Esta semana haverá uma decisão sobre o prolongamento ou não do estado de emergência, em vigor desde 19 de março e até ao dia 2 de abril, para conter a propagação do coronavírus responsável pela pandemia covid-19, a qual resultará da audição de especialistas, sobre a evolução do processo.

Ouvido pela agência Lusa, o médico pneumologista e representante da Ordem dos Médicos para as questões ligadas ao coronavírus, Filipe Froes, considera que faz “todo o sentido manter este estado mais algum tempo”, porque esta ainda é uma “fase muito inicial da atividade viral” e só com a manutenção das medidas é que se poderá “colher os benefícios do investimento inicial”.

“Estamos numa fase de atividade viral do novo coronavírus ainda inicial, previsivelmente vamos ter um aumento exponencial de novos casos nas próximas semanas e para termos beneficio do estado de emergência que declarámos, para beneficiarmos, teremos que prolongar, só assim provavelmente teremos capacidade de ter impacto na diminuição da atividade, na diminuição do impacto e nas consequências na saúde individual e na saúde publica”, disse.

O pneumologista fez uma comparação com a maratona, para tentar explicar a importância de não desperdiçar o esforço inicial que foi feito, com atitudes “que ainda não se justificam” em termos de atividade viral.

“Isto é uma maratona, se parássemos agora era como se tivéssemos dado um ‘sprint’ para correr uma maratona. É uma maratona em que, infelizmente, não sabemos a que quilómetro vamos e quantas voltas faltam. Temos que saber gerir bem o esforço e não podemos desperdiçar o esforço prévio”, afirmou.

O virologista João Vasconcelos Costa é da mesma opinião, embora sublinhe referir-se às medidas em si e não ao estado de emergência, enquanto figura jurídica e questão política, papel que não lhe compete.

Quanto às medidas que estão a ser adotadas, “uma situação é real e absoluta: são para cumprir e é absolutamente impensável ao fim de 15 dias aliviar seja o que for”.

“Estamos muito longe de ter uma ideia do impacto dessas medidas e, seja como for, qualquer alivio tem que ser muito prudente e, obviamente, numa fase em que estamos ainda muito distantes de a ter, uma fase em que já haja uma descida acentuada do número de casos e da transmissão, para a qual estas medidas obviamente irão contribuir”, defendeu o especialista, em declarações à Lusa.

Embora não faça previsões temporais, João Vasconcelos Costa não tem dúvidas de que as medidas “só poderão ser aliviadas daqui a um tempo muito considerável” e não ao fim de 15 dias, “isso é indiscutível”.

O alivio das medidas agora é “imprudente” e comporta o “risco de haver uma explosão por descontrolo das medidas”.

Referindo o exemplo da China, o virologista salienta que ao fim de largas semanas de eficácia no combate à transmissão, os chineses “estão com muita prudência e muito receio do alivio das medidas”, e tudo está a ser feito de forma “muito controlada e muito suave”.

“Não devemos entrar em alarmismos, mas neste caso não é uma questão de alarmismo, é uma questão de conveniência de informação da opinião pública, da preparação e da disciplina que é necessária para uma situação que vai durar seguramente muitas mais semanas ainda”, alertou.

Henrique Barros, presidente do Conselho Nacional de Saúde e Epidemiologia, escusou-se igualmente a comentar o estado de emergência, por se tratar de uma “decisão politica, não cientifica”, mas aponta como "facto inequívoco” que “a infeção está a ir mais devagar e a aproximar-se daquilo a que chamaram planalto".

Em termos médicos e científicos, é certo que “a infeção está a lentificar a velocidade de contágio, e isso pode significar três coisas: dificuldade em ter toda a informação, podem estar a acontecer coisas que não estamos ainda a medir; as medidas que estão a ser tomadas estão a ter influencia, a conter a progressão da infeção; ou isto ser a própria dinâmica do vírus na população, que nós ainda não conhecemos, porque as populações não são todas iguais, e a reposta dos hospedeiros ou dos agentes não é igual em todo o lado”, explicou à Lusa.

Por isso mesmo, reconhece que a palavra de ordem é “precaução”, porque “se as pessoas começarem outra vez a contactar muito umas com as outras e, particularmente, se não se souberem defender com as medidas de prevenção, pode haver um reacender, um aumento da velocidade de contágio e, portanto, mais casos”.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 727 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram perto de 35 mil.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

O continente europeu, com mais de 396 mil infetados e perto de 25 mil mortos, é aquele onde se regista atualmente o maior número de casos.

Em Portugal, registaram-se até hoje 140 mortes, mais 21 do que na véspera, e 6.408 casos de infeções confirmadas, o que representa um aumento de 446 em relação a domingo.

O país encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de 19 de março e até às 23:59 de 02 de abril.