Em fevereiro, Marcelo Rebelo de Sousa já tinha vetado um diploma sobre a mesma matéria, mas com fundamentos diferentes (não políticos), pedindo ao Tribunal Constitucional (TC) a sua fiscalização preventiva, naquela que foi a segunda vez que o chefe do Estado recorreu a este órgão desde que assumiu a chefia do Estado, em 09 de março de 2016.

Por maioria, os juízes do Palácio Ratton declararam em março o diploma inconstitucional por "insuficiente densidade normativa" do artigo 2.º n.º 1, que estabelecia os termos para a morte medicamente assistida deixar de ser punível.

O parlamento reapreciou o decreto e aprovou uma nova versão em 05 de novembro, com votos a favor da maioria da bancada do PS e de BE, PAN, PEV, Iniciativa Liberal, de 13 deputados do PSD e das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues.

Dois deputados socialistas e três sociais-democratas abstiveram-se. A maioria da bancada do PSD votou contra, assim como PCP, CDS-PP e Chega e sete deputados do PS.

Na segunda-feira, o Presidente da República justificou a devolução, sem promulgação, para que os deputados clarifiquem o conceito de “doença incurável” e também para que seja reponderada a opção de “doença fatal” ter deixado de ser exigível para justificar o pedido de morte medicamente assistida.

De acordo com o Regimento da Assembleia da República, uma reapreciação de um diploma vetado só pode acontecer a partir do 15.º dia a contar após a receção da mensagem fundamentada do Presidente e o parlamento está a poucos dias de ser dissolvido, na sequência do “chumbo” do Orçamento do Estado de 2022.

Deste modo, só o parlamento saído das eleições antecipadas de 30 de janeiro de 2022 poderá voltar a debater e votar um diploma sobre esta questão.

A última vez que o Presidente da República tinha exercido o veto político foi em 24 de agosto, devolvendo ao parlamento o decreto que alterava as regras de enquadramento do Programa de Apoio à Economia Local (PAEL), aprovado por PS, PCP e PEV.

Antes disso, o anterior veto do Presidente da República tinha sido em 22 de abril, também a um diploma do parlamento, sobre o recurso à procriação medicamente assistida (PMA) através da inseminação com sémen após a morte do dador.

Desde que assumiu as funções de Presidente da República, em 09 de março de 2016, Marcelo Rebelo de Sousa usou 25 vezes o veto político.

Em 2016, usou três vezes o veto político, em 2017 duas vezes, em 2018 seis, em 2019 cinco vezes, em 2020 seis vezes e na segunda-feira exerceu esse direito constitucional pela terceira vez em 2021 - ano em que foi reeleito e tomou posse para um segundo mandato de cinco anos.

Destes 25 vetos políticos, quatro incidiram sobre decretos do Governo e 21 sobre legislação da Assembleia da República, contando com o da eutanásia.

De acordo com a Constituição, se a Assembleia da República confirmar o voto por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções, 116 em 230, o Presidente da República deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção.

Um ano após ter sido eleito, em janeiro de 2017, o Marcelo Rebelo de Sousa definia-se como um chefe de Estado que não recorre ao Tribunal Constitucional como "uma espécie de defesa", mas que exerce "sem complexo nenhum" o veto político, perante fortes divergências.