Um estudo da Deco conclui que o crescimento do negócio descontrolado do surf exige intervenção e fiscalização, para separar quem presta bom serviço, para promover o ordenamento e evitar acidentes com banhistas.
O estudo, que será publicado na próxima revista da Deco Proteste, analisou 40 escolas de surf em todo o continente, um negócio que “cresceu de modo informal” e que já atinge 400 milhões de euros por ano, mas que é alvo de críticas porque as praias estão sobrelotadas e “os acidentes com os banhistas acontecem”.
O artigo inclui uma entrevista com o presidente da Federação Portuguesa de Surf, uma visita informal a 40 escolas em oito zonas do país representativas da modalidade (Cascais, Costa de Caparica, Ericeira, Peniche, Nazaré, Matosinhos, Figueira da Foz e Costa Vicentina), uma atividade que envolve variadas entidades, como a Autoridade Marítima, a Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica (ASAE), Instituto do Desporto e da Juventude, Ministério do Ambiente, Turismo de Portugal e Federação Portuguesa de Surf.
“Umas emitem licenças, outras registos, e há as que fiscalizam. A concentração do licenciamento nas câmaras municipais, mudança anunciada para 2021, pode ser importante, mas é preciso trazer à luz do dia um regulamento que defina e uniformize regras de funcionamento e atuação nas praias”, refere o estudo, acrescentando que a medida é desejada tanto pela federação como por muitas escolas, “para acabar com as soluções locais, à medida da sensibilidade e da experiência de cada capitania da Autoridade Marítima, o órgão responsável por fiscalizar a orla costeira”.
A Deco considera que “a multiplicidade de entidades com responsabilidade na regulação das escolas de surf gera um cenário confuso”, pois “quando a responsabilidade é de todos pode não ser de ninguém e a eficácia da fiscalização acaba comprometida, até porque é conhecida a limitação de meios da Polícia Marítima, mas também da ASAE, num caso para controlar a praia, noutro para evitar a existência de escolas ilegais”.
Para a Deco, “certas regras estão até desfasadas da realidade”, dando como exemplo que a missão da Autoridade Marítima é zelar pela segurança e, no limite, pode mandar retirar surfistas da água se considerar que as condições do mar estão agitadas ou estão a pôr em causa a segurança dos banhistas.
“A entrada do Turismo de Portugal num xadrez já de si complexo veio permitir que as escolas obtenham licença como operadores marítimo-turísticos. Mas esta licença não as habilita a dar aulas, apenas a alugar material. Ainda assim, fazem-no e faz falta legislação que harmonize regras”, defende a Deco, considerando que um ponto de partida pode ser o projeto apresentado pela Federação na Assembleia da República em 2017, mas que ainda não teve desenvolvimentos.
Na entrevista ao presidente da federação, João Jardim Aranha responde que o crescente interesse no negócio do surf deve-se “ao turismo e à facilidade em criar negócios de praia”, pois “ensinar surf tornou-se a última coca-cola no deserto e todos querem”.
“Isto é um negócio de praia, começou com um grupo de professores sem habilitações que iam para a praia ensinar, mas hoje o surf e o golfe são os dois desportos que mais contribuem para o turismo em Portugal. Cada vez há mais escolas, cada vez há mais turismo de surf e chegámos a um ponto em que o que interessa é que a experiência seja boa em Portugal. É como disse a secretária de Estado do Turismo: ‘Não queremos que venham mais, queremos que venham os mesmos ou menos, mas que gastem mais’”, afirmou.
Questionado se a mudança da competência de controlo da atividade para as câmaras municipais é positiva, João Jardim Aranha respondeu: “Faz sentido, mas vai retirar parte da autoridade à Polícia Marítima e às capitanias, que trabalham há algum tempo nesta área e que o fazem razoavelmente bem e há câmaras bem preparadas, mas outra não”.
“Estamos na expectativa, lidamos com todos, mas não podemos deixar o mercado como está”, observou.
O presidente da federação considerou que “a fiscalização está longe de ser eficaz”, em grande parte devido à falta de um contexto legal claro, pois cada capitania estabelece as suas regras, mas a transferência do licenciamento para as câmaras só irá melhorar a situação se houver uma uniformização das regras.
João Jardim Aranha defendeu que em certas praias deveria haver um limite de licenças.
“Talvez possa haver uma solução de ‘time-sharing’, um sistema já usado no Algarve, em que as escolas dividem uma licença. Há um corredor, que é dividido ao longo do dia, porque nenhuma escola dá aulas 12 horas por dia. Pode ser uma forma de regular. O mar é finito, não há ondas para todos. Tem de haver convivência na praia. Os surfistas são uma margenzinha, no verão há sempre mais banhistas e a praia é de todos”.
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