“Temos desafios internos, certamente. Temos sinais de cansaço institucional que importa atacar. Mas julgo que no essencial vivemos confiantes a nossa opção democrática, europeia e cosmopolita”, disse, acrescentando que, contudo: “não vivemos numa ilha, isolados do mundo”, mas num “mundo global e numa Europa onde os extremismos populistas estão a atingir intenções de voto que já não víamos desde os anos 30 de má memória”.

Falando na sessão de abertura do Colóquio “O Futuro da Representação Política – 200 Anos do Sinédrio”, no Porto, e congratulando-se por Portugal não ter "uma extrema-direita com representação parlamentar", Ferro Rodrigues frisou que “as democracias não sobrevivem sem lealdade entre adversários e sem diálogo quanto às regras do jogo e quanto às opções estratégicas das comunidades”.

“E também não sobrevivem se se deixarem intimidar pela lógica de novos poderes, não eleitos, e que condicionam e limitam o funcionamento democrático e a capacidade de os povos compreenderem que é pelo voto, e na eleição dos seus representantes, que se joga o poder o político. E hoje infelizmente há uma parte do poder que as pessoas sentem que se desligou dos eleitos e está em áreas de não eleição”, disse.

O responsável político disse mesmo: “Se há lição que podemos retirar da história é que nunca devemos dar a democracia por adquirida” e importa, por isso, “defendê-la” e “aperfeiçoá-la”.

Para o presidente da Assembleia da República, “não há democracia sem alguma forma de capitalismo, mas, pelo contrário, há muitos exemplos de capitalismo sem democracia” e são “cada vez mais exemplos, infelizmente”.

“A retração social dos estados, a resposta da política de austeridade, a abertura global dos mercados são dinâmicas que até podem obedecer a lógicas de racionalidade económica, mas que estão a ter consequências sociais e políticas nefastas”, considerou, acrescentando que as instituições internacionais, criadas para regular o capitalismo, parecem hoje dominadas pela lógica do ‘laissez-faire, laissez-passer’”.

Para Eduardo Ferro Rodrigues, “as desigualdades sociais, a desesperança das classes médias, o medo do futuro e do desconhecido estão a promover dinâmicas antidemocráticas e antieuropeias, já que chegaram ao interior da União Europeia, um espaço que nasceu como espaço da democracia e liberdade”.

“O cinismo e o sentido de distância face ao poder ganham terreno”, vincou, considerando que “é tempo de a Europa se reinventar” e de as “democracias de adaptarem aos novos tempos e estarem à altura das expectativas dos cidadãos”.

Afirmando que na Assembleia da República se está “atento às novas exigências éticas e cidadãs”, Ferro Rodrigues referiu o projeto do Parlamento Digital, bem como as propostas que a Comissão Eventual para o Reforço da Transparência em Funções Públicas “vai lançar para a discussão política e pública”, como projetos que visam aproximar os portugueses do parlamento.

“Como tenho dito, a transparência, a publicidade, a divulgação dos processos legislativos não são aliados do populismo; pelo contrário, são um bom antídoto contra o populismo antiparlamentar, pois permitem aos cidadãos verem com os próprios olhos a democracia e os seus representantes a funcionar”, concluiu.

Este colóquio, promovido pela Assembleia da República no âmbito do bicentenário do Constitucionalismo, em colaboração com a Câmara do Porto, decorre na Biblioteca Almeida Garrett durante o dia de hoje, data em que se assinalam os 200 anos do Sinédrio, que foi fundado no Porto com o objetivo de preparar a revolução liberal de 1820.

“A ambição de implantar em Portugal um regime constitucional e representativo alimentava a ação de Fernandes Tomás, Ferreira Borges, Silva Carvalho e Ferreira Viana”, destaca a organização do colóquio.