As características lojas de Fátima apresentam-se como sempre foram: cheias de artigos religiosos de todos os tipos, dos mais tradicionais aos mais modernos. Há de tudo, para todo os gostos e finalidades. Para levar como lembrança de uma peregrinação, alfaias litúrgicas para as igrejas, livros e postais variados. Mas algo está diferente nestes meses: não existem clientes.

Teresa Carreira, proprietária da Loja Teresa, não esconde a preocupação. Este é o seu negócio há mais de 20 anos e nunca viu nada assim. "Não é um 12 e 13 de outubro normal, temos uma grande quebra de vendas — enorme mesmo, não tem comparação possível", começa por dizer ao SAPO24, enquanto encolhe os ombros para dizer que "a comunicação social está a contribuir para as pessoas não virem a Fátima".

"Ainda há pouquinho um cliente meu me ligou a dizer que não vinha porque tinha medo que não o deixem entrar no Santuário. Eu compreendo que os números [de infeções pela covid-19] estejam a aumentar muito, estamos numa situação muito difícil em que cada vez tem de haver mais cuidado da parte das pessoas. Mas aqui em Fátima todos usamos máscaras, temos os devidos cuidados, usamos o gel, não deixamos entrar muita gente nas lojas, mantemos a distância. As pessoas não tinham de ter medo de vir — e nós precisamos dos nossos clientes neste tempo de pandemia", desabafa.

Os últimos meses não foram fáceis. Teresa fechou a loja em março e voltou a abrir portas a 7 de maio, mas as contas que faz são outras. "Foram quase três meses fechada, porque o mês de maio não existiu. Não deixaram entrar as pessoas, por isso não se vendeu nada. Era dos melhores meses, como também seriam agosto e outubro. Aí é que se fazia alguma coisita", lembra.

Contudo, num ano em que o turismo quase parou, os emigrantes tentaram manter as suas tradições. "Vêm de férias do Luxemburgo, Suíça, França e vêm sempre a Fátima. Graças a Deus foram eles que fizeram com que vendêssemos um pouquinho, mas nada comparado com os anos anteriores", garante Teresa.

Ana Silva está à frente da loja Custódia Silva, negócio de família há 35 anos. Tal como Teresa Carreira, não esconde as dificuldades que tem sentido. "Está muito mais fraco. É complicado, se uma pessoa não tivesse qualquer coisinha de parte não aguentava. Vivemos muito com o turismo e este ano não temos, só vêm portugueses que compram qualquer coisinha — mas não chega para podermos manter as lojas e os funcionários", assegura. "No 12 e 13 de maio estava deserto, não vinham pessoas. Agora voltam, a pouco e pouco. Mas com muitos casos as pessoas começam a ter medo. Para quem vive de turismo este ano é para esquecer", diz.

Loja Custódia Silva, em Fátima, a 11 de outubro de 2020
créditos: Hugo David | MadreMedia

"O mês de outubro tem estado a ser muito mau, completamente um desastre"

No início, quando tudo começou, ainda se pensou que este mês seria diferente. Esperava-se que a pandemia acalmasse e os peregrinos voltassem em peso, com menos restrições — ou menos receios. Mas tal não se verifica.

"O mês de outubro tem estado a ser muito mau, completamente um desastre. Por exemplo, de manhã nós abrimos e não anda praticamente ninguém nas ruas. São os nossos clientes que conhecem a loja que ainda cá vêm. São os clientes habituais. Aqui vive-se de turismo. E, se não há grupos grandes, não há turismo. Vai ser um ano muito difícil para toda a gente em Fátima. As pessoas dos hotéis ainda estão muito pior, porque implica muito dinheiro para os manter abertos", afirma Teresa Carreira.

Ana Silva também tem pouca esperança para estes dois dias, que seriam de grande peregrinação e movimentação em Fátima. "Em questão de negócio não estou à espera de nada para o 12 e 13 de outubro. Vão ser dias normais, como outros quaisquer nesta fase, ou mais fracos ainda", atira.

"As pessoas têm medo de vir para muitas confusões e o Santuário também pode fechar o recinto, com o limite para as seis mil pessoas. Mas eu acho que nem vai chegar a vir tanta gente. As pessoas não vão arriscar. Se calhar estiveram mais pessoas este domingo [11 de outubro], porque as pessoas não sabiam que iam fechar também e arriscaram a vir. Mas era uma medida importante para a segurança de todos. Sabemos que para nós é fraco, mas este ano tem de ser assim. Temos de salvaguardar as vidas de todos nós", lembra a comerciante. 

Ter poucos clientes também implica reduzir as equipas de trabalho. Na Loja Teresa costumam trabalhar, por esta data, cinco ou seis pessoas."Nestes dias vamos ter duas pessoas e não vamos ter trabalho. Nem vamos falar a pessoas para trabalhar quando não se faz dinheiro. São mais custos, não dá. É um ano muito difícil para toda a gente. Todos os dias agradeço aos portugueses, porque são eles que nos estão a ajudar a aguentar", lembra Teresa. "Este dia 12 vai ser muito fraco e dia 13 também. Vamos ter de aguentar este ano, vai ser um ano de crise. Mas vamos rezar para que este vírus se vá embora e possamos trabalhar novamente".

Loja Teresa, em Fátima, a 11 de outubro de 2020
créditos: Hugo David | MadreMedia

Ana passa pela mesma situação. Costuma ter uma equipa grande na loja Custódia Silva e, pela primeira vez, teve de cortar no número. "É habitual termos entre oito a dez pessoas, vamos estar dois ou três este ano e não vamos ter trabalho. Um chegava, mas pronto. Assim asseguramos as horas de almoço, já que não fechamos. Este ano sabemos que não é um ano para ganhar dinheiro ou para pagar as despesas, mas o importante é termos saúde e estarmos cá para quando isto passar. Daqui a um ou dois anos, vamos ver", diz, enquanto bate com as mãos no balcão.

Os tempos são difíceis, mas as comerciantes garantem que o medo não pode vencer. É preciso andar para a frente, continuar com o negócio para viver.

"Não tenho medo de aqui estar. Antes nós não sabíamos o que era este vírus, agora já estamos preparados. Mantemo-nos afastados do cliente, temos os desinfetantes para as mãos. Sinceramente não tenho medo nenhum. Penso que, se as pessoas tiverem cuidados, isto não será assim tão mau como toda a gente estará a pensar", diz Teresa.

Ana, por sua vez, lembra que não pode pensar só em si — há que olhar para os contactos possíveis. "Quanto as pessoas entram na loja tenho o cuidado de ver se têm máscara, temos o gel desinfetante, não podemos ter muita gente na loja. Mas não tenho medo por mim, o que não quer dizer que não possa vir a ficar contaminada e ter problemas. Tenho medo só de passar aos meus familiares mais idosos, é esse o meu receio", afirma.

Teresa resume toda a situação. "São tempos difíceis. Tenho pena que se assuste tanto as pessoas. Aqui vive-se em segurança, estamos em segurança e no Santuário está tudo muito organizado para receber os peregrinos. Eles estão a trabalhar muito bem, estão muito organizados", assegura.

Nas outras lojas, o ambiente é semelhante. Muito para vender, mas poucos para comprar. As típicas lojas das arcadas, coladas umas às outras e repletas de artigos, estão praticamente desertas. Quase ninguém compra velas, terços, uma imagem de Nossa Senhora para levar. Ao passar, a resposta dos comerciantes a como vai o negócio é quase sempre a mesma. Não é preciso dizerem nada, o que se vê fala por si. Enquanto isso, esperam que os clientes voltem, que tanta falta fazem.

Uma das lojas das arcadas do Santuário, a 11 de outubro de 2020
créditos: Hugo David | MadreMedia

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