Segundo Eurico Reis, a demissão tem efeitos a partir de segunda-feira, devendo o juiz desembargador participar ainda na reunião do CNPMA que na sexta-feira vai analisar o acórdão do Tribunal Constitucional (TC).

O TC considerou inconstitucionais algumas normas da lei da PMA, nomeadamente o anonimato dos dadores de gâmetas e a gestação de substituição.

De acordo com Eurico Reis, a demissão das funções que ocupa neste órgão regulador, do qual faz parte desde a sua criação em 2006, é “uma forma de protesto contra o acórdão do TC, nomeadamente as suas decisões e a fundamentação das mesmas”.

Numa primeira reação, no dia em que foi conhecida a decisão do TC, o juiz desembargador considerou que o chumbo de várias regras da lei da PMA espelha a visão dos juízes que o compõem e vai trazer mais infelicidade, alertando ainda para as consequências desta decisão.

“Vai deixar de haver dadores, vamos gastar rios de dinheiro a importar gâmetas ou então para a PMA toda, ficando a funcionar apenas para aqueles para quem ainda é possível realizar tratamentos com material dos próprios”, disse à Lusa.

O acórdão do TC responde a um pedido de fiscalização da constitucionalidade formulado por um grupo de deputados à Assembleia da República.

Eurico Reis referiu que o TC se desdiz, pois não levantou problemas em relação ao anonimato dos dadores, plasmado na lei da PMA, de 2006, levantando-os agora.

Em relação à gestação de substituição, o juiz desembargador considerou que esta posição é “um ataque” a uma “forma muito equilibrada que o legislador encontrou de dar felicidade às pessoas”.

Recordando que são precisas entidades como os tribunais para que a sociedade funcione de forma organizada, Eurico Reis alerta para uma questão: “Quem é que guarda os guardas, principalmente os guardas que ninguém guarda?”.

As declarações de inconstitucionalidade do TC não se irão aplicar nas situações em que já tenham sido iniciados os processos terapêuticos, em execução de contratos já autorizados pelo CNPMA.

A lei que regula o acesso à gestação de substituição nos casos de ausência de útero, de lesão ou de doença deste órgão que impeça de forma absoluta e definitiva a gravidez, foi publicada em Diário da República em 22 de agosto de 2016.

A legislação foi publicada depois de introduzidas alterações ao diploma inicial, vetado dois meses antes pelo Presidente da República, que o devolveu ao parlamento para que a lei fosse melhorada e incluísse "as condições importantes" defendidas pelo Conselho de Ética.

Na altura, Marcelo Rebelo de Sousa justificou a decisão com o argumento de que faltava na lei "afirmar de forma mais clara o interesse superior da criança ou a necessidade de informação cabal a todos os interessados ou permitir, a quem vai ter a responsabilidade de funcionar como maternidade de substituição, que possa repensar até ao momento do parto quanto ao seu consentimento".

A lei de gestação de substituição foi aprovada, com alterações após o veto presidencial, em 20 de julho de 2016, com os votos favoráveis do BE (partido autor da iniciativa legislativa), PS, PEV, PAN e 20 deputados do PSD, votos contra da maioria dos deputados do PSD, do PCP, do CDS-PP e de dois deputados do PS e a abstenção de oito deputados sociais-democratas.

As alterações introduzidas pelo BE estabelecem essencialmente a necessidade de um contrato escrito entre as partes, "que deve ter obrigatoriamente disposições sobre situações de malformação do feto ou em que seja necessário recorrer à interrupção voluntária da gravidez".

A decisão do TC foi saudada pelo CDS-PP, pela voz da sua líder, Assunção Cristas, depois de ter cabido aos centristas liderar o processo de pedido de fiscalização sucessiva, tendo também o PSD, através do seu líder parlamentar, Fernando Negrão, registado “com agrado” a decisão do tribunal.

Bloco de Esquerda e PS mostraram-se disponíveis para introduzir alterações à lei.

[Notícia atualizada às 20h56]