“No caso do alojamento precisamos de uma ação política urgente, para ontem, para que os estudantes que no próximo ano venham estudar para Lisboa não paguem rendas médias de 325 euros, melhorando e construindo novas residências, que sabemos que leva tempo, mas, para ontem, queremos um quadro fiscal que permita obter maiores benefícios fiscais a quem arrenda a estudantes”, disse à Lusa João Rodrigues, presidente da Federação Académica de Lisboa (FAL).
O ‘Livro Negro do Ensino Superior’ da FAL, hoje apresentado no Instituto Superior de Agronomia de Lisboa, resulta de um inquérito a 629 alunos de universidades e politécnicos de Lisboa, uma “amostra representativa” da população estudantil na capital, que decorreu em dezembro de 2017 e cujos resultados são agora divulgados.
Cerca de dois terços dos alunos, ou seja, “64% dos estudantes do ensino superior de Lisboa não se sentem satisfeitos com o alojamento que têm, quer seja residência universitária, quer seja casa arrendada. Uma larga maioria dos estudantes, acima dos 90% dos que estão em casa arrendada, paga uma renda acima dos 150 euros. Em valor médio um estudante em Lisboa paga 325 euros por uma casa arrendada”, disse à Lusa João Rodrigues, que referiu ainda a lotação das residências universitárias e da falta de condições básicas que muitas vezes os estudantes encontram.
Falta, entre outras coisas, acesso à Internet, um espaço de estudo próprio ou um acesso em condições razoáveis a utilidades essenciais: “Por exemplo, há uma residência que tem um fogão para 50 estudantes”.
Os estudantes querem não só que sejam construídas mais residências universitárias, uma solução que reconhecem ser a mais longo prazo, mas também, “para ontem”, uma política fiscal que beneficie estudantes e os senhorios que lhes arrendem casas.
Entre as propostas lançadas pelos estudantes estão benefícios fiscais diretos para rendas cobradas a estudantes, benéfico para proprietários e, possivelmente para o Estado, com o aumento das rendas declaradas e o combate à evasão fiscal; aumentar a dedução das despesas com educação em sede de IRS, com benefício para as famílias; ou, envolvendo as autarquias, diferenciar o IMI cobrado em casas arrendadas a estudantes, e promover a reabilitação do património devoluto oferendo melhores condições a quem disponibilize as casas reabilitadas a estudantes.
“Com os valores de arrendamento cobrados, o que vemos é cada vez mais estudantes a pensar se vale realmente a pena continuar no ensino superior”, disse João Rodrigues.
O presidente da FAL destaca ainda outro fenómeno associado ao elevado preço do alojamento praticado em Lisboa: entre as respostas ao inquérito, a grande maioria dos deslocados afirma estar a pelo menos 250 quilómetros de distância da sua residência.
Para distâncias entre casa e universidade mais curtas, até cerca de 100 quilómetros, a opção é muitas vezes a da deslocação diária, porque em termos comparativos o custo do transporte é menor do que o do arrendamento ou da residência.
“São muito poucos os estudantes a menos de 50 ou 100 quilómetros. Isto traduz que um estudante só arrenda uma casa ou vai para uma residência universitária se realmente não tiver outra hipótese, porque o preço é elevadíssimo. Muitos deles preferem fazer, por exemplo, viagens Lisboa-Setúbal e Setúbal-Lisboa todos os dias do que arrendar uma casa em Lisboa, porque não têm essa possibilidade. Há aqui também um fenómeno de pouca mobilidade e de falta de processos que fomentem a emancipação dos jovens em Portugal”, disse o líder estudantil.
O ‘Livro Negro’ identificou ainda outras situações, como uma percentagem de quase 40% de estudantes que afirmam que as residências universitárias não têm condições de acessibilidade para alunos com deficiência física; e a ausência ou desconhecimento de existência por cerca de 60% dos estudantes de gabinetes de apoio a alunos com necessidades educativas especiais, o que, segundo João Rodrigues, “demonstra um problema de comunicação académica”.
“Os estudantes dizem também que há pouca ligação com o mercado de trabalho e que os seus currículos são pouco diversificados, pouco flexíveis. São tudo fenómenos que ajudam a explicar o abandono escolar, assim como bolsas de ação social que só apoiam 20% da população estudantil”, disse João Rodrigues.
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