Entre 16 de março de 2020, quando foi notificada a primeira morte por covid-19, e 31 de dezembro, “registaram-se mais 11.736 óbitos devido a causas naturais do que aqueles que seriam de esperar, com base na mortalidade média dos últimos cinco anos”, revelam os investigadores do barómetro covid-19 da ENSP da Universidade Nova de Lisboa.
Segundo o mesmo estudo, dessas 11.736 mortes, 59% (6.906) deveram-se à covid-19, enquanto que 41% (4.830) resultaram de causas naturais, a que os investigadores chamam de “mortalidade colateral”.
A mortalidade colateral foi calculada através da diferença entre o número de mortes registadas por dia em 2020 e a média de óbitos para esse mesmo dia nos últimos cinco anos, excluindo os óbitos por covid-19 para esse mesmo dia.
Em 2020 registaram-se cerca de 123 mil mortes no país, mais 10 mil do que em 2018, ano em que se registaram mais óbitos nos últimos cinco anos, um aumento que o estudo atribui ao “impacto direto e indireto da pandemia”.
“A existência de mortalidade colateral identificada neste estudo pode ter várias explicações”, admite o barómetro, que aponta como possíveis causas o menor acesso ou procura de consultas de acompanhamento de doenças crónicas, o menor volume de exames complementares de diagnóstico e a tardia procura de cuidados de saúde urgentes, especialmente durante a primeira vaga da pandemia.
O estudo indica ainda que a mortalidade colateral foi maior em julho e setembro, mas diminuiu ao longo de 2020, “possivelmente devido aos esforços do Serviço Nacional de Saúde para recuperar o nível do atendimento aos utentes não covid-19”.
Em dezembro, mês em que não se registou um excesso de mortalidade em relação a anos anteriores, verificou-se um “registo extremamente baixo de óbitos atribuídos à gripe”, refere o estudo, que considera ser possível que muitos “destes óbitos esperados por gripe tenham sido este ano atribuídos à covid-19”.
A ENSP salienta que, entre 02 de março e 31 de dezembro, a covid-19 apresentou uma letalidade de 1,7% em Portugal, mais baixa do que a verificada na Europa (2,3%) e no mundo (2,2%).
“Esta letalidade aparece como próxima à da gripe espanhola, no ano de 1918, em que se estimou uma letalidade mundial acima dos 2,5%”, considera o ENSP, ao salientar que a covid-19 “exerce uma forte pressão sobre os recursos humanos e técnicos dos sistemas de saúde”.
“Como é impossível aumentar a oferta destes recursos de forma proporcional ao crescimento da procura, doentes com outras patologias acabam por ver adiadas, por vezes `sine die´, as suas consultas, exames, internamentos e cirurgias programadas. É razoável deduzir que o atraso ou falta desses cuidados possa ter tido impacto na saúde e sobrevivência desses doentes”, sublinham os investigadores.
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