“Vivemos tempos de intimidação da democracia, quer através de ações terroristas, quer através do ressurgimento de ideologias, que julgávamos desacreditadas, fomentadoras de ódio, xenofobia e racismo”, afirmou Ferro Rodrigues na abertura do ano judicial, hoje, no Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa.

O presidente da Assembleia da República alertou ainda para os tempos em que “políticos populistas, em democracias recentes, mas também em democracias” que se consideravam “sólidas, não se coíbem de glorificar ideias iliberais e patriotismos unilateralistas”.

A meses das comemorações dos 45 anos do 25 de Abril, Ferro admitiu existirem “insuficiências” no “sistema democrático” e afirmou ser preciso “continuar a trabalhar”, “não só para melhorar a qualidade” da democracia, mas também “consolidar e proteger” o regime das “ameaças e dos ataques que nos dias de hoje assumem proporções inquietantes”.

A democracia, sublinhou, é "um processo contínuo", nem há "democracia perfeitas nem democracias definitivas" e "muito menos democracias instantâneas, de modelo único, aplicável a todas as comunidades".

E fez ainda um alerta quanto à União Europeia, onde há Estados-membros que “colocam em causa a separação de poderes” e quanto aos demagogos que “tão bem cultivam” a “perceção das deficiências, reais e imaginárias, de cada sistema”.

Ferro Rodrigues "oferece" diálogo do parlamento para discutir soluções na Justiça

O presidente da Assembleia da República admitiu hoje que os cidadãos desconfiam da justiça, um setor “sob suspeita”, e "ofereceu" o compromisso do parlamento para um “diálogo franco” para discutir respostas aos problemas.

Diagnóstico e promessa foram feitos por Ferro Rodrigues, uma das personalidades que discursou na abertura do ano judicial, hoje, no Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa.

Na sua intervenção, Ferro disse ser impossível negar que “o setor da justiça está sob suspeita”, em que “prevalece a desconfiança dos cidadãos e das empresas quanto à qualidade e à imparcialidade da lei e do sistema judicial".

A “perceção da ineficácia da justiça, da desigualdade no tratamento, da impunidade, é sistematicamente usada para minar a confiança dos cidadãos nas instituições e nos processos democráticos”, avisou ainda, referindo vários “indicadores perturbantes”, como os índices de confiança abaixo dos 50%.

Há, porém, segundo o presidente do parlamento, “sinais encorajadores”, como a subida da “propensão das pessoas e empresas em Portugal” a classificar de “boa a independência de tribunais e juízes”.

“Há que reforçar a confiança dos cidadãos no sistema judicial, melhorar a perceção que têm da justiça. Não duvido de que todos desejamos uma justiça mais ágil e transparente, uma justiça mais humana e próxima dos cidadãos, uma justiça mais equitativa no tratamento dos cidadãos e na defesa dos seus direitos”, afirmou.

Admitindo que a “tarefa não é fácil” e que o atraso “tende a ser a negação da própria justiça”, Eduardo Ferro Rodrigues admitiu que as soluções para os problemas na justiça “terão, necessariamente, de ser encontradas em diálogo franco e aberto” entre o parlamento, Governo e os agentes do sistema judicial (magistrados judiciais e do Ministério Público, advogados, polícias e funcionários).

Da parte da assembleia, garantiu “total disponibilidade” para, em “total interdependência com os outros órgãos de soberania”, “sem pressões nem reservas, discutir e encontrar as respostas aos anseios de todos” quanto ao funcionamento da justiça.

“Este é o compromisso que quero aqui deixar”, afirmou.

Ferro Rodrigues aludiu às mudanças na sociedade que se tornou “mais complexa”, como mais complexas e especializadas se tornaram as leis.

Uma “rapidez na evolução da sociedade”, que, afirmou, que “demora a ter tradução na legislação e a obter resposta dos tribunais”, num tempo em que “a informação – ou a desinformação – viaja a velocidade quase instantânea”.

“O tempo da justiça não é, nem pode ser, o tempo da comunicação social e muito menos o tempo das redes sociais. Mas o tempo da ponderação não pode servir para justificar a morosidade que por vezes caracteriza o andamento da justiça”, disse ainda.

[Notícia atualizada às 17:16]