“Eu é que mandei criar a empresa, apresentei um plano de trabalho [sobre a empresa] ao diretor-geral e ele autorizou”, afirmou António Carlos do Rosário, antigo diretor da Inteligência Económica do Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE) e arguido no processo principal das dívidas ocultas em resposta ao Ministério Público (MP).

O arguido avançou que a ideia da criação da empresa, chamada Txopela Investments, fazia parte da estratégia dos serviços secretos de abrir firmas ou participar em sociedades para atrair investimentos para o país ou de atividades económicas ou empresariais para a defesa da soberania e dos interesses económicos do país.

“Tive autorização para criar veículos económicos operacionais, tinha autorização do diretor-geral para criar os veículos relevantes”, declarou António Carlos do Rosário.

A Txopela Investments, prosseguiu, tinha como principais investidores acionistas estrangeiros, cuja proveniência recusou revelar, alegando tratar-se de “informação classificada”.

O antigo diretor afirmou que os setores económico e empresarial também são alvo do trabalho dos serviços de informação, apontando empresas estratégicas como a Eletricidade de Moçambique (EDM) onde há agentes colocados.

António Carlos do Rosário adiantou em tribunal que o seu advogado no julgamento em curso, Alexandre Chivale, é um “colaborador” do SISE, tendo sido colocado na Txopela Investments como administrador por inerência da ligação que tem com os serviços secretos.

Questionado pelo MP se é acionista da empresa, António Carlos do Rosário respondeu que não subscreveu qualquer participação na sociedade, mas confrontado com documentos sobre a sua posição de acionista afirmou que o seu nome pode ter sido usado para o efeito, porque o jurista responsável pelo pacto constitutivo da sociedade tinha poderes para o efeito.

Quanto às relações empresariais com os arguidos Cipriano Mutota, ex-diretor do Gabinete de Estudos e Projetos do SISE, e Ângela Leão, mulher do antigo diretor-geral da instituição e arguido Gregório Leão, António Carlos do Rosário admitiu ter constituído uma sociedade com os dois primeiros, mas que “não saiu do papel”.

Gregório Leão desaconselhou a sociedade, acrescentou Rosário.

Confrontado com o facto de a referida sociedade ter sido usada para a constituição de uma outra com os três acionistas, Rosário disse que não via “nenhuma contradição” nessa ação, referindo que apenas conheceu os arguidos Ndambi Guebuza – filho do antigo Presidente da República Armando Guebuza — Teófilo Nhangumele e Bruno Langa no estabelecimento prisional onde se encontram.

A resposta negativa de António Carlos do Rosário contrasta com a posição da acusação de que os quatro réus viajaram juntos para a Alemanha e Abu Dhabi onde foram visitar estaleiros da Privinvest, empresa acusada de pagamento de subornos alimentados com o dinheiro das dívidas ocultas.

O MP moçambicano acusa António Carlos do Rosário, que era também presidente das três empresas beneficiárias do dinheiro das dívidas ocultas, de ter recebido 8,9 milhões de dólares (7,6 milhões de euros), pelo seu papel no projeto de proteção da Zona Económica Exclusiva e criação das firmas, que a justiça considera que foram usados como ardil para a mobilização dos empréstimos.

Rosário responde por associação para delinquir, peculato (apropriação ilegal de recursos do Estado) e branqueamento de capitais.