Poeta e escritor, E.M. de Melo e Castro, como assinava, nasceu a 19 de abril de 1932, na Covilhã, e foi particularmente marcante na emergência da poesia concreta experimental e visual em Portugal.

Autor de uma obra demarcada pela construção de experiências com diferentes materiais, o seu livro "Ideogramas", que reúne 29 poemas concretos sem qualquer introdução ou nota explicativa, foi um “marco fundador” do experimentalismo, na literatura e na arte portuguesas.

Filho de Ernesto de Campos Melo e Castro, neto materno do 1.º Visconde da Coriscada e comendador da Ordem da Instrução Pública, E. M. de Melo e Castro licenciou-se em engenharia têxtil pela Universidade de Bradford, em Inglaterra, em 1956.

Desde sempre reconhecido como “figura multifacetada”, na literatura e na arte, pela crítica e pela investigação, E.M. de Melo e Castro participou no primeiro número da revista Poesia Experimental ("Po.Ex"), em 1964, tendo sido, dois anos mais tarde, um dos organizadores do segundo número desta publicação, pioneira na exploração de ‘transtextualidades’.

Entre as diversas antologias e suplementos em que colaborou, assinala-se a organização de "Hidra e Operação", tendo também colaborado com a revista Arte Opinião.

A publicação da extensa "Antologia da Novíssima Poesia Portuguesa", em 1959, pela Moraes, em colaboração com Maria Alberta Menéres (1930-2019), sua companheira, constituiu um momento decisivo na afirmação e divulgação da literatura portuguesa e dos autores emergentes, que vieram a definir a sua modernidade, de Alberto de Lacerda, Ana Hatherly, António José Forte e António Maria Lisboa, a Couto Viana, Gedeão, Daniel Filipe, Fernando Lemos, Leonor de Almeida, Mourão-Ferreira, Pedro Tamen, Ruy Belo, Vitor Matos e Sá, entre muitos mais.

A prática poética de Melo e Castro, pai da cantora Eugénia Melo e Castro, foi sempre acompanhada por uma “teorização sistemática sobre a linguagem e as tecnologias de comunicação”, cruzando-se, na sua extensa obra, múltiplas práticas e formas experimentais.

A explosão grafémica, o poema-objeto tridimensional, a recombinação intermédia de escrita, a performance que inscreve presença corporal e a teorização do poema como meio de crítica do discurso no universo dos meios de comunicação, constituem exemplos de algumas dessas práticas experimentais, pioneiras na arte portuguesa.

Figura marcante no meio artístico dos anos 1960 e 1970, E. M. de Melo e Castro dedicou-se, nas décadas seguintes, a investigar e espelhar no seu trabalho as relações entre a arte e o desenvolvimento tecnológico, tendo sido autor de um conjunto de obras pioneiras que recorreram ao vídeo e computador para produção literária.

E. M. de Melo e Castro chegou mesmo a desenvolver, entre 1985 e 1989, um projeto de criação de ‘videopoesia’, designado "Signagens", na Universidade Aberta.

Em 1998, o poeta terminava o seu doutoramento em Letras pela Universidade de São Paulo, no Brasil, tendo sido professor no Instituto Superior de Arte, Design e Marketing (IADE) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

A sua atividade artística foi apresentada em várias exposições coletivas, tanto em Portugal, como no estrangeiro, mas também em exposições individuais, espetáculos e 'happenings'.

Fez parte da histórica Alternativa Zero (1977), expôs na Galeria 111, na Galeria Buchholz, na Quadrum, na Galeria Divulgação, 1975; Centro de Arte Moderna, Fundação Calouste Gulbenkian, entre outros locais, no país e no estrangeiro.

Em 2006, o Museu de Arte Contemporânea de Serralves apresentou "O Caminho do Leve", uma exposição retrospetiva (retroativa) da sua grande obra, viajando da poesia concreta e experimental à ‘infopoesia’, passando pela ‘videopoesia’ e pela criação de imagens fractais, com uma seleção de obras representativas de quase cinco décadas de trabalho.

Em 2018, Brasília recebeu, nos meses de outubro a dezembro, a exposição "Poesia Experimental Portuguesa", que reúne obras datadas de 1960 até à atualidade e inéditos de E.M. Melo e Castro.

O poeta e artista foi também evocado na mostra dedicada à primeira geração de autores de poesia experimental portuguesa, da qual fizeram parte igualmente Ana Hatherly e Herberto Helder, montada pela Galeria Zé dos Bois (ZDB), em Lisboa, no início de 2017.

A obra de Melo e Castro faz parte de coleções como as de arte contemporânea da Fundação Calouste Gulbenkian e da Fundação de Serralves.

A viver há mais de 20 anos no Brasil, E. M. de Melo e Castro, considerado um dos artistas portugueses mais acarinhados pelo público do país de acolhimento, foi feito, a 10 de junho de 2017, comendador da Ordem do Infante D. Henrique.

Ministra da Cultura recorda poeta como exemplo de inventividade

“Para a poesia e para as artes plásticas portuguesas, E. M. de Melo e Castro será sempre um exemplo de inventividade e de um talento que nunca se conformou com limites e dogmas”, salienta a ministra, numa nota de pesar e condolências à família.

Graça Fonseca salienta que o poeta, “figura incontornável” da poesia experimental portuguesa, sempre foi “dinâmico e interventivo” e que o seu trabalho artístico sempre se fez acompanhar de uma “produção teórica consciente e maturada”.

Na missiva, a ministra recorda que, com a publicação de "Ideogramas", em 1962, o poeta Ernesto Melo e Castro inaugurou a poesia concreta portuguesa, construindo assim um “alicerce iniciador do experimentalismo”.

“Foi pioneiro na escrita e nas artes plásticas portuguesas, com uma obra vasta e multidisciplinar em que, como o próprio tantas vezes referia, a transgressão foi o ponto crucial da sua produção”, refere.

Do percurso do poeta, Graça Fonseca destaca ainda a organização, juntamente com a sua mulher, Maria Alberta Menéres, da "Antologia da Novíssima Poesia Portuguesa", considerando-a uma “obra ímpar pelo rigor da seleção, pelo detalhe e completude da informação e pelo impacto que teve na poesia portuguesa contemporânea”.

“No seu trabalho, poderemos sempre ver uma língua em constante revolução, em constante tensão, uma língua sem fronteiras definidas e que permanentemente se reinventa”, recorda.

(Artigo atualizado às 16:18)