Quando aos 21 anos lhe foi diagnosticado Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), uma doença que causa a morte dos neurónios responsáveis pelos movimentos voluntários, foram-lhe dados apenas mais alguns anos de vida, mas Stpehen Hawking desafiou as probabilidades e fez das unidades dezenas e viveu mais do que 50 anos do que era esperado.

A morte paira como uma certeza sobre todos nós, mas para quem sofre uma doença degenerativa e a desafia diariamente essa certeza terá outra forma, porque a noção de distância do fim interrompe-se, afasta-se do padrão normal. "Vivi com a perspetiva de uma morte precoce nos últimos 49 anos. Não tenho medo da morte, mas não tenho pressa de morrer. Há tanta coisa que quero fazer antes", disse o professor catedrático ao The Guardian em 2011.

A notícia de que vamos morrer antes do tempo, antes do 'prazo' que é a esperança média de vida que nos ensinam na escola, leva a que cada um tenha, naturalmente, uma reação diferente. Uns rezam, outros esperam, outros antecipam sonhos, outros apressam-se para tentar alcançar num curto período de tempo aquilo que planeavam durante toda a sua vida. O físico britânico, que morreu esta quarta-feira, aos 76 anos, era um crente no universo e nas leis da física. E se durante alguns anos vários foram aqueles que colocaram a hipótese de esta crença se estender a um Deus, quando Hawking disse que teríamos de conhecer a “mente de Deus”, no seu livro “Breve História do Tempo”, as suas entrevistas diluíram por completo qualquer sentimento de crença.

Afirmando-se como ateu, dizendo que se “no passado, antes de entendermos a ciência, era lógico acreditar que Deus criou o Universo”, em entrevista ao El Mundo, em 2014, foi peremptório ao declarar que “agora a ciência oferece uma explicação mais convincente”. “O que quis dizer quando disse que conheceríamos ‘a mente de Deus’ era que entenderíamos tudo o que Deus seria capaz de compreender se por acaso existisse. Mas não há nenhum Deus. Sou ateu. A religião acredita em milagres, mas estes são incompatíveis com a ciência”, disse na mesma entrevista.

“Nós não podemos provar que Deus não existe, mas a ciência faz com que Deus não seja necessário. As leis da física podem explicar o universo sem o pressuposto da existência um Criador”, disse à ABC News em 2010.

O legado que desenvolveu na ciência, cujo trabalho se destacou na área da relatividade e dos buracos negros, e a vida que conseguiu prolongar contra todos os prognósticos iniciais, levaram a que a sua vida se cruzasse também com a filosofia. O mesmo caminho levou-o até à religião.

Membro da Pontifícia Academia das Ciências desde 1986, Hawking foi recebido por quatro Papas - Paulo VI, em abril de 1975; João Paulo II, em outubro de 1981; Bento XVI, em outubro de 2008; e Francisco, em novembro de 2016 - e várias vezes convidado a falar sobre duas áreas que tantas vezes são colocadas em polos opostos: a religião e a ciência.

Em 2010, numa palestra dada na Pontifícia Academia das Ciências, em que falava sobre a origem do universo, Hawking disse que “os cientistas não criaram o mundo, eles estudam-no e tentam imitá-lo”.

À agência Reuters, em 2007, o físico dizia acreditar que a “simples explicação” para a criação do universo “é que não existe Deus nenhum”. “Ninguém criou o universo e ninguém define o nosso destino. Isto leva-me a uma profunda perceção de que provavelmente não há céu ou vida pós-morte. Nós temos esta vida para precisar o grande ‘design’ do universo, e por isso eu estou extremamente grato”, afirmou o cientista.

“As pessoas querem pensar que há algo com que se possam relacionar e que não as faça sentir isoladas, mas sim parte de algo maior. Procuram autoridade num sistema ético e um estilo de vida a que possam aspirar, mas não necessariamente alcançar”, disse o cientista à ABC News.

Em 2011, ao The Guardian, teria mesmo uma posição mais absolutista ao afirmar que “não há céu ou vida pós-morte para os computadores avariados; isso é um conto de fadas para pessoas com medo do escuro”,

“Deus é o nome que as pessoas dão à razão pela qual estamos aqui, mas eu penso que essa razão está nas leis da física ao invés de alguém com quem tenha uma relação pessoas. Um Deus impessoal”, disse em entrevista à revista TIME em 2010.

O homem que a imprensa frequentemente apelidava como o mais inteligente do mundo, gostava de dizer que nasceu 300 anos depois depois da morte de Galileu, faleceu no dia em que Albert Einstein completaria 139 anos, sem medo e com uma resposta absoluta sobre o que existe ou não existe para lá do que é possível calcular.