A Agência para a Modernização Administrativa é responsável pela construção deste portal — hoje inaugurado —, que vai permitir a consulta de informação sobre cada investimento financiado, desde a sua execução até ao encerramento.

Na apresentação pública do Portal Mais Transparência, o primeiro-ministro António Costa destacou o papel deste instrumento porque "a qualidade da cidadania e da nossa democracia reforça-se com a transparência", até porque "a democracia só subsiste quando os cidadãos vêm reforçada a sua confiança no funcionamento das instituições ".

A sessão decorreu no Terminal de Cruzeiros, em Lisboa, depois de intervenções dos ministros do Planeamento, Nelson de Souza, da Administração Pública, Alexandra Leitão, e da comissária europeia para a coesão e reformas, Elisa Ferreira.

Lembrando que o portal foi "desenvolvido para poder permitir o acompanhamento da execução do Orçamento do Estado e de outras atividades da ação do Estado", o primeiro-ministro destacou que este "ganhou maior notoriedade a propósito da aplicação dos fundos comunitários".

A esse respeito, Costa fala de uma situação "particularmente exigente" pois afigura-se a "possibilidade de na próxima década executar um montante de fundos comunitários como nunca tivemos", desde concluir o Portugal 2020 como iniciar o Portugal 2030 e dar uso ao Plano de Recuperação e Resiliência, sendo necessário de agora em diante "executar por ano o dobro do que se executou nos melhores anos de execução dos fundos comunitários".

Apesar de sublinhar que "ao contrário do que se pensa, Portugal tem um bom historial na execução dos fundos comunitários", este "não é por si só uma garantia de um bom futuro". Com o presidente do Tribunal de Contas, José Tavares, também presente na sessão, António Costa defendeu a tese de que a boa execução dos fundos comunitários ao longo dos próximos anos "exige a mobilização da sociedade".

"E a mobilização da sociedade depende do fator confiança. Este PRR exige simultaneamente celeridade, rigor e escrutínio. Celeridade porque tem um prazo de execução muito mais curto do que é normal nos fundos comunitários. Temos três anos para assumir compromissos e mais três anos para poder gastar o último cêntimo", referiu.

Nesse sentido, o primeiro-ministro defendeu que "não há tempo a perder, importa agilizar a execução dos fundos e eliminar toda a burocracia possível".

"Mas mais celeridade não pode significar menor rigor", avisou, antes de mencionar que a Assembleia da República "introduziu as alterações que tinha a introduzir no Código de Contratação Pública", designadamente em matéria de fiscalização por parte do Tribunal de Contas.

Por sua vez, o Governo, de acordo com António Costa, reforçou "os mecanismos que asseguram rigor", numa alusão à criação de uma comissão de acompanhamento, que será presidida pelo gestor e professor universitário António Costa e Silva.

"Este PRR, ao contrário do que acontece com outros fundos comunitários, está sujeito a um processo de monitorização da sua execução sem paralelo. Este plano tem metas, tem calendário, tem marcos fundamentais", insistiu.

Apesar de a Comissão Europeia disponibilizar 13% logo com a aprovação do plano, o primeiro-ministro advertiu, no entanto, que a partir desse adiantamento "a libertação do resto das verbas depende do cumprimento escrupuloso e de metas contratualizadas".

"Não é por isso um cheque em branco, nem sequer um cheque que só seja avaliado no final da execução daqui a seis anos. Vai sendo mensalmente, semanalmente e diariamente acompanhado em termos de execução", reforçou.

Por isso, de segundo António Costa, na execução do PRR, "impõe-se um enorme rigor".

"Para garantir celeridade e rigor, o Governo tem este portal da transparência, que significa mais escrutínio, desde logo político. É muito importante que, na Assembleia da República, tenha sido criada uma instância própria de fiscalização política da execução do PRR", declarou.

Pela parte do executivo, António Costa indicou depois que o Governo criou uma comissão de acompanhamento, presidida por António Costa e Silva, "que juntará a sociedade civil organizada (parceiros sociais, conselhos de reitores ou de politécnicos), mas também dez personalidades que representarão diferentes áreas do saber da sociedade".

"Há ainda a dimensão da Inspeção Geral de Finanças e das entidades jurisdicionais, desde logo o Tribunal de Contas, com quem se está a estabelecer um protocolo para a fiscalização permanente da execução do PRR, e também o Ministério Público. Com o Ministério Público, aliás renovando o protocolo que a Agência para o Desenvolvimento e Coesão já tem em relação aos fundos comunitários", acrescentou.

Além do escrutínio político, Costa destacou o papel de cada um dos cidadãos ao utilizar este portal. "Essa fiscalização por parte de cada cidadão é da maior importância, porque cada um terá uma atenção específica ou pela região onde vive, ou pelos setores que se interessa, ou pelos projetos que entende serem mais importantes", sendo essencial cada um "contribuir para assegurar a boa execução".

Na mesma intervenção, Costa aproveitou para agendar a aprovação dos primeiros PRR apresentados pelos estados-membros para a reunião dos ministros das Finanças, Ecofin, em 18 de junho.

"A presidência portuguesa já tomou a decisão de agendar para o Ecofin de 18 de junho a aprovação dos primeiros PRR. E também já manifestámos a disponibilidade para convocar um Ecofin extraordinário para a última semana de julho, tendo em vista aprovar um segundo pacote de PRR", declarou o primeiro-ministro de Portugal, país que até junho preside ao Conselho da União Europeia.

De acordo com o líder do executivo português, com este calendário, a presidência eslovena, que se segue à portuguesa, "terá a menor carga possível de trabalho" em termos de processo de ratificação dos planos por parte dos diferentes Estados-membros.

"Temos sobretudo a preocupação que a Europa não perca mais tempo no esforço de recuperação. Convém não esquecer que o resto do mundo não parou e que os Estados Unidos já vão no terceiro pacote de relançamento económico. A Comissão Europeia teve uma decisão histórica em julho passado, mas só em junho próximo - isto se não houver atrasos na burocracia com a apreciação final - é que as primeiras verbas começarão a chegar ao terreno", observou António Costa.

Na sua intervenção, o primeiro-ministro disse que foi em consequência da pandemia da covid-19, "à dimensão da crise económica e social que há para enfrentar, que foi possível ultrapassar não apenas o bloqueio das negociações em torno do Quadro Financeiro Plurianual, mas também acrescentar 750 mil milhões de euros para financiar a recuperação e a resiliência".

"Foi uma negociação muito exigente, muito difícil. Na ponta final, foram cinco dias e quatro noites de negociação para se conseguir fechar esse acordo em julho passado. Mas, de julho até agora, também tem sido muito difícil", declarou, aqui numa alusão ao complexo processo de ratificação do novo fundo por parte dos Estados-membros.

No entender o primeiro-ministro, as dificuldades têm sido sucessivamente ultrapassadas e pode "encarar-se com otimismo que em tempo útil estarão concluídas todas as ratificações para que a Comissão Europeia possa ir aos mercados antes dos mercados irem de férias".

António Costa assinalou ainda a existência de uma nova metodologia de trabalho no processo de aprovação dos PRR.

"Desde outubro até agora, tivemos a possibilidade de haver contactos intensos semanais com as diferentes direções-gerais da Comissão Europeia. Isso permite agora à Comissão Europeia aprovar os planos de uma forma muito mais célere do que os dois meses que estão previstos no regulamento", acrescentou.

Portugal entregou a versão final do PRR na passada quinta-feira, tornando-se no primeiro Estado-membro a apresentar a Bruxelas este documento.

O PRR tem um período de execução até 2026 e prevê um conjunto de reformas e investimentos para alavancar o crescimento económico.

Comissão Europeia terá tolerância zero contra a fraude

"Os casos de fraude na utilização dos fundos europeus são escassos, representando apenas 0,8%. Mas, seja qual for o valor global, um euro que seja mal utilizado, é um erro demasiado elevado", declarou a comissária europeia Elisa Ferreira, na parte final do seu discurso.

A ex-eurodeputada socialista e vice-governadora do Banco de Portugal salientou depois que "a posição da Comissão Europeia é de tolerância zero em relação à fraude".

"Temos casos que se trata de utilização irregular e não de fraude - e convém distinguir este aspeto. Mas, seja como for, o combate à fraude tem de estar no centro das nossas preocupações. Todos, Estados-membros e instituições, temos de aumentar os nossos esforços neste combate", reforçou a comissária europeia.

Nas suas primeiras palavras, Elisa Ferreira elogiou o executivo de António Costa, dizendo que Portugal não foi só pioneiro na apresentação do PRR".

"Foi também pioneiro por ter submetido o PRR a discussão pública. E está a sê-lo também na apresentação deste portal da transparência, que incluirá toda a informação relevante para a utilização dos fundos europeus", acrescentou.

Uma governação que se quer "com telhados de vidro"

Antes, o ministro do Planeamento, Nelson Souza, referiu-se na intervenção inicial ao Portal  como a construção do "edifício da governação do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)", ressalvando a importância de manter uma relação de abertura com os cidadãos, iniciada com o processo de audição pública do PRR antes do seu envio para a Comissão Europeia.

Para o ministro, este portal é "uma pedra basilar" para o "relacionamento com a sociedade", mas ao mesmo tempo um "instrumento de gestão e governação desse sistema do PRR, que permita prestar contas do uso que fazemos do uso dos dinheiros públicos, não importa a quem".

Tendo o PRR sido recentemente submetido, Nelson Souza adiantou que "ainda não é tempo de termos informação sobre as reformas e os investimentos executados no âmbito" desse plano, mas o Governo quis já avançar com esta iniciativa para testar "a tempo e a horas o funcionamento do portal com outros fundos europeus, como são os do Portugal 2020".

Hoje de manhã, na comissão parlamentar da Economia tida na Assembleia da República, Nelson Souza já tinha adiantado que nesta primeira fase o portal apresentará apenas informações referentes a 123 mil candidaturas no âmbito do Portugal 2020.

Assim, é possível "obter informação detalhada e individualizada sobre cada uma das operações até agora aprovadas no âmbito do Portugal 2020", com por exemplo "o valor do financiamento, o investimento, a sua natureza, quem aprovou, quando aprovou e em que condições é que o fez".

Vincando que a transparência é “um elemento importante” no relacionamento entre a administração, instituições e cidadãos, o titular da pasta do Planeamento notou que as “caixas pretas” servem apenas para encerrar processos “que indiciam e criam um campo propício a desvios e desconformidades”, mas que, pelo contrário, "sistemas de paredes e telhados de vidro expõem os processos, os protagonistas e a sua ação, permitindo uma monitorização escrutinadora e dissuasora de desconformidades, ao mesmo que incentiva a generalidade dos atores para o cumprimento dos objetivos publicamente assumidos".

A criação deste portal da transparência para os fundos europeus foi aprovada na votação na especialidade do Orçamento do Estado para 2021 a 20 de novembro de 2020.

Já nesta terça-feira o gestor António Costa e Silva tinha dito que a criação de um portal da transparência que faça a monitorização dos fundos é “absolutamente decisiva” para resolver um “problema de confiança”, defendendo ainda um trabalho conjunto independentemente de desacordos.

“Temos um problema de confiança no nosso país e de suspeição, às vezes, generalizada e nós só podemos fazer face a isso se os próprios poderes públicos forem transparentes e prestarem contas”, afirmou o presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência.