Com estas cerimónias, o Governo chileno pretende evocar as vítimas do regime de Pinochet, que durou até 1988, e deixar uma mensagem a favor das democracias e do respeito pelos direitos humanos.
Além de António Costa, estão previstas as presenças de vários chefes de Estado e de Governo, sobretudo de países da América Latina, como os do México, López Obrador, da Colômbia, Gustavo Petro, da Argentina, Alberto Fernández, e do Uruguai, Luís Lacalle Pou.
António Costa chega à capital chilena no domingo, onde, enquanto primeiro-ministro, já esteve em visita oficial em junho de 2017, num périplo que iniciou no Brasil com as comemorações do Dia de Portugal e em que passou também pela Argentina.
Acompanhado pelo secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Francisco André, o líder do executivo português estará ao início da noite de domingo presente no jantar oficial oferecido pelo Presidente da República do Chile, Gabriel Boric, com quem terá no dia seguinte, de tarde, uma reunião bilateral, no Palácio de La Moneda, sede do Governo chileno.
De acordo com o programa oficial, na segunda-feira, dia em que se completam os 50 anos do golpe militar de 11 de setembro de 1973, haverá uma receção por parte do chefe de Estado chileno no Palácio La Moneda, pelas 08:25 locais (menos quatro do que em Portugal).
Juntamente com outros convidados estrangeiros, António Costa tomará aí o seu pequeno-almoço, seguindo-se um passeio conjunto pelo palácio, antes do primeiro ato solene comemorativo dos 50 anos do golpe, previsto para as 10:00 locais, que inclui um momento cultural e uma breve intervenção da senadora Isabel Allende.
Hora e meia depois, terá início um segundo ato comemorativo, na Praça da Constituição, com o discurso do Presidente do Chile, que estará acompanhado por grupos de defesa dos direitos humanos.
Ainda na manhã de segunda-feira, será assinada uma “Declaração de Compromisso com a Democracia” – um ato protocolar ao qual se seguirão intervenções musicais.
Nas cerimónias, estarão ainda presentes o Presidente do Conselho Federal da Alemanha e da Câmara de Hamburgo, Peter Tschentscher, assim como ex-presidentes da Colômbia (Ernesto Samper e Juan Manuel Santos), da Costa Rica (Laura Chinchilla), do Uruguai (José Mujica) e, ainda o antigo líder do Governo de Espanha Felipe González.
Costa considera que brutalidade do golpe no Chile há 50 anos marcou a sua geração
António Costa esteve em Santiago do Chile em junho de 2017, ocasião em que recordou a “brutalidade e a crueldade” do golpe militar de Pinochet há 50 anos, que considera ter marcado a sua geração.
No âmbito de uma visita oficial que realizou ao Chile, depois de uma passagem pela Argentina, António Costa e o então ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, estiveram no Museu da Memória e dos Direitos Humanos de Santiago.
Além da deslocação ao museu, a então chefe de Estado chilena, Michelle Bachellet, também levou o primeiro-ministro português à sala do Palácio de La Moneda - a sede do Governo - em que o socialista e presidente democraticamente eleito do Chile, Salvador Allende, pôs termo à sua vida no dia 11 de setembro de 1973, antes de ser apanhado pelas tropas do general Augusto Pinochet.
"O golpe de Estado de Augusto Pinochet e a posterior ditadura chilena foram marcantes para a minha geração", declarou António Costa aos jornalistas.
O primeiro-ministro revelou que a primeira manifestação em que participou foi mesmo uma de protesto contra o golpe chileno, logo em 13 de setembro de 1973, mas em Itália, porque Portugal continuava então sob o regime do Estado Novo de Marcello Caetano e Américo Tomás.
"Por mera casualidade, nessa altura, em setembro de 1973, estava de férias com a minha mãe em Milão. Este episódio acabou por ser decisivo para a participação política, para as convicções democráticas e para o amor à liberdade de toda uma geração", sustentou.
António Costa disse ainda que essa visita que realizou em Santiago do Chile, entre os dias 14 e 15 de junho de 2017, o fez regressar “vários anos atrás”.
“É importante manter viva a memória, porque [ditadura] nunca mais. Estes anos de brutalidade e crueldade não podem ser esquecidos", frisou então o primeiro-ministro, depois de ter visto vários vídeos com depoimentos de homens e mulheres que resistiram à tortura nas prisões.
Durante a visita que fez ao Museu da Memória, António Costa observou atentamente capas de jornais do período pós-golpe e que refletiam a imposição da censura na imprensa.
O "El Mercurio", o jornal que nessa altura o mais influente do Chile, titulava logo a 12 de setembro de 1973: "Partidos marxistas estão à margem da lei".
Por diferentes secções do museu, o primeiro-ministro consultou documentação variada de uma época caracterizada pelo clima de guerra fria entre os Estados Unidos e a União Soviética - uma conjuntura que a maioria dos historiadores contemporâneos associa diretamente ao golpe ditatorial chileno.
António Costa demorou-se especialmente no setor dedicado à solidariedade internacional de apoio à resistência chilena. E identificou imediatamente alguns dos cartazes que viu expostos naquele museu.
No terceiro e último andar, o museu documenta com vídeos, fotos e cartazes a festa após a derrota de Augusto Pinochet no plebiscito de Outubro de 1988 e o regresso a uma Constituição democrática no ano seguinte, em coincidência com o fim da guerra fria.
Para a desagregação do regime de Pinochet, de acordo com a tese da Comissão da Verdade e Reconciliação chilena, muito contribuiu a vista do Papa João Paulo II ao Chile, em 1987. O Papa recebeu publicamente, contra a vontade do poder vigente, uma delegação de sindicalistas da Central Unitária de Trabalhadores.
Até 05 de outubro de 1988, quando o general ditador perdeu o plebiscito para prosseguir no poder, a Comissão de Verdade e Reconciliação do Chile registou 40 mil cidadãos torturados e cerca de três mil mortos, 60 por cento dos quais nos primeiros meses após o golpe.
Expandir energias renováveis no segundo maior produtor de lítio
Nesta sua segunda visita ao Chile, António Costa terá ao fim da manhã de domingo um encontro com empresários portugueses investidores no mercado chileno, principalmente ligados às áreas da energia, construção, agroalimentar, seguros e consultoria.
Segundo fonte do executivo, estarão presentes no encontro representantes de empresas como a Atlas MGA (seguradora), Berd (construção de pontes modelares), Catari (construção), EDP Renováveis, Efacec, Fidelidade (seguros), Procesl/Quadrante (engenharia e consultoria), Readiness IT (consultoria informática), REN, Sogrape (vinhos, Sovena (azeite), Sugal (agroindústria de concentrado de tomate) e transitex (logística).
De acordo com dados fornecidos pelo Governo português, o Chile é o segundo destino do investimento direto português na América Latina e Caraíbas, depois do Brasil.
Desde a deslocação ao Chile em 2017, segundo a mesma fonte, o stock de investimento mais que duplicou, passando de 184 milhões de euros para 421 milhões de euros em dezembro de 2022, destacando-se empresas de capitais nacionais nos setores das renováveis, agroalimentar e digital. Atualmente há cerca de 40 empresas portuguesas com presença direta no mercado chileno.
Em termos de setores económicos, o executivo português coloca entre as suas principais prioridades as energias renováveis, já que o Chile é atualmente o segundo maior produtor de lítio, com cerca de 39.000 toneladas métricas em 2022. As suas reservas são consideradas as maiores do mundo, com 9,3 milhões de toneladas métricas.
“Pela sua dimensão, geografia e disponibilidade de recursos naturais, o Chile apresenta um elevado potencial para as energias renováveis, com destaque para a fotovoltaica, eólica, biomassa e geotérmica. O Chile definiu o objetivo de produzir 20% da sua energia de fontes não hídricas até 2025 e atingir os 70% até 2050”, observa fonte do executivo de Lisboa.
Em particular no eólico e solar, as empresas de capital português EDP Renováveis, CJR Renewables, Efacec e NS Construcciones têm neste momento uma carteira de projetos em execução superior a 200 milhões de euros, empregando mais de 200 trabalhadores e técnicos qualificados.
Para o Governo português, “o elevado potencial eólico e solar do Chile faz com que este país se posicione como um ator global relevante na exportação de hidrogénio verde”.
A componente económica, de resto, ocupou parte substancial do programa de António Costa na sua primeira visita oficial ao Chile em 2017.
Num seminário económico em Santiago do Chile, o primeiro-ministro deixou uma mensagem aos investidores chilenos, dizendo-lhes que produzir em Portugal "é estar a produzir no mercado da União Europeia".
Durante essa visita, salientou também o reforço da cooperação com o Chile nas áreas da prevenção e combate a incêndios florestais e referiu-se à "eterna dívida de gratidão" resultante da morte em Portugal de sete bombeiros chilenos.
"O Chile já perdeu sete dos seus filhos ajudando Portugal a combater incêndios. Dois bombeiros morreram em 2003 e cinco outros em 2006. Esta é uma dívida que teremos para sempre, como gesto de grande solidariedade do povo chileno em relação a nós", declarou.
Este ano, Portugal esteve envolvido na resposta ao pedido de ajuda do Chile para combater os incêndios florestais que assolaram o país - mais de 250 fogos que consumiram 430 mil hectares e causaram 26 mortos.
De acordo com fonte diplomática nacional, a solidariedade manifestada por Portugal “foi reconhecida pelo Presidente do Chile, Gabriel Boric, na última Cimeira Ibero-Americana”.
O apoio de Portugal consistiu no envio de 144 elementos oriundos da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, da Força Especial de Proteção Civil, da Guarda Nacional Republicana, do Instituto de Conservação da Natureza e dos Corpos de Bombeiros, em coordenação com o Mecanismo Europeu de Proteção Civil.
Comentários