que se promova a eventual responsabilização civil, criminal e política dos acusados.

Se o documento recomendar mudanças legislativas, elas passam a tramitar como projetos de lei no Congresso Nacional.

[Notícia atualizada às 10h19 com novos elementos do relatório final]