Uma das primeiras reações de Katalin Karikó, quando soube que ia receber o Nobel da Medicina, foi recordar os obstáculos que a academia lhe colocou nos primeiros avanços da sua pesquisa.
No início dos anos 90, quando era professora assistente na Universidade da Pensilvânia, a bioquímica, natural de Szolnok na Húngria, “manteve-se fiel à sua visão de utilizar o mRNA como terapêutica, apesar de ter encontrado dificuldades em convencer os financiadores da investigação da importância do seu projeto", foi explicado no comunicado divulgado hoje pela Fundação Nobel.
Não acreditando nas suas descobertas, a cientista nascida em 1955 foi empurrada para a reforma.
“Há dez anos, fui despedida e forçada a reformar-me”, disse a cientista depois de alguns segundos em silêncio, quando questionada o que lhe ia na mente quando soube da notícia. “Estava na PEN [Universidade da Pensilvânia]”, desabafou.
Katalin Karikó foi Professora Assistente na Universidade da Pensilvânia, entre 1989 e 2013. “O meu marido apoiou-me e disse-me: Talvez a BioNTech fosse bom para mim. ´Tenta`, disse ele, `farei com que não te arrependas", descreve Karikó, numa entrevista por telefone que a Fundação publicou no Twitter.
“Durante 9 anos, viajei entre aqui e a Alemanha. Tinha 58 anos, fiz todas estas experiências com as minhas próprias mãos. Durante aquele tempo estava ainda a alimentar a teoria (...)”, respondeu a atual vice-presidente sénior da BioNTech RNA Pharmaceuticals.
"O Prémio Nobel 2023 em Fisiologia ou Medicina foi atribuído a Katalin Karikó e Drew Weissman pelas suas descobertas relativas às modificações das bases nucleosídeas que permitiram o desenvolvimento de vacinas eficazes de mRNA contra a covi-19", lê-se no comunicado.
Drew Weissman, imunologista, trabalha com células dendríticas, que “têm funções importantes na vigilância imunitária e na ativação de respostas imunitárias induzidas por vacinas”.
Depois de se juntar a Karikó, os dois cientistas foram desenvolvendo técnicas centradas na forma como diferentes tipos de mRNA interagem com o sistema imunitário e, em 2005, surgiram os primeiros resultados, a que a Fundação chamou de "surpreendentes".
As descobertas dos dois investigadores permitiram o desenvolvimento de vacinas com a tecnologia mRNA. Comercializadas pela Pfizer-BioNTech e Moderna as vacinas com esta tecnologia demonstraram alta eficácia contra a covid-19, pandemia que assustou o mundo entre 2020 e 2022.
Apesar das vacinas terem sido aplicadas em tempo recorde, o desenvolvimento da tecnologia mRNA acontece desde os anos 1980. O interesse pelo mRNA aumentou em 2010 na busca por uma vacina contra o Zika e o MERS-CoV, este último da família coronavírus — conhecido como a Síndrome Respiratória do Médio Oriente, e que veio contribuir para o desenvolvimento da vacina em tempo recorde contra o SARS-CoV-2 (Covid-19).
"A impressionante flexibilidade e rapidez com que as vacinas de mRNA podem ser desenvolvidas abrem caminho à utilização da nova plataforma também para vacinas contra outras doenças infecciosas. No futuro, a tecnologia poderá também ser utilizada para administrar proteínas terapêuticas e tratar alguns tipos de cancro", sublinha a Fundação Nobel.
Desta forma, "através das suas descobertas fundamentais sobre a importância das modificações de bases no mRNA, os laureados com o Prémio Nobel deste ano contribuíram de forma crítica para este desenvolvimento transformador durante uma das maiores crises sanitárias do nosso tempo", conclui.
Quando foi “forçada a reformar-se”, Katalin Karikó estava convicta do potencial da sua investigação, mas longe de imaginar que iria receber um Nobel da Medicina: "Pensei que fosse uma brincadeira. Hoje em dia, nunca estamos 100% seguros (...), nem sequer era professora e não tinha uma equipa (...)", disse, com sorrisos.
Atualmente, Karikó é professora na Universidade de Szeged, na Hungria e professora adjunta na Perelman School of Medicine da Universidade da Pensilvânia, nos EUA. O outro laureado, Drew Weissman é diretor do "Penn Institute for RNA Innovations".
“A perseverança compensa”.
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