Em causa estão declarações de André Ventura ao jornal 'i', publicadas na segunda-feira, em que o deputado do Chega defende que, no âmbito da pandemia de covid-19, "é preciso um plano de confinamento específico para a comunidade cigana”.

Em resposta, as associações representantes das comunidades ciganas tomaram posição "através de um comunicado de repúdio, que conta com outras associações antirracistas e de defesa dos Direitos Humanos e de pessoas individuais", muitas delas figuras públicas.

Entre os nomes que subscreveram o comunicado de repúdio estão Ricardo Quaresma, Leonor Teles, Luís Filipe Menezes, Ana Gomes, Carlos Narciso, Pedro Bacelar de Vasconcelos, Francisco Louçã e Marisa Matias e o elenco do Teatro da D. Maria II.

O comunicado lembra que o jornal 'i' faz manchete com uma afirmação do deputado André Ventura de que “é preciso um plano de confinamento específico para a comunidade cigana”, sendo que no corpo da notícia o deputado do Chega diz que quer reunir com a direita, PSD, CDS e Iniciativa Liberal, para entregar uma proposta comum já esta semana para o plano de confinamento específico.

"Utiliza como argumentos para propor esta iniciativa acontecimentos como a existência de pessoas ciganas contaminadas pelo coronavirus no Alentejo e uma manifestação que se realizou no fim de semana em Leirosa, Figueira da Foz, contra desacatos e vandalismo provocados, alegadamente, por um grupo de pessoas ciganas", refere o comunicado.

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Perante as declarações do deputado, as organizações não governamentais (ONG) e as pessoas que subscreveram o comunicado dizem "repudiar as declarações de André Ventura e a sua estratégia demagógica e populista de incitamento ao rancor contra as pessoas das comunidades ciganas".

O documento refere que "todas as pessoas, ciganas e não ciganas, estão sujeitas à contaminação pela covid-19" e que "todas as pessoas, incluindo as pessoas ciganas e não ciganas, estão sujeitas às regras de confinamento, quer as que foram impostas pelo estado de emergência quer as que estão em vigor com o estado de calamidade".

Os subscritores do documento referem que na região do Alentejo é conhecida "a situação de cidadãos de etnia cigana que estiveram ou estão contaminados com o coronavírus, tendo estas pessoas colaborado com as autoridades de saúde pública, quer nas regras de confinamento, quer na autorização para a realização de testes".

Quanto à situação de Leirosa, o documento diz que "os acontecimentos que levaram à manifestação da população, ajuntamento que não cumpria as regras de distanciamento social em vigor, deveram-se, segundo a comunicação social, a atos de vandalismo que podem constituir crime, devendo as autoridades policiais e judiciais atuar em conformidade, independentemente da origem étnico-racial dos praticantes".

No entender dos subscritores, as propostas do deputado André Ventura "violam grosseiramente a Constituição, ao discriminar uma comunidade pelas suas características étnico-raciais e ao propor retirar-lhes direitos, liberdades e garantias de forma desproporcional face aos restantes cidadãos, como um confinamento específico motivado apenas pela sua origem étnica"

"É dever de todos os partidos com assento parlamentar defenderem o Estado de Direito e assim, defender intransigentemente que todos, independentemente da sua origem étnico-racial, observem os seus direitos e deveres de cidadania e que a legislação portuguesa cumpra os requisitos constitucionais que obviamente não podem permitir discriminação de determinados grupos de cidadãos com base na sua origem", lê-se no documento.

O documento alerta para o "ataque constante do partido Chega e do seu deputado André Ventura a um grupo específico de portugueses, com base nas suas características étnico-raciais, considerando-os a todos pessoas que não cumprem a lei e que são um `problema´ para a sociedade portuguesa", naquilo que se traduz numa "mensagem racista, que merece total rejeição".

Entre os subscritores do documento de protesto estão a Associação Social Recreativa Cultural Cigana de Coimbra, Associação Unidos de Cabo Verde, Associação de Apoio à Vítima (APAV), ILGA Portugal, Moinho da Juventude, Núcleo Anti Fascista de Coimbra, SOS Racismo.

Assinaram ainda o documentom entre outros, André Gil Mata (realizador de cinema), Anna da Palma (cineasta),António Capelo (ator), Beatriz Dias (professora e deputada), Carlos Miguel (advogado e Secretário de Estado de origem cigana), Carlos Narciso (jornalista), Catherine Morisseau (ativista ambiental), Elza Pais (deputada e ex-Secretária de Estado para a Igualdade), Helena Roseta (arquiteta), Isabel do Carmo (médica), Isabel Moreira (deputada), Joana Mortágua (deputada), José Manuel Pureza (vice-presidente da Assembleia da República), Pedro Calado (alto-comissário para as Migrações entre 2014-2019) e Ricardo Quaresma (futebolista).