Numa informação publicada na sua página da Internet, a Direção-Geral da Saúde (DGS) informa que “a vacinação de reforço em regime de casa aberta está disponível para os cidadãos dos 18 aos 49 anos que tenham completado o esquema vacinal primário contra a covid-19 e que não tenham sido infectados há menos de 90 dias”.

Na mesma nota informativa, amplamente divulgada nos meios de comunicação social, a Direção-Geral de Saúde diz ainda que se trata de uma “atualização da norma sobre a campanha de vacinação sazonal contra o coronavírus SARS-CoV-2" que "passa a prever o acesso da população adulta entre os 18 e 49 anos ao segundo reforço vacinal contra a covid-19, mediante decisão individual”.

Segundo a DGS, a posição da comissão de especialistas é tomada num momento em que “a maioria da população elegível está vacinada”. Desde setembro de 2022 foram administradas mais de três milhões de doses, maioritariamente aos grupos elegíveis prioritários, acima dos 50 anos de idade, o que contribuiu para "mitigar o impacto da doença grave nos grupos de maior risco".

Todavia, a nota informativa levanta dúvidas, sobretudo entre a faixa etária dos 18 aos 49 anos. E enquanto uns dizem que a vão tomar sem qualquer reserva, outros afirmam não é o caso, de todo.

“Não vou tomar, porque não tenho nenhum incentivo legal para o fazer”, responde ao SAPO24 Rui Domingos, estudante, de 23 anos. “Se tivesse algum local onde não pudesse entrar, ou algo parecido, tomaria”, diz. “Tomei as anteriores porque não tínhamos tanto conhecimento e a situação estava descontrolada”, acrescenta o jovem de Coimbra, que apanhou covid-19 por três vezes.

No início, “não havia tanto conhecimento da doença, e eram poucas as pessoas com anticorpos, então alastrava-se mais. Agora, temos novos alastramentos [novas variantes], mas há mais conhecimento. Muita gente já teve a doença, isolam-se mais, as pessoas estão vacinadas, e os sintomas são menos graves porque se vacinaram duas a três vezes. Portanto, como tenho 23 anos e sou saudável, não se justifica”, considera o estudante, que acabou agora o mestrado e passeava pela baixa de Coimbra com a namorada que, pelo contrário, garantiu que vai tomar a dose de reforço.

“Estou a acabar a licenciatura e quero fazer este semestre no Japão e eles exigem as três vacinas”, responde Marta, estudante na Universidade de Lisboa. “Como apanhei a Covid, só tenho duas vacinas, pois a doença conta como uma dose”, diz a estudante que, independentemente da sua viagem ao Japão, diz, tomaria na mesma dose de reforço.

“Tomava, porque aconselham as pessoas que têm contacto com muita gente, tipo as pessoas que trabalham em supermercados e centros de Saúde, etc, a tomar. E eu gosto de sair à noite, de estar com pessoas e tudo mais, e por isso tomaria de qualquer das maneiras, para estar à vontade”, explica a estudante de 23 anos que, ao contrário do namorado, esteve uma semana internada no hospital por causa da covid e levou mais um mês para recuperar.

“Depois disso, fomos viajar a Munique e todos os meus amigos apanharam covid. Estávamos juntos, o tempo todo, e eu não apanhei nada”, revela Marta. “Penso que foi um daqueles casos de super imunidade”.

4 reforço da vacina contra a covid
Marta e Rui, estudantes, passeiam na baixa de Coimbra. créditos: Manuel Ribeiro

A modalidade “casa aberta” está disponível não apenas para os maiores de 18 anos que desejem fazer vacinação de reforço, mas também para utentes com idade igual ou superior a 12 anos que queiram fazer a vacinação primária contra a covid-19.

Para o médico infecciologista António Sarmento, “todas as pessoas que são elegíveis para fazer o reforço devem fazê-lo, dentro das normas recomendadas pela Direção-geral de Saúde”, diz ao SAPO24. “A estratégia da DGS tem sido correta e a vacina tem tido um fator protetor importante no que diz respeito à doença”, frisa.

"Todas as autoridades de saúde internacionais são unânimes: mesmo com as novas variantes, a grande probabilidade é que [os infetados] venham a ter doença menos grave, com menos necessidade de internamento hospitalar e daí que seja recomendável fazê-lo”, reforça o médico do Hospital de S. João.

Quando anunciou a casa aberta para maiores de 18 anos, a DGS reiterou a “importância da vacinação sazonal como a medida mais eficaz de prevenção da doença ao longo dos meses de inverno”. No mesmo texto, a DGS sublinha que em Portugal existe uma forte adesão parte dos portugueses à vacinação. No entanto, o cariz facultativo gerou dúvidas quanto à relevância da vacinação nesta faixa etária no atual contexto.

António Sarmento explica que “em termos de saúde pública global, neste momento, não é uma prioridade a vacinação dos grupos jovens e saudáveis, por isso é que a DGS diz que é uma opção individual”. Se assim não fosse, "a DGS diria que [estas pessoas] devem tomar [a vacina], que deve ser feito”, sublinha o médico especialista.

Neste contexto, a avaliação cabe a cada um. “A pessoa pode não querer ter doença grave", exemplifica o médico, e isso ser razão suficiente para aderir ao reforço.

O médico do serviço de Infecciologia do Hospital de S. João acrescenta que com o “evoluir da pandemia, cada vez mais pessoas já tiveram contato com o vírus, com a vacina e com os dois, então a proteção é cada vez maior. Além disso, as pessoas jovens têm claramente uma doença menos grave do que as idosas”. E mesmo as mais idosas, ressalva, "se tiverem as vacinas e reforços e não tiverem outras complicações de saúde, têm doença menos grave”.

No que diz respeito a alguma desconfiança que possa existir em relação à vacina, como por exemplo em torno dos efeitos secundários ultimamente associados à mesma, como os casos de miocardites reportados, António Sarmento é perentório.

“Miocardites? Houve sempre e foram sempre descritas [como possível efeito secundário] para a vacina. Mas também estão descritas miocardites em pessoas que não tomaram a vacina”, lembra. Aliás, refere, “as miocardites são muito mais frequentes em quem tem a doença do que em quem faz a vacina. Têm tido mais incidência nos jovens de sexo masculino. Mas aquelas que aparecem, têm decorrido, felizmente, sem gravidade, na maioria dos casos”, salienta o médico.

De acordo com um relatório publicado em finais de 2021, pelo Infarmed, confirma-se o risco de miocardite e pericardite, em ambas as vacinas, Comirnaty (Pfizer) e Spikevax (Moderna), de um modo geral. Todavia, “a ocorrência destas reações é muito rara, afetando uma em cada 10.000 pessoas vacinadas e surgindo poucos dias após a vacinação, sobretudo nos primeiros 14 dias”, pode ler-se no documento

“Os estudos até agora mostram que a incidência de miocardite é muito maior na doença do que com a vacina. São dados publicados, que não são meus, mas acredito que na existência de problemas de maior gravidade [com as vacinas] todos teríamos conhecimento”, diz António Sarmento. 

“Quer os EUA e a Europa têm mecanismos de vigilância contínua de tudo o que for efeito colateral que possa ser atribuído à vacina. Se alguma coisa mais preocupante acontecesse, com certeza seria detectada rapidamente pelos seus sistemas de vigilância”, acrescenta.

Por fim, "não há vacina nenhuma que não tenha efeitos laterais, nenhuma, para nada (qualquer doença)", reitera o médico infecciologia. Todavia, lembra, os “efeitos colaterais graves e significativos que façam questionar a relação de benefício da vacina, felizmente, para já, nada se concretizou”.

Então quem deve tomar este reforço? O médico responde: “depende do grupo etário, se é uma pessoa que tenha um fator de imunodepressão, se foi transplantado, se tem fragilidades, se tem comorbilidades", enumera. "Agora, se é um jovem saudável, sem essas complicações, eu subscrevo o que diz a Direção-Geral de Saúde”, ou seja, cabe a cada um decidir. Aliás, esta “tem sido a recomendação de praticamente todos os países da Europa" em que a vacina está disponível. “Imagine que era realmente muito importante que as pessoas fizessem esta vacina, fazia-se essa recomendação taxativamente”, acredita o médico.

A seu ver, “se a pessoa não quiser fazer [tomar a vacina], não comete irresponsabilidade nenhuma. Mas se a quiser fazer, ela está acessível. A meu ver, não corre risco. Isto é, os riscos são mínimos”.

Fica todavia a ressalva: “a população portuguesa em geral está bastante imunizada, felizmente, mas atenção, não quer dizer que não apanhe a doença. O que quer dizer é que está muito protegida na forma grave da doença”, conclui o especialista do serviço de infecciologia do Hospital de S. João, no Porto.