No segundo volume do livro "Quintas-feiras e outros dias", que hoje será apresentado publicamente, Cavaco Silva, no caso de figuras do PS, escreve que o atual primeiro-ministro, António Costa, é um "hábil profissional da política", "um artista da arte" que empurra os problemas de fundo da economia para a frente, carateriza o anterior líder socialista, António José Seguro, como um "medroso" e refere-se ao ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes como uma pessoa "desagradável".

"Neste seu livro, o professor Cavaco Silva revela uma profunda falta de sentido de Estado, escrevendo sobre conversas privadas que manteve com primeiros-ministros ou líderes partidários. A adjetivação que usa não é minimamente adequada. Deve haver respeito nas relações institucionais", defende a dirigente socialista Edite Estrela.

Também o vice-presidente da Câmara de Lisboa e líder da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) do PS, Duarte Cordeiro, destaca "a forma pouco elegante" como o anterior chefe de Estado abordou no seu livro de memórias o período de dez anos que passou no Palácio de Belém.

"Estamos perante mais um caso desagradável. No primeiro, ainda recentemente, visou o atual Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa", apontou Duarte Cordeiro, numa alusão à posição assumida por Cavaco Silva sobre o processo que culminou com a não recondução de Joana Marques Vidal no cargo de procuradora Geral da República.

As críticas mais violentas a Cavaco Silva partiram do líder parlamentar do PS, Carlos César, que na terça-feira à noite, na SIC Notícias, se insurgiu contra a conduta de Cavaco Silva, depois de sair da Presidência da República, "no tempo, nos conteúdos e no modo".

"Essa conduta tem sido frequentemente eivada de uma infeliz falta de sentido de Estado. Já o revelou há pouco tempo com considerações que visaram o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e agora, de forma frequentemente inconcebível, quando decide zurzir uma série de protagonistas políticos com considerações de toda a sorte sobre o caráter e a personalidade de pessoas com quem privou no exercício da mais alta magistratura da nação", acusou.

Carlos César referiu, ainda, na SIC Notícias, que alguns dos protagonistas visados estão em funções e foram alvo de "adjetivações que vão desde infantil e irresponsável [Paulo Portas], medroso [António José Seguro], mau trato [Azeredo Lopes] e artista [António Costa].

"Eu diria que a valentia adjetivadora que o professor Cavaco Silva exubera nestes seus livros contrasta com a forma pouco valente como exerce a autocrítica. Não fosse o professor Marcelo Rebelo de Sousa dizer em devido tempo que não faria livros deste género com revelações dessa índole e com comentários dessa natureza e estaríamos numa situação muito difícil: Os mais altos dignatários do Estado, os primeiros-ministros ou líderes partidários, nunca mais poderiam falar com um Presidente da República sobre assuntos que considerassem do mais elevado interesse nacional, porque seriam objeto da devassa e da delação presidencial", advertiu Carlos César.

Interrogado sobre as consequências políticas que poderá ter este livro de memórias de Cavaco Silva, Duarte Cordeiro desvaloriza-as: "Não são mais do que opiniões".

"Parece-me que tudo isto tem uma importância muito relativa", advoga o líder da FAUL do PS.

Embora também secundarize as consequências políticas resultantes das apreciações feitas por Cavaco Silva, Edite Estrela salienta porém um princípio no plano ético-moral: "Conversas privadas, sobretudo envolvendo titulares de órgãos de soberania e líderes partidários, não devem ser trazidas a público desta maneira", acrescenta.