“É ter medo que isto mude, porque realmente na Eslovénia viveu-se sempre muito bem, de uma forma muito livre e culturalmente muito ativa, e é o medo de mudar para uma coisa que não foi a nossa realidade até agora”, afirmou Gabriela Droga Mazovec, aos jornalistas portugueses.

Gabriela, que vive na Eslovénia há 20 anos e que é bioquímica na Universidade de Ljubljana, foi uma das três representantes da comunidade portuguesa que se encontrou, pelas 20:20 (19:20 de Lisboa) com Marcelo Rebelo de Sousa no Grand Union Hotel, onde o Presidente se encontra hospedado na capital eslovena.

À saída, qualificou a reunião como tendo sido “muito interessante”, reveladora de “boa disposição” e de um “interesse em saber o que se passa” no país.

“Houve uma certa curiosidade sobre a afinidade entre os dois países, a nossa experiência enquanto portugueses a viver cá, e um panorama da situação política”, resumiu Eduardo Raon, músico que se encontra na Eslovénia há 10 anos, sobre o encontro que durou cerca de uma hora.

Relativamente à situação política na Eslovénia, os três portugueses referiram que, tendo em conta que o atual Governo, liderado pelo primeiro-ministro Janez Jansa, tomou posse em março de 2020, coincidindo com o início da pandemia de covid-19 na Europa, é difícil atribuir as restrições impostas a uma vontade repressora do Governo.

“Mas, por exemplo, eu vivo no centro da cidade e, às 21:00, havia o recolher obrigatório e eu ouvia todos os dias um carro da polícia a apitar às 21:05, quer dizer, a recolher alguém que infringiu as regras. E isto deu um sentimento de estado policial”, disse Gabriela.

João Costa, matemático que trabalha atualmente no Centro Internacional de Investigação sobre Inteligência Artificial da UNESCO e que se mudou para a Eslovénia há 12 anos, acrescentou que o Governo “quis mostrar a força do Estado”.

“O próprio perfil que se quer mostrar é de mostrar a força do Estado para o controlo. Quis-se que fosse claro, não é uma coisa que algumas pessoas acham e outras não… Há uma noção de o Estado se querer mostrar forte”, sublinhou.

Abordando assim os protestos contra o Governo que têm ocorrido semanalmente desde abril de 2020 — na sexta-feira, celebrou-se a 58.ª manifestação — João Costa disse que “são manifestações pacíficas”, que mostram um caráter do povo esloveno que aprecia particularmente.

“É um sentimento de ‘nós temos que preservar aquilo que temos, não vão outros cuidar de nós, temos de ser nós a garantir aquilo que temos’. E isso é urbano e rural, não há diferença”, explicou o matemático.

Eduardo Raon também notou “um certo despudor na discriminação” da parte deste Governo, um caso que não “é muito original” e que compara com a Hungria, e que o deixa pouco otimista relativamente à presidência eslovena do Conselho da União Europeia, que irá substituir Portugal a partir de 01 de julho.

“As recentes intervenções no Parlamento Europeu [Janez Jansa participou, na quarta-feira, numa conferência de imprensa] não deixam antever as melhores coisas, mas esperemos que o respeito pelas instituições, e pelo papel integrador que cada presidência tem a responsabilidade de ter, prevaleça”, apontou o músico.

Apesar disso, Gabriela considerou que as cerca de 45 pessoas que compõem a comunidade portuguesa na Eslovénia, estão “muito bem integradas na sociedade eslovena”, com casais frequentemente mistos — “um é esloveno, outro português” –, e gostando todos de viver no país.

“O quadro é de um elevado grau de educação em geral. E nós conhecemo-nos quase todos, claro. É um quadro muito heterogéneo, mas a nível de atividade profissional, normalmente ocupam cargos bastante integrados na comunidade eslovena”, apontou.

João Costa, que mantém também uma revista cultural luso-eslovena intitulada ‘Sardinha’, comentou ainda que, apesar dos trabalhos atarefados, a comunidade faz “muitas coisas para puxar a cultura e a língua portuguesa, integrando todos, não só portugueses, mas portugueses e eslovenos, no sentido de uma comunidade lusofalante”.

“Há muitos eslovenos a gostarem muito da língua portuguesa e de Portugal (…) e querem participar, e querem fazer parte dessa comunidade, e não precisam de um passaporte português para isso: uma pessoa pode sentir-se portuguesa mesmo não sendo portuguesa”, rematou.

Os três portugueses falavam à Lusa após um encontro com Marcelo Rebelo de Sousa, que se encontra atualmente numa deslocação oficial de três dias à Eslovénia, tratando-se do primeiro Presidente da República a visitar o país desde Jorge Sampaio, em abril de 1999.

Inicialmente prevista para 2020, a visita foi adiada para este ano devido à pandemia de covid-19, sendo os principais temas da deslocação a relação entre os dois países e a presidência do Conselho da UE, tendo em conta que a Eslovénia irá suceder a Portugal em julho.

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