Em entrevista à Lusa, em Luanda, José Oliveira, especialista do CEIC, um dos mais prestigiados organismos de análise económica do país, da Universidade Católica de Angola, explicou que a exoneração anunciada hoje pelo Presidente da República "já era esperada" face à "situação muito grave" em que a concessionária nacional vive.
"A situação tinha de ser reparada. Para se ter uma noção, basta dizer que nunca em 40 anos, neste país, os diretores das companhias petrolíferas pediram uma entrevista ao Presidente da República para fazerem queixas que o setor está parado, não anda, que precisa de medidas. Isto é inédito", disse.
Como exemplos, o especialista aponta a falta de negociação da Sonangol com as companhias, atrasos nos pagamentos por parte da concessionária e outras alegadas exigências colocadas às companhias petrolíferas.
"Negoceia-se, não se impõem coisas a companhias que vêm cá investir centenas de milhões de dólares", criticou José Oliveira.
O Presidente angolano, João Lourenço, deu 30 dias, a contar de 13 de outubro, para um grupo de trabalho, que integrava as principais petrolíferas que operam em Angola e a Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola (Sonangol), apresentar propostas para melhorar o desempenho da indústria nacional de petróleo e gás.
O grupo foi coordenado - o prazo de 30 dias já terminou - pelo ministro dos Recursos Minerais e dos Petróleos, Diamantino Azevedo, com o objetivo de responder à "necessidade de melhorar as atuais condições de investimento na indústria de petróleo e gás, como condição relevante para o desenvolvimento futuro do país".
A criação deste grupo de trabalho surgiu precisamente uma semana depois de as petrolíferas terem defendido, a 06 de outubro, numa reunião com o novo Presidente angolano, João Lourenço, medidas para melhorar a competitividade do setor, face aos países concorrentes.
Estiveram nessa reunião, no palácio presidencial, os administradores da BP Angola, Cabinda Gulf Oil Company (Chevron) Eni Angola, Esso Angola, Statoil Angola e Total E&P.
"Isto mostra como as coisas na concessionária estavam. A agora antiga administração preocupou-se com o aspeto empresarial, de contas, de melhorar o balanço e análise de todo o grupo e esqueceu-se que a função de concessionária é tão ou mais importante", criticou ainda José Oliveira.
O especialista recorda que neste cenário, sem entendimentos com a Sonangol e medidas concretas de apoio, as operadoras não investem na produção de petróleo em Angola, situação agravada pela baixa da cotação internacional, com as consequências que daí resultam.
"E é preciso fazer qualquer coisa, se não a produção, daqui a dois ou três anos, dá um tombo", alertou, numa altura em que o país garante cerca de 1,6 milhões de barris de crude diários.
Para o cargo de presidente do conselho de administração da Sonangol foi hoje nomeado Carlos Saturnino, que Isabel dos Santos exonerou da Sonangol Pesquisa & Produção em dezembro de 2016, e que João Lourenço coloca agora a liderar o maior grupo empresarial do país.
"É um hábil negociador. Foi durante mais de 10 anos director de negociação, fez grandes contratos, conhece o sistema por dentro e por fora. É um bom gestor e depois conhece a empresa toda. E leva para lá uma equipa que conhece a empresa toda, uns com mais experiência, outros com menos, mas tudo gente de dentro", explicou José Oliveira.
Para o especialista do CEIC, "estabelecer um clima" que permita colocar a Sonangol "a funcionar, coisa que a antiga administração não fez", ao "considerar que quase todos os que já lá estavam eram inimigos", será uma prioridade do novo líder da petrolífera estatal.
"Perdeu-se um ano e meio, criaram-se problemas perfeitamente escusados, porque já bem bastavam os problemas financeiros que a empresa tinha e que não estão resolvidos. Desprestigiou-se a empresa, ainda mais do que ela já estava", concluiu.
Isabel dos Santos foi nomeada para o cargo de presidente do conselho de administração da Sonangol, pelo pai, o ex-chefe de Estado José Eduardo dos Santos, em junho de 2016, tendo sido hoje exonerada, juntamente com a restante administração, pelo Presidente da República, João Lourenço.
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