Ouvidos pela Lusa, os presidentes do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos concordam que o respeito do Governo pela autonomia das instituições é importante, mesmo durante uma situação de emergência como aquela imposta pela pandemia da covid-19.

Na semana passada, o Ministério do Ensino Superior reforçou que são as instituições que decidem sobre práticas pedagógicas e de ensino, depois de os professores terem acusado o Governo de falta de medidas, e a posição da tutela foi bem recebida pelos presidentes dos dois conselhos.

“O Ministério pretende avaliar, acompanhar e monitorizar como as diferentes instituições vão trabalhar durante este momento, e eu percebo a posição do Governo, porque respeita a autonomia universitária, que eu sempre defendi”, afirmou o presidente do CRUP.

Segundo António Fontaínhas Fernandes, são as próprias universidades, e os docentes em particular, quem melhor conhece a realidade de cada instituição e, por isso, considera, é aí que deve residir uma parte do poder de decisão.

A opinião é partilhada por Pedro Dominguinhos, presidente do CCISP, que defende que desde a suspensão repentina das atividades letivas em todos os estabelecimentos de ensino, em 16 de março, as instituições de ensino superior têm demonstrado uma grande autonomia e maturidade na forma como se adaptaram às novas circunstâncias do ensino à distância.

A cerca de três meses do final do segundo semestre, uma parte importante das preocupações das universidades e politécnicos está agora direcionada para as avaliações e tanto o CCISP como o CRUP já criaram grupos de trabalho para estudar e analisar as possibilidades de avaliação à distância.

Fontaínhas Fernandes reconhece que a decisão final deverá ficar ao critério dos docentes, para que possam adaptar a metodologia de avaliação àquilo que melhor se adequa a cada disciplina, mas sublinha que o mais importante é “garantir bom senso nas decisões para que o aluno nunca seja prejudicado”, em particular nas cadeiras práticas, em que a avaliação à distância é mais complicada.

O CCISP também está atento a esta dificuldade e Pedro Dominguinhos sublinha que a continuidade e avaliação de disciplinas práticas e laboratoriais estão a ser discutidas pelo grupo de trabalho do conselho dos politécnicos, que tem trabalhado para encontrar as soluções que permitam minimizar tanto quanto possível o prejuízo para os alunos.

No entanto, o Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup) considera irrealista achar que a situação atual não vai resultar em prejuízos para os alunos, em particular nos cursos técnicos, sublinhando que existem situações em que “simplesmente não é possível forçar o ensino à distância”.

“É preciso ter a noção de que vão existir prejuízos do ponto de vista desta situação e, portanto, devemos estar preparados para assumir esses prejuízos” disse à Lusa o presidente do sindicato, Gonçalo Leite Velho, que sugere que, nestes casos, as cadeiras práticas possam ser retomadas assim que possível, o que implicaria um atraso do início do próximo ano letivo.

As atividades letivas presenciais foram suspensas em todos os estabelecimentos de ensino no dia 16 de maio, para prevenir a propagação do novo coronavírus, mas as principais universidades e politécnicos já tinham iniciado a transição para o ensino à distância nessa altura.

A medida extraordinária do Governo para o ensino vai ser reavaliada em 09 de abrir, mas algumas instituições do ensino superior, como a Universidade de Coimbra e a Faculdade de Letras, já informaram os alunos que o ensino à distância se vai prolongar até ao final do segundo semestre.

Instituições mostram aberta à mudança dos modelos de acesso

Fontaínhas Fernandes, admitiu a disponibilidade das instituições de ensino superior para se adaptarem às circunstâncias atuais, provocadas pela pandemia da Covid-19, e para fazer parte da solução que o executivo venha a adotar.

No mesmo sentido, Pedro Dominguinhos reconheceu que o período atual é de emergência e, por isso, talvez seja necessário ajustar o modelo de acesso ao ensino superior, nomeadamente a respeito da calendarização, tanto dos exames nacionais do ensino secundário, como do início do período letivo no superior.

Ouvidos pela Lusa, ambos elogiaram a ponderação do Governo e do primeiro-ministro na discussão deste tema, admitindo que se trata de uma situação complexa, cuja resolução implica decisões que devem ser tomadas com tempo.

Em entrevista à Rádio Renascença, e questionado sobre ajustamentos no acesso ao Ensino Superior, Antónia Costa referiu na sexta-feira que o decreto presidencial que renova o estado de emergência até dia 17 de abril cria sobretudo um quadro geral para um conjunto de oportunidades.

"O critério que temos usado é o da máxima contenção com o mínimo de perturbação, e o que desejo é que não tenham que se alterar regras especificamente para este ano, sendo possível apenas ajustar calendários recuperando na medida possível este tempo - um tempo que não foi perdido, mas em que as escolas fizeram enorme esforço e os alunos também", respondeu.

Ainda assim, o presidente do CCISP sublinha que qualquer decisão sobre o acesso ao ensino superior deverá ser extraordinária e aplicável apenas ao próximo ano letivo.

Esta foi uma das preocupações levantadas por Gonçalo Leite Velho, que considera que a situação atual não justifica alterações de fundo no modelo de acesso às universidades e politécnicos.

“A solução mais adequada é conseguir adaptar o modelo atual à situação atual”, disse à Lusa, acrescentando que o importante seria acompanhar o trabalho das escolas nos próximos dois meses, até ao final do ano letivo, e encontrar uma alternativa que não prejudique os alunos, mas mantenha o regime de acesso com exames nacionais.

Os estabelecimentos de ensino estão encerrados desde 16 de março devido à pandemia da covid-19, e milhares de alunos terminaram o 2.º período letivo com aulas à distância.

O futuro do 3.º período vai ser decidido no dia 09 de abril, mas António Costa já admitiu que o ensino à distância se possa prolongar depois da Páscoa, apontando 04 de maio como a data limite para um recomeço das aulas presenciais.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de um milhão de pessoas em todo o mundo, das quais morreram perto de 557 mil.

Em Portugal, segundo o balanço feito na sexta-feira pela Direção-Geral da Saúde, registaram-se 246 mortes, mais 37 do que na véspera (+17,7%), e 9.886 casos de infeções confirmadas, o que representa um aumento de 852 em relação a quinta-feira (+9,4%).

Dos infetados, 1.058 estão internados, 245 dos quais em unidades de cuidados intensivos, e há 68 doentes que já recuperaram.

Portugal, onde os primeiros casos confirmados foram registados no dia 02 de março, encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de 19 de março e até ao final do dia 17 de abril, depois do prolongamento aprovado na quinta-feira na Assembleia da República.