“Nélio Lucas perguntou-me se o meu cliente conseguia entrar no servidor da FPF”, afirmou o arguido em tribunal, explicando que, à data, a identidade do seu então cliente Rui Pinto era desconhecida para a Doyen.

O advogado, que responde por um crime de tentativa de extorsão à Doyen, falou hoje perante o coletivo de juízes, explicando que foi contactado por Rui Pinto, em 2015, para intermediar um contrato de prestação de serviços entre este, para quem já tinha trabalhado em 2013, e a Doyen Sports.

“Comecei a ficar desconfortável [com questão da FPF] e o Nélio Lucas até me disse que o meu cliente lhes ia resolver um problema que tinham com o Sporting na Suíça”, referiu.

Aníbal Pinto relatou um encontro na estação de serviço da autoestrada A5, em Oeiras, com Nélio Lucas e o advogado Pedro Henriques, no qual o então representante da Doyen lhe terá dito que era “muito rico” e que lhe oferecia “um milhão de euros” para saber a identidade do seu cliente.

“Eu respondi: ‘Assinem o contrato e eu trago o homem”, afirmou Aníbal Pinto, referindo-se a um contrato de prestação de serviços na área informática que Rui Pinto iria assinar com a Doyen, e para o qual pediu a sua intermediação.

De acordo com a acusação, Aníbal Pinto pretendia ajudar Rui Pinto a chantagear a Doyen, entidade à qual Rui Pinto terá exigido entre meio milhão e um milhão de euros para não publicar na plataforma Football Leaks informação confidencial relacionada com contratos de jogadores.

Perante o coletivo de juízes, presidido por Margarida Alves, Aníbal Pinto admitiu que sempre teve presente “que havia contornos que podiam configurar crime de extorsão”, explicando que, depois de perceber que a Doyen não queria assinar o contrato de prestação de serviços, alertou Rui Pinto.

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“Achei por bem alertar o Rui Pinto de que podia haver extorsão e que ele podia levar 15 anos de prisão. Tenho de fazer tudo para que os meus clientes não cometam ilícitos”, afirmou Aníbal Pinto, referindo que antes, Rui Pinto lhe tinha mandado um e-mail no qual falava de “doação e não de extorsão”.

O advogado, que falou durante a parte da manhã e toda a sessão da tarde, referiu também que Rui Pinto, com quem comunicou sempre por e-mail, lhe disse que ele tinha sido alvo de uma emboscada, por parte de Nélio Lucas e Pedro Henriques, no encontro que tiveram em Oeiras.

Segundo Aníbal Pinto, quando Nélio Lucas lhe ofereceu um milhão de euros revelar a identidade do cliente estavam no local cinco inspetores da Polícia Judiciária para o prenderem.

“O Nélio e o Pedro Henriques fizeram tudo para que eu fosse preso”, disse, referindo que apresentou uma queixa-crime contra os dois em 2016, que foi arquivada.

À saída do tribunal, no Campus da Justiça, em Lisboa, Aníbal Pinto considerou ter desmontado a acusação “ponto por ponto”, garantindo que foi “vítima de uma emboscada” e que se “voltasse atrás faria tudo igual”.

“Sinto que fui a cola que justificou, com o crime de extorsão, a prisão preventiva de Rui Pinto”, afirmou Aníbal Pinto, que na próxima sessão, agendada para 15 de setembro, será inquirido pelo Ministério Público.

O julgamento do caso Football Leaks começou hoje, com o principal arguido, Rui Pinto, a afirmar perante o coletivo de juízes que o seu “trabalho como ‘whistleblower’ (denunciante) está terminado” e que nunca recebeu dinheiro pela divulgação de documentos confidenciais do mundo do futebol e alegados esquemas de evasão fiscal.

“O meu trabalho como ‘whistleblower’ está terminado. Nunca recebi dinheiro pelo que fiz. Não sou ‘hacker’, sou denunciante. Tornei pública muita informação importante, que de outra forma nunca seria conhecida”, afirmou Rui Pinto.

O criador da plataforma eletrónica Football Leaks, que não quis comentar factos concretos, manifestou-se “indignado” com o que descobriu e disponível para “continuar a colaborar com as autoridades”, assinalando que estão em curso “inquéritos importantes que foram iniciados” com as suas denúncias.

Rui Pinto, de 31 anos, vai responder por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol e a Procuradoria-Geral da República, e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada.

O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.