“Não, não era uma prioridade para nós. Sei que há interesses diversos, mas, para mim, correio é sagrado”, afirmou o inspetor da unidade de cibercrime da Judiciária, na sequência de uma questão da defesa do criador da plataforma, colocada pela advogada Luísa Teixeira da Mota, reconhecendo, porém, que isso “é fácil de ver”.
Sobre o acesso ao sistema da Procuradoria-Geral da República, José Amador revelou a existência de “307 acessos a endereços”.
Os representantes de Rui Pinto levantaram também dúvidas sobre a especificidade do mandado de detenção e da apreensão dos dispositivos, alegando que as moradas que constam nos autos não são coincidentes, algo que José Amador reconheceu, embora tenha, de certa forma, passado a questão para o procedimento das autoridades húngaras no terreno, que não permitiram a participação de elementos da PJ.
“Toda a sucessão de despachos não passou por mim. De facto, são moradas diferentes”, explicou o inspetor, respondendo também não saber “se facultaram ao arguido o acesso a um advogado” aquando da detenção em Budapeste, em 16 de janeiro de 2019.
Uma das acusações mais discutidas pela defesa de Rui Pinto nesta primeira inquirição a José Amador foi a de sabotagem informática à SAD do Sporting. Nesse sentido, a defesa – e até o coletivo de juízes presidido por Margarida Alves – questionou se o ataque atribuído ao criador do Football Leaks teria mesmo o objetivo de provocar o colapso ou se tal seria uma consequência da menor resiliência do sistema informático ‘leonino’.
No entender de José Amador, Rui Pinto não teria como ignorar que um ataque com a natureza daquele que foi lançado teria aquele final, confessando que “as capacidades” do criador da plataforma são superiores às suas próprias capacidades a nível informático.
“Uma pessoa que lança um conjunto de ataques sabe que o sistema vai ser bombardeado. É feito com aquela intenção”, frisou, salientando: “O propósito de exfiltração estava feito. Para quê aquele ataque naquele momento? Não consigo encontrar justificação no sentido de ganhar outros privilégios de acesso”.
Antes da defesa de Rui Pinto foi a vez da inquirição dos representantes da Doyen a José Amador, na qual esteve em destaque o tipo de intervenção do advogado Pedro Henriques no início da investigação. Com efeito, o inspetor da Judiciária notou que “Pedro Henriques não tinha procuração” para representar o CEO da Doyen, Nélio Lucas, e que o jurista seria “uma espécie de colaborador” do líder do fundo de investimento.
O julgamento prossegue apenas na próxima quinta-feira, com a continuação da inquirição da defesa de Rui Pinto a José Amador, depois de ser declarada sem efeito a sessão inicialmente agendada para quarta-feira.
Rui Pinto, de 31 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, por 14 de violação de correspondência e por seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol e a Procuradoria-Geral da República, e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto, então representante de Rui Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e o seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
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