APRESENTAÇÃO

Educar os filhos é a aventura mais apaixonante, mas também a tarefa mais difícil da vida dos pais. Educar pede amor e disciplina. Requer tempo, esforço e paciência. Exige a capacidade de conciliar a vida profissional com a vida familiar. Implica presença e atenção. É impossível educar à distância, através do telemóvel. Tudo se torna mais complicado quando o pai e a mãe vivem separados.

Os filhos nascem sem manual de instruções! Para educar, os pais baseiam-se nos princípios que aprenderam na família. Se gostaram da forma como foram educados, seguem o exemplo dos seus próprios pais. Se não gostaram, tentam educar de maneira diferente. Em geral, fazem o melhor que sabem. Não há pais perfeitos.

Na atualidade, muitos especialistas (pediatras, psicólogos, terapeutas e professores) desenvolvem investigações sobre as melhores práticas na educação dos filhos. Mas a arte de educar não se aprende apenas em cursos ou na leitura de livros e revistas. Os pais podem aprender também, refletindo sobre a sua relação com os filhos e partilhando experiências com outros educadores que vivem dúvidas e preocupações semelhantes. Não falo aqui das necessidades educativas especiais, que merecem cuidados diferenciados e o apoio de técnicos competentes.

"É Desta Que Leio Isto"

"É Desta Que Leio Isto" é um grupo de leitura promovido pela MadreMedia e por Elisa Baltazar, co-fundadora do projeto de escrita "O Primeiro Capítulo”.

Lançado em maio de 2020, foi criado com o propósito de incentivar à leitura e à discussão à volta dos livros. Já folheámos as páginas de livros de autores como Luís Sepúlveda, George Orwell, José Saramago, Dulce Maria Cardoso, Harper Lee, Valter Hugo Mãe, Gabriel García Marquez, Vladimir Nabokov, Afonso Reis Cabral, Philip Roth, Chimamanda Ngozi Adichie, Jonathan Franzen, Isabel Lucas, Milan Kundera, Joan Didion, Eça de Queiroz e Patricia Highsmith, sempre com a presença de convidados especiais que nos ajudam à discussão, interpretação, troca de ideias e, sobretudo, proporcionam boas conversas.

Ao longo da história do nosso clube, já tivemos o privilégio de contar nomes como Teolinda Gersão, Afonso Cruz, Tânia Ganho, Filipe Melo e Juan Cavia, Kalaf Epalanga, Maria do Rosário Pedreira, Inês Maria Meneses, José Luís Peixoto, João Tordo e Álvaro Laborinho Lúcio, que falaram sobre as suas ou outras obras.

Para além dos encontros mensais para discussão de obras literárias, o clube conta com um grupo no Facebook, com mais de 2500 membros, que visa fomentar a troca de ideias à volta dos livros, dos seus autores e da escrita e histórias que nos apaixonam.

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Pela minha experiência de professor, pai e formador de pais, creio que a chave da relação educativa está na qualidade da comunicação. Assim, a primeira parte deste livro contém orientações gerais para comunicar com os filhos. A segunda parte aborda alguns temas relacionados com a vida escolar. A terceira parte destaca a importância das regras e dos valores.

No final de cada um dos vários capítulos, apresento, em versão adaptada, pequenas histórias de origem desconhecida, já recontadas por diversos autores. Perderam-se as fontes, mas ficaram as mensagens que nos fazem pensar.

Neste livro, dirigido especialmente aos pais de crianças e adolescentes em idade escolar, o meu objetivo é partilhar ideias. Não há receitas universais para educar os filhos, porque eles não crescem todos ao mesmo ritmo, nem por fora nem por dentro. Cada um é diferente e único, fruto da hereditariedade, do contexto social e das experiências vividas. O que funciona bem com um pode não resultar com outro.

A educação faz-se sempre com incertezas. Deve fazerse também com esperança. Os pais otimistas acreditam que, apesar de todas as dificuldades, são capazes de promover a formação integral dos filhos, tornandoos bons alunos e, mais importante, pessoas autónomas, responsáveis e solidárias. Pessoas felizes!

 António Estanqueiro

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ESCUTAR OS FILHOS

«Assim como devemos levar em conta cada palavrinha,
precisamos de considerar cada momento de silêncio.»

Benjamin Franklin
(1706-1790)

Saber escutar é o grande segredo da comunicação interpessoal. O modo como os pais escutam influencia o modo como os filhos falam.

Quando os pais sabem escutar, os filhos aproximamse e falam mais abertamente das suas ideias e dos seus sentimentos, porque se sentem amados, compreendidos e respeitados. Quando os pais não sabem escutar, os filhos afastam-se, fechamse no seu silêncio ou revelamse mais conflituosos.

Neste tempo dominado pelas tecnologias da comunicação, alguns pais têm de aprender a escutar os filhos de forma ativa. A escuta ativa implica dar tempo, prestar atenção, compreender a mensagem e manifestar empatia.

1.1 Dar tempo

Falar é uma necessidade. Os filhos precisam de tempo para que, ao seu ritmo, falem de si mesmos, dos seus sonhos e medos, das suas alegrias e frustrações. Os pais não podem escutar os filhos como quem despacha recados! A pressa é inimiga da comunicação.

É difícil programar todas as conversas para uma data concreta, com hora marcada. Os jovens comunicam quando querem. Os pais atentos estão próximos e disponíveis para escutar os filhos, sobretudo os adolescentes, porque estes podem decidir fazer uma confidência ou revelar um sentimento de forma inesperada. Se os filhos não encontram disponibilidade, evitam conversas, não partilham a sua vida, não contam os seus problemas, não pedem conselhos. Calamse, por mais incómodo que seja o seu silêncio. 

Os pais não são fontes inesgotáveis de tempo e energia. Muitas vezes, chegam a casa cansados ou psicologicamente indisponíveis. Não devem fingir que escutam, mas dizer com honestidade: «Desculpa, agora não! Prometo escutar-te logo que possa.»

Em geral, os jovens compreendem que os pais trabalham e têm outros assuntos a tratar. Só não aceitam permanentes desculpas para a falta de tempo. Eles precisam de afeto, tal como precisam de satisfazer outras necessidades básicas: a fome, a sede e o sono.

O ritmo acelerado da vida não deixa muito tempo para escutar. Alguns pais atarefados com múltiplas atividades dão aos filhos prendas, talvez para compensar a falta de disponibilidade e aliviar o sentimento de culpa pela sua ausência. Fazem bem em repensar as suas prioridades. Os filhos preferem receber tempo. Em qualidade e quantidade! 

Amar não é dar. É darse!

1.2 Prestar atenção

Saber escutar significa prestar atenção exclusiva a cada filho, evitando distrações com outras atividades: trabalhar, ler, ver televisão ou usar o telemóvel. Assim, por exemplo, quando um filho quer falar, os pais não devem consultar o telemóvel, trocar mensagens ou atender chamadas não urgentes.  

Um bom ouvinte está presente de corpo e alma. Para mostrar interesse genuíno na conversa, os pais atentos adotam uma postura descontraída e acolhedora, olham de frente para os filhos, acenam com a cabeça, sorriem e fazem perguntas interessadas e oportunas, sem sinais de impaciência.

A arte de escutar exige o esforço consciente de não interromper quem está a falar. Mas alguns pais, mesmo bemintencionados, tendem a interromper os filhos, para dizer o que pensam sobre os assuntos da conversa, sobretudo quando há ideias de que discordam, gostos que não apreciam ou comportamentos que reprovam.

É sensato escutar cada filho com atenção e paciência, até ao fim, e fazer uma breve pausa antes de começar a falar. Quem sabe escutar dá bom exemplo e tem mais hipóteses de ser escutado.

1.3 Compreender a mensagem

Escutar é ouvir e ver. Para compreender bem as mensagens dos filhos (o que eles pensam e sentem), os pais devem ouvir as suas palavras e observar a sua linguagem corporal: o olhar, o tom de voz, os gestos e as expressões faciais. O silêncio também fala. É impossível não comunicar.  

Na comunicação interpessoal, segundo alguns especialistas, mais de 75% da mensagem passa pela linguagem corporal. O corpo diz mais do que as palavras. Revela emoções e sentimentos. Transmite alegria ou tristeza, calma ou ansiedade, segurança ou medo, entusiasmo ou desânimo. Ajuda a detetar mentiras.

Como interpretar corretamente as mensagens dos filhos? Os pais têm de ser prudentes na interpretação, porque, algumas vezes, estão distraídos e não ouvem tudo o que deviam ouvir; outras vezes, os filhos, por dificuldade de expressão oral, não dizem exatamente o querem dizer.

Livro: "Comunicar com os filhos"

Autor: António Estanqueiro

Editora: Presença

Data de Lançamento: 24 de janeiro de 2024

Preço: € 13,90

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A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Assim, quando julguem necessário, os pais podem resumir o que acabaram de ouvir, de modo a confirmar se compreenderam bem a mensagem:

«Deixa-me ver se entendi. O que tu pensas é...» 

«Queres dizer-me que...»

«Ficaste triste porque...» 

O esforço de compreender revela interesse e respeito por aquilo que os filhos dizem. Se eles estão de acordo com a interpretação feita, a conversa poderá continuar. Se estão em desacordo, os pais podem pedir mais esclarecimentos, para garantir uma boa comunicação.

1.4 Manifestar empatia

A empatia é a capacidade de nos colocarmos no lugar dos outros para compreender a sua perspetiva, as suas motivações e os seus sentimentos. Fazem bem os pais que escutam os filhos com empatia, com a sabedoria do coração.

É errado julgar, desvalorizar ou, pior, menosprezar os sentimentos dos filhos, especialmente quando eles revelam sentimentos negativos: tristeza, medo ou raiva. Nenhum jovem ficará calmo e satisfeito se ouvir dos pais comentários precipitados e pouco simpáticos: «Isso não tem importância nenhuma; estás a fazer uma tempestade num copo de água!»

Quando os filhos abrem o seu coração, esperam uma atitude compreensiva. Neste sentido, os pais podem perguntar a si mesmos: «Se eu estivesse na situação do meu filho ou em circunstâncias semelhantes, como me sentiria?» A resposta sincera a esta pergunta apontará provavelmente para a importância de manifestar empatia:

«Se fosse comigo, eu também ficaria triste.»

«É natural que tenhas medo de falhar.»

«Compreendo que te sintas zangado.»

Escutar e amar são artes inseparáveis. Escutar os filhos com empatia, sem pressa de dar conselhos, é o caminho certo para fortalecer os laços afetivos e aprofundar as relações. Os pais com capacidade de empatia escutam melhor, conquistam a confiança dos filhos e têm mais sucesso na educação.

EM SÍNTESE

1. Dê tempo aos filhos, para que eles falem de si mesmos com calma.

2. Preste atenção à conversa dos filhos, evitando distrações com outras atividades.

3. Interprete bem as mensagens dos filhos, o que eles pensam e sentem.

4. Escute os filhos com empatia, sem pressa de lhes dar conselhos.

História para pensar

TEMPO PARA OS FILHOS

Era uma vez um homem muito ocupado. Saía cedo para o trabalho e chegava tarde a casa. Muitas vezes, o filho pedia:

— Pai, quero falar contigo...

A reação era quase sempre a mesma:

— Desculpa, mas não tenho tempo. Preciso de trabalhar para ganhar dinheiro. Não quero que te falte nada.

Uma noite, o rapaz, já deitado na cama, chamou o pai. Quando o homem se aproximou, o filho perguntoulhe:

— Pai, quanto é que tu ganhas numa hora de trabalho?

O homem, cansado, irritou-se com a pergunta. Mesmo assim, resolveu responder, sem fazer muitas contas:

— Ganho... vinte euros.

Então, o rapaz pediu:

— Podes emprestar-me cinco euros?

Ainda irritado, o homem pensou que o filho queria o dinheiro para comprar qualquer coisa desnecessária e repreendeu-o:

— Não tenho dinheiro para os teus caprichos.

O filho insistiu no pedido. O pai pensou melhor e, apesar de contrariado, acabou por lhe dar cinco euros. Rapidamente, o rapaz levantou-se da cama e foi buscar o seu mealheiro. Despejou as suas economias junto do dinheiro que acabara de receber, sorriu para o pai e disse:

— Pai, já tenho vinte euros. Se eu te pagar, amanhã podes vir para casa mais cedo e falar comigo durante uma hora?