A revelação foi feita numa conferência de imprensa com a magistrada francesa e ex-eurodeputada Eva Joly e com Delphine Halgand, diretora da The Signals Network (organização de apoio a ‘whistleblowers’), realizada após mais uma visita ao estabelecimento prisional da Polícia Judiciária, em Lisboa, onde o jovem português está em prisão preventiva desde março, e de um encontro com a ministra da Justiça, Francisca van Dunem.
“Rui Pinto disse-nos que entre os anos 2017 e 2018 tinha feito submissões através da plataforma de denúncias anónimas do DCIAP e verificou que nenhuma delas foi investigada. Muitas diziam respeito a eventuais casos de corrupção de elementos ligados a forças da autoridade”, contou, criticando a inação da justiça nacional perante as diligências de outros nove países que abriram investigações na sequência das denúncias do português.
Ana Gomes sublinhou ainda que Rui Pinto negou ter recebido qualquer pedido das autoridades judiciais portuguesas e vincou que estas “não querem colaborar ou só querem que ele coopere no sentido de fornecer dados para se incriminar a si próprio” no processo em que está indiciado por seis crimes relacionados com acessos ilegais aos sistemas informáticos do Sporting e do fundo de investimento Doyen.
Paralelamente, a ex-eurodeputada acrescentou que Rui Pinto está “muito preocupado” com fugas de informação das autoridades judiciais relativamente a documentação que recolheu e que, de alguma forma, “alertam entidades que estão a ser alvo de investigação”, colocando assim em risco a sua viabilidade, além de o apresentarem como “bode expiatório”, face às recentes audições a Cristiano Ronaldo e a elementos da Doyen.
Questionada sobre a recusa do juiz de instrução criminal em atender ao pedido do Ministério Público para atribuir “especial complexidade” a este processo – o que dilataria automaticamente por mais seis meses o prazo para a investigação -, Ana Gomes considerou a decisão “importante e especialmente significativa”, por forçar o MP a deduzir a acusação a Rui Pinto até 22 de setembro, data em que se cumprem seis meses de prisão preventiva.
Sobre o encontro com Francisca Van Dunem, a antiga eurodeputada assumiu que a ministra da Justiça não estabeleceu “compromisso nenhum” em relação a este caso, apesar de ter assegurado que a justiça portuguesa estaria disponível para colaborar com as autoridades dos outros países caso tal venha a ser solicitado. Algo que Ana Gomes garantiu que seria feito pelos procuradores franceses, que já detêm documentação recolhida pelo jovem de 30 anos.
A magistrada francesa e ex-eurodeputada Eva Joly considerou a postura da justiça portuguesa neste processo um “mau exemplo”, tendo em conta o “interesse público” das informações trazidas a público por Rui Pinto. Aliás, Eva Joly foi mais longe e assegurou que “mesmo que Portugal não investigue, essas informações serão investigadas por outros países”.
Por sua vez, Delphine Halgand revelou que a organização The Signals Networks já gastou “entre 10 e 15 mil euros” desde janeiro no financiamento das despesas de representação legal de Rui Pinto em Portugal e na Hungria.
Em conjunto comungaram ainda da crítica ao artigo 126.º do Código do Processo Penal, nomeadamente o número quatro, que estipula que se "o uso dos métodos de obtenção de provas previstos neste artigo constituir crime, podem aquelas ser utilizadas com o fim exclusivo de proceder contra os agentes do mesmo".
Em prisão preventiva desde 22 de março, Rui Pinto, de 30 anos, foi detido na Hungria e entregue às autoridades portuguesas, com base num mandado de detenção europeu, estando indiciado pela prática de quatro crimes: acesso ilegítimo, violação de segredo, ofensa à pessoa coletiva e extorsão na forma tentada.
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