Marcelo Rebelo de Sousa admitiu em declarações à TSF condecorar José Mário Branco "se aqueles que lhe são próximos entenderem que não traem a sua memória aceitando esse reconhecimento público, então, obviamente, o que não foi possível fazer em vida será feito postumamente".

Caso contrário, diz o Presidente da República, "respeitar-se-á a sua vontade". "Ele era como era e é assim que devemos admirá-lo", frisou.

À mesma rádio, Marcelo disse que tentou condecorar José Mário Branco em vida, "mas ele foi sempre muito reticente. Foi sempre muito avesso a condecorações, a reconhecimentos públicos", explicou o Presidente da República. "Ele manifestou sempre, de forma muito bem-educada e discreta, que o que lhe importava era deixar um testemunho e fazer passar a palavra. O reconhecimento formal era menos importante".

Assumindo que foi com "muita consternação" que recebeu a notícia, Marcelo Rebelo de Sousa refere que "José Mário Branco era uma referência do período de resistência à ditadura, da revolução e pós-revolução de Abril e de uma geração que, através da sua voz, exprimiu a vontade de mudança política económica e social na sociedade portuguesa".

"O seu desaparecimento representa uma perda", acrescentou.

"A minha geração recorda de forma muito viva José Mário Branco. (...)  [A sua música] era trauteada e cantanda por pessoas de vários quadrantes [políticos]. O meu quadrante, na altura, como hoje, não era exatamente o quadrante de José Mario Branco, mas aquilo que marcava a sua música era um desejo de mudança profundo, sincero", disse o Presidente, recordando ainda ter estado num "concerto histórico" do músico "no Coliseu, já muito próximo do 25 de Abril".

José Mário Branco "era uma pessoa muito independente, muito firme nas suas convicções e muito mobilizador por uma certa austeridade de comportamento e firmeza na luta. Foi sempre um revolucionário, um insatisfeito, desejando sempre muito mais e muito melhor", concluiu.

O músico e compositor José Mário Branco faleceu esta terça-feira, 19 de novembro, aos 77 anos.

A notícia foi avançada pela RTP e confirmada ao SAPO24 por fonte da editora.

Músico, cantor e compositor, José Mário Branco é autor de uma obra singular no panorama musical português. Desde a música de intervenção ao fado, destacam-se obras como Ser solidário, Margem de Certa Maneira, A noite, e o emblemático FMI.

José Mário Branco editou o primeiro longa-duração, "Mudam-se os tempos mudam-se as vontades", ainda no exílio em França, em 1971, musicando textos de Natália Correia, Alexandre O’Neill, Luís de Camões e Sérgio Godinho.

No entanto, os 50 anos de vida musical do autor português são marcados a partir da gravação em 1967 do primeiro EP, "Seis cantigas de amigo", editado dois anos depois pelos Arquivos Sonoros Portugueses.

A edição de "Ser solidário", de 1982, inclui a gravação de "FMI", uma das composições mais célebres de José Mário Branco.

Nascido no Porto, em maio de 1942, José Mário Branco é considerado um dos mais importantes autores e renovadores da música portuguesa, em particular no período da revolução de abril de 1974, cujo trabalho se estende também ao cinema, ao teatro e à ação cultural.

Foi fundador do GAC - Grupo de Acção Cultural, fez parte da companhia de teatro A Comuna, fundou o Teatro do Mundo, a União Portuguesa de Artistas e Variedades e tem colaborado na produção musical para outros artistas, nomeadamente Camané, Amélia Muge, Samuel e Nathalie.

O último álbum de originais, "Resistir é vencer", data já de 2004. Depois disso, José Mário Branco participou no projecto Três Cantos, ao lado de Sérgio Godinho e Fausto Bordalo Dias, que resultou numa série de concertos, um álbum e um DVD.

No ano passado, José Mário Branco assegurou a direção musical do filme "Alfama em si", de Diogo Varela Silva.

Recentemente, a vida de José Mário Branco foi passada em revista, com a participação do próprio músico, no documentário "Mudar de vida", de Nelson Guerreiro e Pedro Fidalgo.

Este ano, mais de uma dezena de músicos interpretaram temas de José Mário Branco num disco-agradecimento editado pela Valentim de Carvalho.

O SAPO24 publicou uma entrevista com José Mário Branco em março deste ano, uma conversa que vale a pena reler.

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