“Sinceramente, não notei diferenças. A vida continua”, disse à Lusa Camila Rodrigues, brasileira que vive em Londres há 11 anos e trabalha no “Pastel do Brasil”, uma banca com comidas e bebidas instalada numa das entradas do mercado.

Depois de mais de uma década a assistir à relação dos britânicos com Isabel II, Camila surpreende-se agora com o que tem visto em Londres desde que a rainha morreu, em 08 de setembro, aos 96 anos, depois de reinar mais de 70.

“Eu e a minha família comentávamos: no dia em que a rainha morrer, Londres vai parar. E não parou”, conta, acrescentando a seguir a frase mais repetida hoje à Lusa no mercado: “A vida continua.”

A manhã de hoje em Portobello Road era igual à de todos os sábados, sobretudo, quando o bom tempo ajuda à afluência de turistas e locais, que vão cruzando por entre as bancas, tomando cafés nas esplanadas ou simplesmente passeando pelas ruas.

Numa das pontas do mercado, ligando prédios dos dois lados da rua, uma bandeira com fundo preto, uma imagem de Isabel II e as datas do seu nascimento e morte, ladeadas por duas bandeiras do Reino Unido, são dos poucos sinais que lembram que a rainha morreu.

Mas é necessário ir atento e levantar o olhar para reparar nesta referência, embora Isabel II esteja bem presente em artigos vendidos no mercado, desde cerâmicas a revistas antigas ou recriações da sua imagem em sacos ou roupas, atestando que era um ícone também da cultura popular.

“Tinha muito mais coisas relacionadas com a rainha, mas vendi quase tudo nos últimos dias”, diz Yagiz Yuksel, turco de 34 anos, que vende sacos de pano com pinturas suas.

São os turistas que sobretudo lhe compram os sacos, mas de resto, no mercado ou no bairro do leste de Londres onde vive, Hackney, “as pessoas realmente não ligam nenhuma” à morte da rainha, afirma.

Para Yagiz, isso talvez se deva ao elevado número de estrangeiros que vivem em Londres e que “nem sabem o que sentir”.

Além de haver mais procura, na banca de Andrés houve também aumento de preços, para aproveitar o renovado interesse dos clientes nos inúmeros produtos, quase todos velharias, com a imagem de Isabel II ou relacionados com a monarca.

“A rainha não ia querer que passássemos fome”, diz Andrés, espanhol que vive há 30 anos em Londres e há 25 ali mesmo, em Portobello Road.

Já trabalhou na banca, mas agora dedica-se a vender velharias, e não se mostra especialmente surpreendido com o pouco ou nenhum impacto da morte da rainha na vida de quem vive em Londres ou na atividade e ambiente da cidade, depois “do que se montou”, há 25 anos, quando morreu Diana de Gales.

“Mas Diana morreu tragicamente, a rainha já tinha 96 anos”, acrescenta, enquanto atende uma turista também espanhola que está na cidade desde quarta-feira e depois do que viu nestes dias está convencida e que se fala mais da morte de Isabel II fora de Inglaterra do que em Londres.

Parece-lhe, até, que viu nestes dias, mais do que noutras visitas à cidade, mais gente do que nunca a aproveitar o tempo sem chuva nas esplanadas, a tomar uma bebida e a petiscar.

Também britânicos que vivem na cidade, como Eve e Oscar, ambos com 25 anos, confirmam que “a vida continua”.

“A rainha era simpática e positiva, mas não me senti nem sinto especialmente afetado”, diz Oscar, que passeava hoje com um copo de café na mão por Portobello Road.

A seu lado, Eve conta que estava no centro de Londres quando “os telemóveis de toda a gente” receberam o alerta da BBC a dizer que a rainha tinha morrido e que não viu perturbação e ela própria seguiu com a sua vida.

“Os meus pais estão mais afetados, como as pessoas que viveram a vida toda com a rainha. Nós somos mais jovens. Pode ser só um sinal do fim”, diz, rindo.

Portobello Road fica a cerca de 6,5 quilómetros de Westminster, uma distância menor do que os 8 quilómetros (e um tempo de espera de mais de 16 horas) que tinha hoje ao início da tarde a fila de pessoas que querem passar em frente da urna de Isabel II, que está no palácio de Westminster, que acolhe o parlamento inglês.

Mas para ver como “a vida continua” em Londres desde que a rainha morreu não é preciso ir para tão longe dos palácios de Westminster e de Buckingham, a residência oficial dos reis britânicos, que é há mais de uma semana local de atração de milhares de pessoas que vão homenagear a rainha com flores e outras ofertas ou simplesmente passear, para ver o ambiente, os fenómenos de multidão e as cerimónias.

Fora das imediações de Westminster e Buckhingham, em ruas e bairros logo ao lado, há também multidões em permanência, mas as habituais do centro de Londres, com as que enchem cafés, restaurantes, lojas, salas de espetáculo e museus da cidade.